Mundo

Sudaneses do sul começam a votar hoje sobre divisão do país

postado em 09/01/2011 10:18
Maputo (Moçambique) ; Apontado pela comunidade internacional como um ;marco para a consolidação da paz; no Sudão, a consulta popular que deve dividir o maior país da África inquieta estudiosos africanos consultados pela Agência Brasil.

De hoje (9/1) até 15 de janeiro, os sudaneses do sul votam na consulta popular prevista no acordo de paz que pôs fim à guerra civil, que durou mais de 20 anos no país. Quatro milhões dos 40 milhões de sudaneses irão dizer se querem ou não que a parte sul torne-se uma nação independente. Os resultados serão homologados em fevereiro.

Para o ex-presidente norte-americano Jimmy Carter, um dos observadores internacionais, ;o referendo é um passo crítico no sentido da implementação do acordo de paz;. Segundo ele, citado pelo Carter Center, a expectativa é de que ;o processo ajude o povo do Sudão a trabalhar em um futuro pacífico, independentemente do resultado [da votação];.

O centro presidido por Carter enviou mais de 100 observadores para acompanhar a consulta popular sudanesa. O ex-secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), o ganês Kofi Annan, também estará presente. ;É importante que todos os líderes políticos honrem os compromissos para manter a paz no Sudão, como o previsto no acordo de paz;, afirmou.

Mas, entre os analistas africanos, a certeza não é tão grande. ;Isto não é bom na história política de África;, afirma Aly Jamal, doutor em relações internacionais e especializado em conflitos africanos. ;Isso pode ser um mal exemplo para alguns países onde as circunstâncias não são iguais, mas podem ser procuradas para justificar o uso do mesmo caminho;, disse. ;Já temos o caso do Congo, a República Centro Africana... se um rastilho semelhante ocorre por aquelas bandas, vamos fazer referendo para autodeterminação?;, pergunta Aly Jamal.

Citado pelo jornal moçambicano O País, o investigador do Instituto de Ciências Políticas em Paris, o sudanês Roland Marchal, chama o processo no Sudão de ;Berlim 2;, lembrando que foi na Conferência de Berlim, em 1885, que as potências europeias dividiram a África entre si, demarcando fronteiras sem levar em conta, em muitos casos, aspectos culturais, sociais e étnicos das comunidades atingidas.

Para a professora Iraê Baptista Lundin, do Instituto Superior de Relações Internacionais de Moçambique e que participou do grupo que negociou a paz para guerra civil do país (entre 1992 e 1994) trata-se da quebra de outro tratado, mais recente. ;Em 1963, quando foi criada a Organização dos Estados Africanos, foi definido que as fronteiras iriam permanecer, para não criar mais problemas. Já quebramos esse tratado quando separou-se Eritreia da Etiópia (em 1993). Se acontecer a separação do Sudão será a segunda vez.;

Entretanto, lembra a professora, a Eritreia já havia existido como estado separado, o que não ocorre com o Sudão do Sul. Em 1962, logo depois da independência da Itália, a Eritreia foi anexada à Etiópia. Após uma guerra de mais de 30 anos, votou a favor da sua separação em 1993.

;O ideal teria sido discutir mais autonomia, instituir o federalismo;, defende Iraê Lundin. ;Nigéria e África do Sul têm, hoje, estados federados. A história mostra que é possível encontrar outras saídas. Tenho receio de que [a possível divisão] vá exacerbar um conflito que, neste momento, está latente ; e é um dos mais antigos de África.;

O professor Aly Jamal concorda. ;A comunidade internacional ficou satisfeita com a simples ideia de ;vamos fazer a paz. Vamos determinar o que que eles querem;... Mas não foi atrás daquilo que, objetivamente, tem a sido causa de todos os problemas;, afirma. ;Se, pelo menos, o referendo ocorresse com uma delimitação bastante clara sobre o traçado de fronteira, traria mais tranquilidade. Mas isso ficou para depois;.

Os especialistas dizem, porém, que o temor não é de um conflito imediato. ;O Sul não tem interesse em entrar numa guerra logo depois de formar-se como estado autônomo;, diz Aly Jamal. ;Nem o Norte, certamente, quererá se envolver nisso;. O tempo até que a tesão renasça não depende só dos sudaneses. ;Quem tem interesse no petróleo e nas outras riquezas que estão ali vai tem um importante papel na moderação;, diz Aly Jamal. ;Com um país ou dois, elas vão continuar existindo;.


Edição: Aécio Amado

Leia também:

* Cerca de 4 milhões de eleitores vão às urnas no Sudão para definir se país deve ser dividido


Fale com a Ouvidoria

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação