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Confira trechos da biografia de Obama escrita pelo editor da New Yorker

postado em 01/12/2010 07:20
;No início do outono de 1988, Obama chegou a Cambridge certo de que aprenderia o que mais tarde chamou de ;um modo de pensar;, tendo assumido dívidas de milhares de dólares por esse privilégio. Ao contrário de muitos estudantes que seguiam o curso de direito sem outra razão ; a não ser o valor como destaque no currículo ;, Obama se matriculou em Harvard consciente, por ser um lugar sério, capaz de oferecer avanços no conhecimento que jamais adquiriria como organizador na zona sul de Chicago. Em Harvard, ele entraria para o mundo dos supermeritocratas de sua geração, passando de observador a participante.;

[SAIBAMAIS];Dois anos depois de deixar o Senado de Illinois, Obama mal tinha acabado de pagar suas dívidas da faculdade quando entrou para a disputa presidencial com uma plataforma política de centro-esquerda séria, mas sem nada de excepcional;

;Quem Obama era, de onde vinha, como forjou sua personalidade e, finalmente, como conseguiu projetar seu temperamento e seu caráter como um reflexo das ambições e esperança dos americanos se tornariam a fonte de sua retórica e de seu encanto;

;A identidade racial de Obama foi tão propiciada quanto escolhida; ele a buscou e a aprendeu. Amparado por uma mãe branca amorosa e avós brancos solidários, criado numa ilha multicultural onde sua tonalidade era ausente, Obama teve de reivindicar essa identidade depois de estudar, observar e até fazer suposições.;

;Obama precisou de muito tempo para equilibrar a inquietude do comportamento de seus pais com um cosmopolitismo enraizado que ele conseguisse aceitar.;

;Obama comparecia a reuniões de vários grupos, mas não com muita freqüência. Ele se envolvia aos poucos, mas com profundidade, no sentido político. Tinha uma forte curiosidade intelectual. A perspectiva de uma vida passiva o frustrava. Durante o segundo ano ele apresentou uma evolução inegável, estabelecendo objetivos e metas. Isso era notável ; por exemplo, quando resolveu se declarar ;Barack; e não mais ;Barry;. Foi uma tomada de decisão;

;O traje costumeiro de Obama era calça jeans ou bermuda, camisa ou camiseta com estampa havaiana e chinelo. Completava o visual com um Malboro pendurado nos lábios. Pelos padrões da época e do local, ele não exagerava no uso de drogas. Mas a maconha e o haxixe eram tão comuns quanto a cerveja nas festas dos dormitórios Haines, e Obama não hesitava em participar da folia. O segundo semestre de seu segundo ano de faculdade ganhou o apelido de ;primavera de cocaína em pó;, e Obama nunca negou ter ;cheirado uma carreirinha;. Só quando se transferiu para Columbia ele decidiu parar com as drogas e se dedicar aos estudos e ao seu futuro;

;No verão de 1981, antes de chegar a Nova York, Obama viajou para a Ásia por três semanas. (;) A viagem o virou do avesso. Exposto a um lugar como o Paquistão, na idade adulta, ele viu como as pessoas viviam de modo diferente. Barack conheceu lá um indivíduo descendente de africanos. Os africanos foram levados ao Paquistão pelos árabes muitos anos atrás ; parte do comércio escravagista, mas em sentido inverso. Ver alguém assim deixou Barack muito impressionado. Sentou-se na frente dele e , apesar de não haver um idioma em comum, os dois tentaram se comunicar. Aquele momento ficou marcado em sua mente;

;Como muitos jovens promissores e ambiciosos, em especial com o pai ausente, Barack Obama sentia muita falta de mentores. Ele tinha o dom de conquistar a simpatia dos mais velhos e levá-los a mostrar mundos desconhecidos. Mais do que muitos contemporâneos seus, percebeu que podia aprender com os veteranos tarimbados que tinham um conhecimento especial da forma como as coisas funcionavam, e sua vontade de aprender despertava neles a vontade de ensinar;

;Quando chegou a Chicago, Obama já tinha feito as pazes tanto com seu nome quanto com sua identidade racial. Sua atuação na zona sul lhe dava algo mais amplo ; uma ligação profunda com a comunidade afro-americana. Ele não era mais um estudante querendo fazer amizades numa Associação de Estudantes Negros. Aquilo ali era a vida cotidiana, de contatos naturais, fosse em casa em Hyde Park ; ambiente integrado, de classe média, universitário, ou no extremo sul, entre pobres e desvalidos.;

;A maioria dos dias de Obama era de pura frustração. Pela norma, trabalhava-se durante anos num projeto ; a batalha contra a expansão dos perigosos depósitos de resíduos tóxicos, por exemplo ; até uma aparente vitória, só para ver a ideia engavetada por um burocrata municipal. Mas Obama estava recebendo uma educação política, racial e sentimental.;

;Quanto mais Obama comparecia aos cultos na Trindade (Igreja da Trindade Unida em Cristo), mais a retórica de (Jeremiah) Wright influenciava seu pensamento e sua forma de expressão. Obama admirava a maneira como Wright reagia às necessidades de sua comunidade. (...) Os pronunciamentos políticos de Wright, que duas décadas depois conturbariam a campanha presidencial de Obama, ainda não estavam em evidência.;

;No início do outono de 1988, Obama chegou a Cambridge certo de que aprenderia o que mais tarde chamou de ;um modo de pensar;, tendo assumido dívidas de milhares de dólares por esse privilégio. Ao contrário de muitos estudantes que seguiam o curso de direito sem outra razão a não ser o valor como destaque no currículo, Obama se matriculou em Harvard consciente, por ser um lugar sério capaz de oferecer avanços no conhecimento que jamais adquiriria como organizador na zona sul de Chicago. Em Harvard, ele entraria para o mundo dos supermeritocratas de sua geração, passando de observador a participante.;

;O relacionamento de Obama com Michelle não estava livre de complicações. As ambições e o ego considerável de Barack costumavam bater de frente com o desejo de estabilidade e companheirismo de Michelle. Mas o relacionamento era sua âncora afetiva.;

;Não falta humor a Obama na intimidade. Por vezes o gracejo irônico, zombeteiro, se intromete em suas aparições públicas.;

;Como havia acontecido na época em que foi organizador e estudante de direito, Obama ficou conhecido pelo ímpeto de reconciliar pontos de vista díspares, por procurar convergências onde elas poderiam existir e, ao fazer isso, estabelecer alianças.;

;Na campanha, Obama provou-se um novato desajeitado, embora sincero. Pedante, distante, às vezes um tanto condescendente, mais adequado a um seminário na Universidade de Chicago do que para o palanque ou o púlpito de uma igreja negra em Englewood.;

;Era uma noite de triunfo, mas o tom de Obama não era triunfal, não era altissonante; seu tom era grave. Depois de se definir, vinte meses antes em Selma, como alguém que ;se ergue sobre os ombros de gigantes;, como líder da geração de Josué, ele nem precisava mencionar o fator raça. Era aquela coisa sempre presente e tão raramente citada. Ele celebrava a identidade negra, e, ao mesmo tempo, a passava tranquilamente para o segundo plano.;

;Uma lição que Obama deu a impressão de haver interiorizado logo no início de seu governo foi não existir proveito em falar sobre raça quando o assunto não estava em termos;

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