Descendente de ganeses, o britânico Kwame Anthony Akroma-Ampim Kusi Appiah, professor de filosofia na Princeton University, foi quem indicou o nome do dissidente chinês Liu Xiaobo ao Comitê Nobel. Em entrevista ao Correio, ele ressaltou o papel de Liu na luta a favor dos direitos humanos e disse duvidar da imediata libertação do ativista por Pequim.
Como o senhor vê o fato de o Comitê Nobel ter aceitado sua indicação e premiado Liu Xiaobo?
Eu fiquei, obviamente, muito satisfeito. Este é um momento importante para Liu Xiaobo. A decisão de indicá-lo ao Nobel da Paz se resultou do fato de eu ser o presidente do PEN American Center e de estarmos trabalhando nesse caso há muitos anos. Xiaobo é um de nossos colegas, pois ocupa a presidência do Independent Chinese PEN Center. A razão principal é que temos acompanhado o caso e achamos que Liu se encaixa no espírito do prêmio. Ele trabalha pela paz e por mudanças na China e tem sofrido, por conta disso. O governo da China tem tentado puni-lo. Ele está cumprindo 11 anos de prisão, essencialmente por pedir às autoridades de seu país que respeitem as normas internacionais dos direitos humanos relacionadas à liberdade de expressão. Ele é a pessoa ideal e acho que o Comitê Nobel fez uma escolha muito boa.
Quando a indicação da candidatura de Liu foi enviada a Oslo?
A carta foi enviada em 29 de janeiro passado. O processo de indicação é, tecnicamente, secreto. Você só sabe que uma pessoa foi nomeada se alguém lhe contar, porque o Comitê Nobel jamais revela.
O que ele fez em prol dos direitos humanos e da liberdade de expressão na China?
Ele foi um dos ativistas a formular o documento conhecido como Carta 8, uma declaração sobre mover-se rumo à democracia na China. Liu foi uma das primeiras pessoas a assinar o texto, hoje firmado por dezenas de milhares, incluindo autoridades e estudantes. Ele se transformou em um movimento, não é mais apenas uma pessoa. O Independent Chinese PEN Center está trabalhando para obter essas liberdades fundamentais. Eles agora podem criticar o governo livremente e permanecerem livres. Liu é um símbolo disso, uma pessoa muito articulada, cuidadosa e ciente da necessidade de se organizar. Além disso, obviamente, é um homem muito corajoso.
A rapidez da premiação causou-lhe surpresa? Muitos indicados jamais receberam a honraria;
Acredito que o Comitê Nobel percebeu que esse é um momento-chave na China. Você tem que lembrar que a China tem se afastado da pecha de um dos regimes mais repressores do planeta. Atualmente, Pequim mantém entre 40 e 50 pessoas presas por terem expressado sua opinião de forma pacífica. Três décadas atrás, havia muito mais prisioneiros. Eu creio que a China está se movendo na direção correta. Nós apenas temos que continuar a explicar aos chineses que os direitos humanos são do interesse de todo mundo, que todos deveriam se preocupar com isso, e que Pequim precisa tomar as medidas necessárias para libertar Liu e outras pessoas. Isso seria algo bom para Pequim e tornaria possível para nós termos uma relação muito mais positiva com a China, que é um grande e importante país.
O governo chinês chegou a fazer vários alertas para que o prêmio não fosse dado a Liu e até ameaçou romper laços com a Noruega. O que se pode esperar de Pequim?
Eu não tenho ideia. Minha opinião pessoal é que há uma divisão dentro do governo chinês. Algumas pessoas creem que a prisão de Liu foi um erro. Haverá grandes argumentos, dentro do establishment chinês, em relação a o que fazer. Não vejo sentido punir a Noruega ou o próprio Liu. O Comitê Nobel não representa o governo norueguês. De fato, representa pessoas de vários espectros políticos no país. Seria muito estranho punir a Noruega, que nada fez. Hoje, Liu é a pessoa que se levanta pela paz e pela liberdade no mundo.
O Nobel da Paz pode apressar a libertação de Xiaobo?
O governo chinês não tem um histórico de responder sob pressão. Eu ficaria muito surpreso se Liu fosse libertado logo. No entanto, a longo prazo, as autoridades chinesas perceberão que trancafiar esse corajoso cidadão é ruim para a própria China e para suas relações com o resto do mundo.