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Atentado leva sociedade a questionar paixões partidárias nos Estados Unidos

postado em 10/01/2011 08:00
Enquanto a deputada democrata Gabrielle Giffords luta pela vida, moradores de Tucson fazem vigílias e rezam para que ela se recupere dos ferimentosHá uma semana, a deputada norte-americana Gabrielle Giffords comentou com um colega que estava preocupada com uma possível onda de violência em seu estado. Na manhã de sábado, enquanto ela conversava com eleitores em frente a um supermercado, um jovem de 22 anos se aproximou do grupo e começou a atirar. Os disparos deixaram seis pessoas mortas e 13 feridas, inclusive a democrata do Arizona. Os Estados Unidos agora questionam se o ataque foi ;apenas; um ato de fúria de um indivíduo perturbado ou a consequência da cada vez mais inflamada disputa entre republicanos e democratas, o que pode abrir espaço para um aumento do radicalismo no país.

O atentado trouxe à tona um debate em Washignton sobre o tom das discussões partidárias nos últimos anos. A troca de ofensas e os argumentos fortes podem ter ido longe demais ; mesmo que não se possa responsabilizar diretamente a fogueira ideológica pelo ato tresloucado do atirador. Gabrielle Giffords começou o terceiro mandato no começo da semana passada, depois de ter conseguido a reeleição, em novembro de 2010, com a estreita margem de dois pontos percentuais sobre Jesse Kelly, candidato republicano ligado ao movimento neoconservador americano Tea Party.

Apesar de ser uma democrata de ideais moderados, Gifford vinha recebendo ameaças e seu escritório eleitoral em Tucson foi alvo de vandalismo, nos últimos dois anos. O Arizona é um estado cindido, principalmente pela discussão sobre a duríssima lei contra os imigrantes ilegais aprovada no ano passado. A deputada chegou a aparecer em uma lista contra políticos democratas que defendiam a reforma da saúde de Barack Obama. O ;mapa de alvos; foi feito pela ex-governadora do Alasca e ex-candidata a vice-presidente republicana, Sarah Palin, divulgada em seu Facebook.

De acordo com o deputado democrata James P. Moran, da Virgínia do Norte, Gifford não se sentia segura ultimamente, porque grande parte do estado era contra o governo Obama e a favor do porte de armas sem restrições. ;Ela me disse que estava preocupada e que a coisa estava feia por lá, especialmente em um distrito como o dela. Ela também estava incomodada por Sarah Palin tê-la colocado na mira;, disse o político ao jornal The Washington Post.

Apesar de o motivo real do tiroteio no Arizona não ter sido revelado, a discussão sobre a temperatura política tomou conta dos noticiários de televisão e dos jornais americanos com debates sérios. ;Nós nos transformamos na Meca do preconceito e do fanatismo;, disse Clarence Dupnik, o xerife do condado de Pima, no Arizona, encarregado de investigar o ataque. Um senador republicano, que não revelou a identidade, criticou o caos midiático ao site Politico. ;Precisamos refletir depois desse episódio: onde vamos chegar? O que era considerado ir muito longe na época de Oklahoma City (referência ao atentado a um prédio federal na cidade, em 1995, cometido por um supremacista branco) é aceito agora. Há uma dessensibilização. Nesses debates e nas tevês a cabo e em programas de rádio, todo mundo está tentando superar o outro (na agressividade);, afirmou.

Judson Phillips, um dos fundadores do Tea Party, reagiu, afirmando que os democratas estavam tentando ;silenciá-los;. ;A esquerda está tentando nos atingir com isso. A verdade é que o atirador era um lunático liberal. Ênfases nessas duas palavras;, atacou.

Indiciamento
O jovem atirador Jared Lee Loughner se recusou a falar durante o interrogatório policial. Ele foi indiciado por assassinado e tentativa de assassinato. A polícia do Arizona suspeitava que um segundo homem teria sido cúmplice do rapaz no atentando e chegou a divulgar um alerta com a imagem do indivíduo, mas, depois de identificado e de prestar depoimento, a participação do homem foi descartada. Segundo a polícia, ele era apenas um taxista que havia levado o jovem até o supermercado.

A deputada, atingida na cabeça, foi operada e seu estado continuava grave até as 22h de ontem (horário de Brasília). Segundo o último boletim médico, ela respondeu bem à cirurgia e conseguia ;responder a comandos;, mas deve ser mantida em coma nos próximos dias para se recuperar. ;Ela está em estado crítico, mas eu estou otimista quanto a uma melhora; indicou Peter Rhee, chefe da unidade de emergência do University Medical Center, de Tucson. Um comunicado divulgado pelo cirurgião Richard Carmona, amigo da família e médico da congressista, expressou tom mais cauteloso. ;Com um otimismo contido, acredito que ela sobreviva, mas ela sofreu um ferimento devastador.;

Entre os mortos no tiroteio em Tuscon, estava Christina Green, 9 anos, que foi ao ato político com uma amiga e a mãe dela, porque estava aprendendo sobre o papel dos congressistas na escola. A menina nasceu em um dia também marcado pela tragédia, 11 de setembro de 2001, quando ocorreram os ataques contra o World Trade Center, em Nova York, e o Pentágono, em Washington. Também foram assassinados o juiz John Roll , 63 anos, Gabe Zimmerman, 30, que era da equipe de Giffords e tinha acabado de ficar noiva, Dorwin Stoddard, 76, Dorothy Morris, 76, e Phyllis Scheck, 79.

Vários líderes mundiais mandaram condolências ao governo americano. O líder cubano Fidel Castro condenou o ataque ontem na imprensa local, classificando-o como um ;ato atroz;. O ex-presidente cubano destacou que Giffords é ;partidária da reforma migratória, da pesquisa com células embrionárias e das energias alternativas, medidas que a extrema direita detesta;. ;Até nós, que não compartilhamos absolutamente suas ideias políticas ou filosóficas, desejamos sinceramente que crianças, juízes, congressistas ou qualquer cidadão dos Estados Unidos morra de forma tão absurda e injustificável;, concluiu Fidel.

PERFIL
Moderada e promissora

Gabrielle Giffords, 40 anos, nascida, em Tucson, cidade do Arizona onde sofreu o atentado no sábado, é considerada uma democrata de ideias moderadas e foi a primeira judia eleita congressista pelo Arizona. A trajetória política começou com uma experiência como legisladora estadual, a partir do ano 2000. Foi a mulher mais jovem a ser eleita ao Senado do Arizona. O primeiro mandato em Washington foi obtido em 2006, depois de uma campanha que teve como tema a segurança na fronteira entre México e EUA. O assunto que lhe rendeu a vitória ainda é uma das principais bandeiras da deputada. Ela atuou no Congresso em busca do aumento do número de militares na fronteira e defende que a legalização dos imigrantes dependa do aprendizado de inglês, de pagamento de impostos e da conferência dos antecedentes criminais.

Outro assunto que lhe rendeu visibilidade foi a reforma na saúde pública feita por Barack Obama no ano passado. As mudanças foram motivo de protesto no país inteiro, mas Gabrielle apoiou o presidente e chegou a fazer campanha pela reforma. Ao mesmo tempo, a deputada é a favor do porte de armas, o que a coloca longe das posições mais liberais do partido. Fez parte das comissões de Defesa, de Assuntos Exteriores e de Ciência e Tecnologia da Câmara de Representantes.

Em 2010, depois de uma disputa acirrada, a deputada conseguiu ser eleita para o terceiro mandato no Congresso. O concorrente republicano, Jesse Kelly, é adepto do movimento neoconservador americano Tea Party, e usou como tema de campanha a crítica ao apoio de Giffords à reforma da saúde.

A deputada é casada com Mark E. Kelly, capitão da Marinha e astronauta da Nasa. O casal se conheceu na China, em 2003, casou-se em janeiro de 2007 e tem dois filhos. Gabby, como é conhecida, é ávida por equitação e apaixonada motociclista. Desde que assumiu o mandato de deputada, Giffords fez vários encontros com eleitores como o que deu oportunidade ao atentado. O intuito era manter proximidade com a população e ouvir reclamações e sugestões. Vinha tendo o nome especulado como futura candidata a um cargo executivo no estado no futuro.

Personagem da notícia
Comportamento errático

Chocado com a tragédia, o povo americano se pergunta quais razões levaram Jared Lee Loughner, 22 anos, a puxar o gatilho no tiroteio que deixou seis pessoas mortas. O rapaz, que mora com os pais em um bairro de classe média em Tucson, foi expulso da faculdade por mau comportamento, preso por consumo de drogas e vinha emitindo sinais de comportamento errático, no limite do bizarro. O jovem americano mantinha uma página no YouTube e postou um vídeo com mensagens bizarras contra o governo de Barack Obama, há três semanas.

Em seu perfil na página de vídeos, Loughner escreveu que seus entre livros favoritos estão Minha luta, de Adolf Hitler, e O manifesto comunista, de Karl Marx. Em uma mensagem postada em 15 de dezembro, intitulada de ;Os pensamentos finais de Jared Lee Loughner;, ele escreve: ;Você não precisa aceitar as leis federais. Não confie no atual governo: o governo está fazendo controle da mente e uma lavagem cerebral nas pessoas por meio do controle da gramática;.

O jovem faz uma série de referências nos textos postados no YouTube inclusive uma proposta de uma nova moeda e uma estimativa sobre o número de pessoas analfabetas no ;Distrito 8;, que é a região do país representada pela deputada Gabrielle Giffords. Em um dos vídeos, Loughner diz que é um ;recruta do Exército Americano;. Na verdade, ele tentou entrar para as Forças Armadas, mas foi rejeitado durante a seleção por causa de seu histórico escolar e de uma prisão por causa de posse de entorpecentes.

Os colegas de escola descreveram Loughner como um jovem solitário, usuário de drogas e que gostava de discutir com os professores e colegas durante a aula. O jovem também tocava saxofone na banda de jazz do colégio. ;Ele era um cara que definitivamente tinha suas opiniões e não se importava sobre o que as pessoas achavam dele. Às vezes, discutia sobre religião e drogas. Ele fumava maconha, mas não sei com que frequência;, disse um de seus colegas, Grant Wiens, à agência Associated Press.

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