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Após atentado contra igreja, protestos violentos sacodem Cairo e Alexandria

Papa Bento XVI denuncia "ofensa a Deus" e é acusado de "ingerência" por líder sunita

postado em 03/01/2011 08:00
Papa Bento XVI denuncia A imagem do Cristo manchada a sangue, do lado de fora da Igreja Al-Qiddissine (Igreja dos Dois Santos), em Alexandria, expôs a ameaça de um conflito religioso sem precedentes, envolvendo os cristãos coptas e os muçulmanos do Egito. O atentado terrorista que matou 21 fiéis e feriu 97, na madrugada de sábado, provocou uma onda de protestos no Cairo, motivou uma forte condenação por parte do Vaticano e causou mal-estar entre líderes islâmicos egípcios e a Santa Sé. Durante a missa dominical, na Praça de São Pedro, o papa Bento XVI denunciou ;uma estratégia de violência que visa os cristãos;. ;Este gesto covarde de morte (;) ofende a Deus e a toda humanidade;, declarou o pontífice. ;Frente a esta estratégia de violência que visa os cristãos e tem consequências em toda a população, rezo pelas vítimas e por pessoas próximas a elas;, acrescentou.

O grande imã de Al-Azhar, Ahmed Al-Tayyeb, criticou o chefe da Igreja Católica, acusando-o de cometer ;ingerência inaceitável; nos assuntos do Egito. ;Não estou de acordo com o ponto de vista do papa, e me pergunto por que ele não pede proteção para os muçulmanos quando são mortos no Iraque;, disse o responsável pela grande instituição do islã sunita sediada no Cairo, que anunciou a formação de um comitê conjunto com a Igreja para avaliar os motivos das desavenças entre as duas comunidades religiosas. Em entrevista pela internet, o cristão copta Magued Hanna, de 29 anos, relatou que os fiéis se concentraram diante da Catedral Ortodoxa Copta de São Marcos ; a sede da Igreja Cristã Copta, situada no bairro de Abássia, no Cairo. ;Os manifestantes atacaram os carros de Al-Tayyebe e do grande mufti, Aly Goma, que foram ao local apresentar suas condolências;, contou. Aos gritos de ;Somos egípcios, assim como os muçulmanos;, a multidão também bradou palavras de ordem contra o Ministério do Interior. O presidente, Hosni Mubarak, apelou novamente à união e lembrou que o ataque alvejou toda a população do país, e não apenas os coptas.

As autoridades egípcias tentam exibir eficiência nas investigações e evitar novos massacres. A polícia anunciou ontem que deteve sete suspeitos e libertou outros 10, por falta de provas. Ao mesmo tempo, indicou não ter elementos que sustentem o envolvimento de estrangeiros na explosão do carro-bomba, aparentemente causado por um extremista suicida. Duas semanas atrás, um site fundamentalista islâmico publicou um comunicado no qual instava muçulmanos a atacar igrejas no Egito. Jornais de várias tendências repercutiram o pedido de Mubarak por uma união nacional e alertaram para as consequências do aumento da violência. ;Alguém quer ver o país explodir e provocar uma guerra civil religiosa;, advertiu o Rose Al-Yusef, simpatizante do governo. De acordo com o independente Al-Choruk, os terroristas pretendem lançar o Egito num quadro de guerra civil semelhante ao que ocorreu no Líbano, em abril de 1975.

Incidentes
;Alguns bastardos doentes comemoraram a explosão em Alexandria e enfureceram os coptas;, denunciou ao Correio o engenheiro de software Fady Anwar, de 27 anos, também cristão e morador do Cairo. ;As tensões por aqui têm aumentado, com incidentes recentes no bairro de Omraneya, depois que as autoridades nos proibiram de erguer um local para adoração;, acrescentou.

Por volta das 23h20 (19h20 em Brasília), o jornalista Mohammed Abdelfattah reportou choques entre cristãos e muçulmanos às portas da Igreja Al-Qiddissine, em Alexandria. ;Ouvi pessoas entoando ;Allahu Akbar;(;Deus é maior;, em árabe). Vi pedras sendo arremessadas por jovens muçulmanos contra as forças de segurança;, escreveu, em sua página no microblog Twitter. ;A situação é extremamente volátil.;

Especialista renomado em islã, o indiano Muqtedar Khan ; cientista político da Universidade de Delaware ; se disse consternado e chocado com o atentado. ;Já houve várias escaramuças entre as duas comunidades nos últimos meses;, lembrou, em entrevista pela internet. Ele acredita que o governo Mubarak castigará os terroristas, de forma exemplar, e não permitirá a retaliação cristã. ;O ataque não era esperado. O terror no Egito se tornara mais raro. Ao menos que o governo aja rapidamente para proteger a comunidade copta, veremos alguns distúrbios;, prevê. Em um país com uma população de 72,3 milhões de muçulmanos e apenas 7,2 milhões de coptas, as autoridades precisarão de pulso firme para impedir um desastre. ;Esse ato terrorista estremeceu a consciência da nação. O sangue de nossas crianças não terá sido em vão e vamos cortar fora as mãos do terrorismo;, disse Mubarak, em pronunciamento pela TV.

Eu acho...
;Temo que as tensões com os muçulmanos se agravem até um ponto em que o governo perca o controle da situação. Nós, coptas, somos discriminados no Egito. É algo considerado normal por aqui. Sofremos preconceito no trabalho, nas escolas e universidades, nas delegacias de polícia. Somos tratados como cidadãos de segunda classe, como infiéis;
Fady Anwar, 27 anos, engenheiro de software, morador do Cairo

;A perseguição por aqui é constante, direta, sutil e oficial. A motivação do ataque à Igreja Al-Qiddissine, em Alexandria, é o ódio da religião islâmica. Eu me sinto inseguro, odeios os muçulmanos e o islã. Não é seguro viver com eles em um mesmo lugar.;
Magued Hanna, 29 anos, desempregado, cristão copta do Cairo

Conflitos religiosos no Egito

Os enfrentamentos entre muçulmanos e cristãos coptas são recorrentes no Egito, onde um atentado contra uma igreja copta em Alexandria, na madrugada de sábado, deixou 21 mortos. Os coptas, aproximadamente 8% dos 80 milhões de egípcios, denunciam que são alvo de discriminação e de atos de assédio. Eles têm sido um dos alvos principais da violência islâmica que o Egito tem sofrido desde março de 1992. A seguir, os principais confrontos ocorridos nos últimos 30 anos.

; 17 de junho de 1981: 14 mortos e 50 feridos em confrontos que, segundo a versão oficial da época, foram desencadeados por uma simples briga de vizinhos. Segundo testemunhas, o conflito envolvia uma parte do terreno onde devia ser construída uma igreja e que integristas islâmicos ocuparam para erguer uma mesquita.

; 4 de maio de 1992: 14 mortos (13 coptas e um muçulmano) em enfrentamentos em Manchiet Nasser (Alto Egito), provocados pela morte, em março, de um muçulmano, por causa de um conflito provocado pela compra de uma casa.

; 12 de fevereiro de 1997: atentado contra uma igreja de Abu Qurqas (Alto Egito) causa a morte de nove coptas.

; 3 de janeiro de 2000: 20 cristãos do Egito morrem no povoado de Al Kocheh (Alto Egito) nos mais violentos confrontos entre muçulmanos e cristãos registrados no país em 20 anos.

; 14 de abril de 2006: um operário muçulmano (apresentado pelas autoridades como um desequilibrado) ataca três igrejas de Alexandria e mata um copta de 78 anos. Outra pessoa morre em confrontos entre as duas comunidades, desencadeados a partir dos ataques.

; 31 de maio de 2008: muçulmanos invadem um mosteiro em Malaui (Alto Egito), ferindo a tiros quatro coptas, três deles monges. Outros três monges são sequestrados em uma noite. Morre um dos agressores muçulmanos.

Esse ataque ocorre em meio a um clima de crescente tensão entre as duas comunidades em um momento em que os coptas levantam, com autorização das autoridades, um muro ao redor do antigo mosteiro de Abu Fena.

; 6 de janeiro de 2010: seis coptas e um policial morrem em Nagaa Hamadi (Alto Egito), alvo de tiros de três desconhecidos que abriram fogo contra a multidão em uma rua comercial na véspera da comemoração do Natal copta.

; 24 de novembro de 2010: dois coptas morrem em manifestações de cristãos contra a proibição de construir uma igreja em um bairro do sudoeste do Cairo.

; 1; de janeiro de 2011: 21 mortos e 79 feridos em um atentado na saída de uma igreja copta de Alexandria, depois da missa de Ano Novo. O atentado não foi reivindicado.

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