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ONU alerta para violência e exige que Gbagbo reconheça vitória de Ouattara

postado em 23/12/2010 08:00
Marfinesas protestam contra assassinatos em Abbatoir, na periferia de Abidjan: mercenários à espreitaO empresário Mohamed Diaby, 30 anos, deixou seu apartamento, na região sul de Abidjan, uma semana antes do segundo turno da eleição presidencial na Costa do Marfim. ;Vários amigos meus me ligaram e disseram que pessoas tentaram invadir suas casas. Um colega da Agência Nacional de Segurança contou-me que meu telefone estava grampeado;, relatou ao Correio, pela internet. Diaby integra um grupo de cidadãos marfinenses que utiliza o microblog Twitter para divulgar informações sobre a crise política no país. ;Espero que você não publique coisas diferentes das que eu disse ou me colocará em mais apuros do que estou;, pediu.

O medo de Diaby se justifica. O país, no oeste da África, enfrenta uma ameaça de guerra civil, enquanto o presidente Laurent Gbagbo e o rival Assane Ouattara proclamam vitória no pleito (leia o Entenda o caso). Gbagbo exige que as forças de paz da Organização das Nações Unidas (ONU) deixem o país ; o Conselho de Segurança estendeu o mandato das tropas por mais seis meses. ;O mundo declarou guerra à Costa do Marfim;, disse o atual mandatário, que em vão ofereceu ao adversário uma ;investigação internacional; para rever a votação.

;A intenção do senhor Gbagbo e das forças de segurança leais a ele é claramente bloquear a missão de paz da ONU e sufocar o governo do presidente eleito Ouattara. Não podemos permitir isso;, alertou o sul-coreano Ban Ki-moon, secretário-geral das Nações Unidas. Ele confirmou as notícias de que ;mercenários, incluindo ex-combatentes da Libéria, foram recrutados para alvejar certos grupos da população;. Por meio do Twitter, o estudante francês-marfinense Edouard Kouadio, de 23 anos, desabafou: ;Estou com medo de uma guerra civil, porque você sabe que quando um conflito começa, ninguém prevê quando ele terminará;.

Segundo Kouadio, a capital de 5,5 milhões de pessoas tem registrado assassinatos nos bairros de Abobo, Koumassi e Adjamé, todos bastiões de Ouattara. ;Muitas dessas mortes ocorrem durante a noite, a cargo dos mercenários de Gbagbo;, denuncia. Ele acusa o chefe de Estado de contratar matadores de aluguel de Angola e da Libéria.

As noites têm sido especialmente tensas em Abidjan. ;Durante as madrugadas escutamos tiros. Um toque de recolher durou três semanas e foi suspenso ontem (terça-feira);, comentou Diaby. O empresário também admitiu à reportagem ter informações de que ao menos 100 pessoas morreram e 500 estão desaparecidas no país. ;Acho que o número de mortos é bem maior, porque escutamos sobre covas coletivas e ninguém tem acesso a alguns locais, sob controle do Exército;, explicou. Por meio de um comunicado divulgado na segunda-feira, em Paris, a Federação Internacional das Ligas dos Direitos Humanos (FIDH) reconheceu 50 mortes e denunciou raptos noturnos.

Resposta
Na tentativa de forçar uma rendição de Gbagbo, a comunidade internacional começa a tomar medidas retaliatórias. Robert Zoellick, presidente do Banco Mundial, anunciou que todos os recursos destinados à Costa do Marfim foram congelados. ;Também já conversei com o presidente (Amadou Toumani) Touré (do Mali) sobre a necessidade de que os bancos centrais e a União Econômica e Monetária do Oeste Africano também congelem os empréstimos, e é o que fizeram;, relatou. Soro Guillaume, o primeiro-ministro indicado por Ouattara, pediu ao Ocidente que use as armas contra Gbagbo.

O confronto político já coloca em risco a sobrevivência dos marfinenses. O comércio enfrenta desabastecimento agudo e as poucas mercadorias tiveram os preços aumentados em até 40%. ;A Costa do Marfim está à beira de uma guerra civil. A ONU sabe disso e, por isso, estendeu o mandato de suas forças. Nenhum governo deveria negociar com Gbagbo e o reconhecimento diplomático precisa ir para Ouattara;, defendeu Lansana Gberie, analista do Instituto para Estudos de Segurança (ISS) de Adis-Abeba (Etiópia), em entrevista por e-mail. Na opinião dele, Gbagbo não resistirá a uma pressão bem articulada externa.


ITAMARATY APELA À DEMOCRACIA
O Ministério das Relações Exteriores brasileiro conclamou Laurent Gbagbo e Assane Ouattara a ;respeitarem os resultados das eleições; e a atenderem aos apelos da reunião extraordinária da Comunidade Econômica dos Estados da África do Oeste (Cedeao), realizada 16 dias atrás. Segundo a nota do Itamaraty, o governo do Brasil ;acompanha com preocupação os acontecimentos decorrentes do segundo turno das eleições presidenciais; na Costa do Marfim. ;O governo brasileiro exorta as partes a agirem com moderação e a encontrarem uma solução para o impasse por meios pacíficos, em consonância com o espírito do Acordo Político de Uagadugu, de março de 2007, de modo a alcançar um rápido restabelecimento da normalidade democrática e constituição da Costa do Marfim;, afirmou o comunicado.


Eu acho...

;A Organização das Nações Unidas deveria chutar Laurent Gbagbo, porque é um mentiroso, assassino e misantropo. É preciso que a comunidade internacional aplique sanções e utilize força militar contra ele. Gbagbo é um vigarista. Usa seu poder de grande demagogo, a TV estatal e a propaganda. Por sua vez, Alassane Ouattara conta com o apoio externo;
Edouard Kouadio, 23 anos, estudante francês-marfinense


ENTENDA O CASO
Resultados polêmicos
O presidente Laurent Gbagbo e seu adversário, Alassane Ouattara, afirmam ter ganho as eleições de novembro. No entanto, em dezembro, a Comissão Eleitoral independente da Costa do Marfim deu a vitória a Ouattara, que obteve 54,1% dos votos. Gbagbo teria obtido 45,9%. Sem aceitar o resultado, Gbagbo levou a disputa ao Conselho Constitucional, que misteriosamente reverteu a situação.

No último dia 3, o órgão anulou 500 mil votos nos redutos de Ouattara. Gbagbo propôs um comitê internacional para investigar as eleições; a apuração envolveria a União Africana, a Comunidade Econômica dos Países da África Ocidental (Ecowas, pela sigla em inglês), os EUA, a ONU, a União Europeia, a Rússia e a China. Ouattara descartou a oferta e exigiu seu reconhecimento como novo presidente do país.

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