postado em 09/11/2010 08:00
;Não pergunte a ninguém se você deve assassinar americanos. Matar o demônio não precisa de qualquer fatwa (decreto islâmico).; A recomendação veio de dentro do Iêmen ; pouco menor que o estado de Minas Gerais em extensão territorial, o país contaminou-se com uma ideologia islâmica ultrarradical e transformou-se em novo celeiro do terrorismo. As palavras do clérigo muçulmano americano-iemenita Anwar al-Awlaqi, disseminadas ontem por meio de uma gravação de vídeo, sucederam a descoberta de um complô envolvendo explosivos acondicionados em cartuchos de fotocopiadoras embarcados em dois aviões que se dirigiam aos Estados Unidos.No videoteipe de 23 minutos descoberto pelo Site Intelligente Group, uma página virtual que monitora a internet em busca de mensagens extremistas, Al-Awlaqi tenta insurgir os iemenitas contra o presidente Ali Abdullah Salih, que há duas décadas governa uma nação mergulhada no caos, e contra supostos países agressores. ;Os Estados Unidos e Israel estão controlando a nossa ummah (comunidade, em árabe) e, em breve, o Irã vai interferir para ter sua fatia do bolo;, declarou Al-Awlaqi, provavelmente refugiado nas regiões tribais do sul do Iêmen. ;Existe um esforço americano-israelense de um lado e um esforço iraniano de outro para impor seu controle sobre áreas sunitas;, sustenta.
[FOTO2]Por telefone, a iemenita-suíça Elham Manea, professora de relações internacionais da Universidade de Zurique, afirmou ao Correio: ;Eu acho que devemos pensar o Iêmen como um refúgio do terror;. A especialista explica que o país fronteiriço com a Arábia Saudita ; berço do islã ; enfrenta grave instabilidade. ;A prioridade para o governo de Salih é sobreviver às crises internas. Mas é preciso um esforço sério para combater a ideologia do ódio;, aconselha. Enquanto o norte do país convive há 16 anos com a rebelião dos separatistas Houthis, uma facção que luta pela instituição de um regime xiita baseado no governo do imã, o outro hemisfério se vê às voltas com um movimento de secessão cujo objetivo é restaurar a república do Iêmen do Sul, independente até 1990. Os 23 milhões de habitantes amargam uma pobreza que lhes tira qualquer possibilidade de ascensão.
A nação mais miserável do mundo árabe encontra eco político e religioso na Universidade Al-Iman, uma entidade de orientação sunita baseada na capital, Sanaa. ;Seu presidente, o xeque Abdul Majid al-Zindani, jamais se distanciou de Osama bin Laden e é considerado um dos principais mentores do líder da rede terrorista Al-Qaeda;, comenta Elham Manea. De acordo com ela, o líder iemenita Ali Abdullah Salih conta com fortes aliados que se simpatizam com a jihad (guerra santa). ;O próprio Al-Awlaqi lecionou nessa universidade;, destaca. Ante a incapacidade (ou a indisposição) do governo em atacar o problema, o ministro das Relações Exteriores do Iêmen, Abu Bakr Abdullah al-Qirbi, admitiu que drones (aviões espiões não tripulados) dos EUA são utilizados pela Força Aérea iemenita para recolher dados de inteligência sobre os esconderijos dos terroristas.
Migração
Diretor-executivo do Investigative Project on Terrorism (Projeto Investigativo sobre Terrorismo), o jornalista e escritor norte-americano Steven Emerson elogia a decisão. ;Os aviões espiões mostraram-se bem-sucedidos ao dizimarem a liderança da Al-Qaeda na fronteira afegã-paquistanesa. Se os Estados Unidos obtiverem permissão para operar os drones de forma independente, também vão demandar a incursão terrestre de suas forças especiais no território controlado pela Al-Qaeda na Península Arábica (AQAP);, afirmou à reportagem, por e-mail. Ele acredita que agentes da Al-Qaeda no Afeganistão e sauditas libertados da prisão na base naval de Guantánamo migraram para o Iêmen. ;O ramo iemenita da rede parece ter um nova confraria de fabricantes de bombas, capazes de inventar formas únicas e novas de enviar bombas aos EUA;, acrescentou.
Emerson não se surpreendeu com a recente descoberta de explosivos em aviões. Segundo ele, o imã Anwar al-Awlaqi tem abandonado a inspiração de complôs para adotar uma postura operacional. ;A tática de enviar bombas implantadas em cartuchos de impressoras foi algo de que eu e a inteligência norte-americana jamais havíamos imaginado. Veremos uma nova onda de esforços engenhosos, por parte dos terroristas, para fazerem ingressar bombas nos EUA;, prevê. O escritor adverte, no entanto, que um desses dispositivos inevitavelmente explodirá e matará civis.
O jornalista iemenita Ameen Alahnomi, de 26 anos, vive em Sanaa e denuncia um ;exagero; da mídia ocidental. Ao mesmo tempo, reconhece a existência de bases da Al-Qaeda em seu país. ;A organização está presente aqui, mas se restringe a algumas áreas nas províncias de Abyan e Shabwa, e não exerce grande influência;, desabafa, pela internet. O francês Jean-Charles Brisard, especialista em terrorismo e advogado das famílias das vítimas do 11 de setembro, discorda de Ameen e vê o Iêmen como uma ;base histórica para o grupo;. ;O Iêmen atraiu agentes da Al-Qaeda hábeis, que atuavam no Iraque e no Afeganistão. Isso se reflete no sofisticado nível tático;, comenta. Brisard alerta que a rede de Bin Laden no país representa uma séria ameaça ao mundo. ;Ela já mostrou a habilidade de atacar fora do Iêmen e treina estrangeiros para alvejarem seus países.;
EUA ampliam restrição a voos
; A secretária de Segurança Interna dos Estados Unidos, Janet Napolitano, anunciou ontem novas medidas de segurança no transporte aéreo. Além de ampliar as restrições a cargas vindas da Somália, o governo norte-americano proibirá tinta e cartuchos de impressora acima de 450g em todos os voos de passageiros e de carga com destino aos EUA.