Agência France-Presse
postado em 19/01/2011 17:50
Túnis - Milhares de tunisianos exigiram novamente nesta quarta-feira, em Túnis e outras províncias, a renúncia dos políticos do antigo regime do atual governo de transição e a dissolução do partido do presidente deposto Zine El Abidine Ben Ali.
Essas demonstrações de revolta ocorrem antes mesmo da primeira reunião, que talvez ocorra nesta quinta-feira, do gabinete de união nacional, formado na segunda-feira.
O presidente tunisiano interino, Foued Mebazaa, prometeu nesta quarta-feira uma "ruptura total" com o passado e saudou os "mártires da dignidade e liberdade" que ajudaram a expulsar Ben Ali.
"Garanto que esse governo de transição vai assegurar total ruptura com o passado", afirmou Mebazaa, que assumiu a presidência no sábado passado.
"Juntos, podemos escrever uma nova página na História de nosso país", completou.
Paralelamente, a Arábia Saudita, onde o antigo ditador encontrou refúgio, interditou todas suas atividades políticas relacionadas à situação em seu país, onde foi cassado no dia 14 de janeiro após 23 anos de reinado. As violências fizeram mais de 100 mortos desde meados de dezembro, segundo a ONU.
Em Túnis, unidades da tropa de choque da polícia reprimiram uma manifestação com cerca de 2 mil pessoas, incluindo islâmicos, no centro da cidade, mas não conseguiram dispersar a multidão, segundo jornalistas da AFP.
"Nós queremos um novo Parlamento, uma nova constituição e uma nova República", gritavam os manifestantes, protestando contra o partido União Constitucional Democrática (RCD) do presidente deposto Ben Ali. "Fora RCD", entoavam.
"Povo! Revolte-se contra os partidários de Ben Ali", incitavam os manifestantes.
A cólera dos militantes visa aos vestígios do antigo regime. Algumas personalidades importantes deste conservaram postos-chave dentro do governo de transição formado na segunda-feira pelo primeiro-ministro Mohammed Ghannouchi.
Manifestações similares reuniram milhares de pessoas em outras províncias, em particular em Sidi Bouzid, Regueb, Kasserine e Thala.
Essas localidades, no centro do país, estiveram diretamente envolvidas na "Revolução do Jasmim" que, em um mês de levantes populares, varreu o regime autocrático de Ben Ali.
Durante os protestos, segundo o governo, 78 pessoas morreram e 94 ficaram feridas. Mas a Alta Comissária de Direitos Humanos das Nações Unidas, Navi Pillay, divulgou nesta quarta-feira um balanço mais grave.
Desde meados de dezembro, as violências provocaram a morte de "mais de 70 pessoas em tiroteios, sete em suicídios por protesto e mais de 40 em confrontos nas prisões no final de semana passado", precisou.
Quatro ministros, incluindo três representantes da poderosa central sindical UGTT, anunciaram sua retirada da nova formação de governo.
"É impossível participar de um governo que integra símbolos do antigo regime", repetiu nesta quarta-feira o secretário-geral da central, Abdessalem Jrad.
Três partidos de oposição não reconhecidos durante o regime do presidente deposto foram legalizados durante os três últimos dias: o Tunísia Verde (ambientalista) de Abdelkader Zitouni, o Partido Socialista de esquerda de Mohamed Kilani e o Partido do Trabalho Patriota e Democrático Tunisiano de Abderrazek Hammami.
O jornalista e dissidente tunisiano aprisionado, Fahem Boukadous, condenado no dia 6 de julho a quatro anos de prisão em regime fechado, também foi libertado nesta quarta-feira, segundo sua esposa.
No plano internacional, o ministro saudita das Relações Exteriores, Saud Al-Fayçal, destacou que o presidente deposto Ben Ali fora acolhido no reino por respeito às tradições árabes de hospitalidade, mas que ele não poderia exercer nenhuma atividade contra seu país.
E a presidente da Confederação Helvética, Micheline Calmy-Rey, anunciou que "a Suíça decidiu bloquear imediatamente eventuais fundos no país do ex-presidente tunisiano Ben Ali e de sua comitiva".
A agência oficial tunisiana TAP afirmou que uma investigação judiciária havia sido aberta contra Ben Ali e sua família para identificar transações financeiras ilegais.
Mas o Banco Central da Tunísia (BCT), por sua vez, afirmou que seu estoque de ouro "não registrou nenhuma variação", desmentindo informações de que Ben Ali teria fugido com 1,5 tonelada de ouro.
Uma cúpula da Liga Árabe, no Egito, também se dedicou a discutir sobre os desdobramentos da revolta popular que sacudiu a Tunísia, que se originaria na insatisfação popular generalizada.
Em função da situação, na Argélia, no Egito e na Mauritânia, tentativas de imolação por fogo se multiplicam, seguindo o exemplo do ato suicida de um jovem tunisiano que marcou o início das revoltas em 17 de dezembro.