postado em 27/12/2010 08:50
Uma delegação de alto nível da África Ocidental desembarca amanhã em Abidjan com a missão quase impossível de convencer Laurent Gbagbo, autoproclamado reeleito na votação de novembro, a reconhecer a derrota e entregar ao rival Alassane Ouattara a faixa de presidente da Costa do Marfim. Ouattara foi proclamado vencedor pela Comissão Eleitoral e reconhecido pelas Nações Unidas e pela União Africana (UA) . A Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (Cedeao), que fez uma reunião de emergência, acenou até com o ;uso legítimo da força; para garantir ;os objetivos do povo marfinense;. Mas a primeira resposta do governo marfinense, nas palavras do porta-voz Ahoua Don Mello, foi o convite a um duelo: qualquer intervenção externa poderá deflagrar uma guerra civil.Em tom desafiante, apesar do isolamento quase absoluto de Gbagbo, o porta-voz menosprezou o risco de uma ação militar por parte da Cedeao, e insinuou uma ameaça aos milhares de africanos atraídos para a Costa do Marfim pela próspera economia cacaueira. ;Somos um país de imigrantes. Todos esses países têm cidadãos aqui e sabem que, se nos atacarem, o conflito se tornará uma guerra interna;, afirmou Mello, que responde pela pasta de Infraestrutura e Saneamento no governo de Gbagbo. ;Será que Burkina Fasso está pronto para receber de volta os 3 milhões de habitantes que migraram para a Costa do Marfim?;
Desde que o impasse se instituiu, com a proclamação dos resultados divergentes para a eleição presidencial, sucedem-se os confrontos entre partidários do atual presidente, cujo grupo político predomina na capital e no sul do país, de população majoritariamente cristã, e do candidato oposicionista, cujos redutos se concentram no norte, de maioria muçulmana. Pelo menos 173 pessoas morreram, segundo o escritório local das Nações Unidas, embora outras fontes falem em mais de 200 vítimas. O Alto Comissariado para Refugiados contabiliza a fuga de 14 mil marfinenses para a Libéria.
Desde que a Assembleia Geral reconheceu oficialmente Ouattara, 800 soldados da ONU protegem seu gabinete, instalado em um hotel de Abidjan. O governo reagiu exigindo a retirada da força internacional de paz, cujo efetivo é composto de 10 mil combatentes, e um aliado próximo ao presidente sugeriu que os ;capacetes azuis; passarão a ser considerados uma ;força rebelde; caso a ordem de partida não seja acatada.
;Complô;
O porta-voz de Gbagbo classificou a resolução da Cedeao como ;um complô ocidental encabeçado pela França; ; um dos primeiros países a exigirem que Ouattara seja empossado. Nas últimas semanas, multiplicaram-se os pronunciamentos em favor do líder oposicionista, que foi primeiro-ministro em um regime de coabitação costurado para pôr fim à guerra civil de 2002-2004. Gbagbo, eleito pela primeira vez em 2000, sustenta que o oponente teria obtido 54% dos votos, segundo a apuração da Comissão Eleitoral, por meio de fraude em massa no norte. O presidente resiste a aceitar a derrota com base no pronunciamento da Corte Constitucional ; o que lhe dá legitimidade formal ; e no apoio declarado dos militares.
;O povo da Costa do Marfim se mobilizará, isso aumenta o nosso patriotismo, nossa fé no patriotismo marfinense;, insistiu o porta-voz oficial, desafiando a Cedeao a cumprir a ameaça de intervenção militar. O cerco a Gbagbo, porém, não é apenas diplomático. O Banco Central dos Estados da África Ocidental decidiu não mais reconhecer seu governo como legítimo e vetou a transferência dos recursos do país ao presidente de fato e aos seus subordinados. Pior: o acesso aos fundos foi transferido para a equipe de Alassane Ouattara.