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4,5 milhões de eleitores haitianos vão às urnas para escolher o presidente

postado em 28/11/2010 09:14
O Haiti foi o primeiro país latino-americano a conquistar sua independência em 1804. Dois séculos depois, o povo haitiano tenta novamente caminhar com os próprios pés. Quase um ano após o terremoto que matou 250 mil pessoas e em meio a uma crise de cólera que leva centenas de pessoas às portas dos hospitais, a nação mais pobre do Caribe deve eleger um novo presidente. Apesar das dificuldades, cerca de 4,5 milhões de eleitores se preparam hoje para escolher o sucessor do presidente René Préval, além de eleger deputados e senadores. Um novo líder é um fator determinante para o desenvolvimento e o futuro do país.

Com o Haiti caminhando a passos lentos rumo à reconstrução e enfrentando uma epidemia de cólera que já matou mais de 1,6 mil pessoas desde outubro, o cenário não é o mais apropriado para uma eleição. Porém, de acordo com especialistas, a escolha de um novo governo é necessária para ajudar no desenvolvimento. ;É importante para o país criar uma experiência de sucessão de governo pela via pacífica e não por meio da violência, como ocorreu no passado. Há uma deficiência muito grande de gestão do Estado, que também se manifesta na sociedade;, comenta Antônio Jorge Ramalho, professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), que morou um ano e meio no Haiti.

A eleição é considerada um marco por causa da marcante presença internacional no país. Para o embaixador brasileiro no Haiti, Igor Kipman, o respaldo de outras nações ; no processo democrático e em relação ao novo governante ; é essencial para que o país possa progredir. ;A ajuda da comunidade internacional é necessária, mas se os haitianos não tomarem o controle da situação do país com as próprias mãos, não vão conseguir avançar. Estamos trabalhando para que isso ocorra;, disse o diplomata, por telefone, ao Correio.

Para Ramalho, uma eleição sem fraudes e bem monitorada aumenta a credibilidade do novo governo e pode ajudar a missão da ONU e a comunidade internacional a modificar auxílio ao país. ;Com a promoção da segurança, será possível reduzir o contingente militar, em benefício do desenvolvimento social e econômico a longo prazo. Será momento de promover a estabilidade e a segurança a médio prazo, para depois iniciar a transformação. Isso seria um êxito para o trabalho tanto da ONU quanto do Brasil;, afirma.

As eleições presidenciais estavam marcadas para fevereiro, mas foram adiadas por conta do terremoto. Para ajudar o país a organizar o pleito, o Brasil doou cerca de US$ 500 mil. Com um orçamento de US$ 30 milhões para o pleito, os Estados Unidos, a União Europeia, o Japão e o Canadá também deram contribuições financeiras. ;No dia da eleição, vamos fazer um trabalho de observação eleitoral em uma missão grande com a Organização de Estados Americanos (OEA). A função da votação e da apuração é toda dos haitianos;, explica o embaixador Kipman.

Dezenove candidatos se registraram para as eleições. Entre os favoritos para ocupar o lugar de Préval está a professora Mirlande Manigat, de 70 anos, viúva de Leslie Manigat, presidente derrubado em 1988 por um golpe militar. Se eleita, ela será a primeira mulher a comandar o país. Jude Célestin, de 48 anos, é engenheiro mecânico e protegido de Préval. Em terceiro lugar nas pesquisas, está o cantor Michel Martelly, conhecido por tirar as calças durante os shows e por ter grande apelo entre os mais jovens.

Os candidatos não dispõem de grandes recursos para a campanha. Não existe horário eleitoral obrigatório e o principal meio de comunicação é o rádio. As ruas da capital, Porto Príncipe, e das cidades do interior estão repletas de cartazes. As pesquisas não são 100% confiáveis, porém tudo indica que a disputa deve ser decidida no segundo turno. O novo presidente assumirá em fevereiro de 2011 e enfrentará outros desafios, como o desemprego, a pobreza e a insegurança.


ELE ESCAPOU DE EMBOSCADA

Michel Martelly foi vítima na sexta-feira de uma emboscada em Cayes, no sul do país, que terminou com um morto e vários feridos. ;Martelly estava na rua com seus eleitores. As pessoas esperavam em uma rua. Houve uma emboscada. Dispararam contra a multidão usando armas automáticas;, disse Karine Beauvoir, assessora do candidato. O porta-voz da polícia da ONU no Haiti, Jean-François Bezina, confirmou ontem que a equipe de Martelly havia sido vítima na véspera de um ;incidente em Cayes;. Os simpatizantes de Martelly acusam o partido Inite, do candidato Jude Célestin.


Brasil no comando da segurança
Com 1.485 centros de votação espalhados por todo país, os haitianos esperam votar com tranquilidade. Depois de vários rumores sobre um possível cancelamento das eleições e boatos de que poucos eleitores compareceriam às urnas, o pleito contará com um forte esquema de segurança. Pelo menos 9 mil militares que participam da Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti (Minustah), inclusive as tropas brasileiras, devem garantir a ordem nas seções eleitorais.

Os militares começaram a planejar o trabalho de segurança nas eleições há cinco meses, em parceria com as polícias da ONU e haitiana. ;Durante todo esse tempo, fizemos reconhecimento em todos os centros de votação do país e verificamos os termos de segurança. Teremos um efetivo em cada local, de acordo com essa classificação prévia. Nosso objetivo é trabalhar em conjunto com os haitianos e cooperar com as estratégias de ação;, afirmou por telefone o general Luiz Guilherme Paul Cruz, comandante da Minustah.

De acordo com o militar brasileiro, responsável por todas as tropas estrangeiras no país, manifestações são esperadas. ;Em qualquer processo eleitoral, comícios de diversos partidos ou reivindicações, é uma pauta absolutamente normal, nós ficamos atentos a episódios indesejados de violência. Nosso esforço será o de evitar qualquer tipo de confronto;, explica o general.

Nos últimos dias, a população foi às ruas para protestar contra as condições precárias de atendimento aos doentes de cólera. Para Paul Cruz, o clima no país é tranquilo pouco antes do pleito e deve permanecer assim. ;A expectativa de votar é grande, apesar de as pessoas terem um pouco de receio por causa da epidemia de cólera. Há consciência da continuidade do processo democrático, que vai permitir a recuperação e o progresso do país, com um governo legítimo que possa ter acesso a todos os recursos;, completa o comandante da Minustah. (TS)

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