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Especialistas divergem sobre manifestações no Norte da Áfri

postado em 05/02/2011 11:55
MAPUTO (Moçambique) ; Especialistas africanos em relações internacionais fazem apostas sobre a abrangência que pode ter a onda democrática que corre pelo Norte do continente. Ali Jamal, doutor em conflitos africanos, acredita que as movimentações devem restringir-se aos países árabes, na África e fora dela. Segundo ele, é um ;movimento pendular;, que passou pela África Subsaariana nos fins dos anos 1990 e começo da década seguinte. ;O momento de abertura e liberdade na África não foi experimentado pelos países árabes". No período, vários países até então ligados à União Soviética abriram suas economias ao capitalismo e regimes de partido único reviram constituições e leis.

A professora brasileira Iraê Lundim, investigadora do Instituto Superior de Relações Internacionais de Moçambique, acredita que ;a areia do Saara não será impermeabilizante. Pelo contrário, é bom filtro;. Entretanto, ela não é tão enfática ao apontar em qual direção o vento democratizante irá soprar com mais força. ;Vai infiltrar para cima e corre um grande risco de seguir para baixo também. Como e quando? Eu não vou arriscar.; Iraê ressalta que, hoje em dia, as comunicações fluem mais facilmente graças à internet, ;ainda que não seja o camponês que esteja se manifestando;. Esse fenômeno permite que a ;ideia se espalhe com mais rapidez;.

Os dois analistas enfatizam que tudo depende da situação momentânea (tanto política quanto econômica) dos países, o grau de insatisfação de seus habitantes com o governo, o quadro de distribuição de renda e de incidência da corrupção, a solidez do apoio que as instituições de defesa e segurança dão aos seus respectivos líderes e o interesse internacional que cada país desperta.

;Não haverá uma situação generalizada;, acredita Ali Jamal. ;Depende fundamentalmente do contexto econômico e do grau de liberdade política que cada um vive, somado a uma série de outros fatores.;

;O roteiro de manifestações e reações até é parecido, mas as situações políticas na Tunísia e no Egito, por exemplo, são bem diferentes;, afirma Iraê, que assessorou o processo de paz que acabou com a guerra civil moçambicana, em 1994. ;Os interesses do mundo ocidental que existem no Egito, ligados a Israel, são bem particulares. Por causa desse ponto, daí eu arrisco: no Egito não haverá vazio de poder.;

As pressões populares por mudanças políticas e econômicas começaram na Tunísia, a partir de um fato marcante em 17 de dezembro do ano passado. Mohammed Bouazizi, de 26 anos, ateou fogo no próprio corpo em protesto contra a ação da polícia, que confiscou mercadorias que ele vendia na rua. Ele tinha diploma universitário e não conseguia emprego, e morreu por causa das queimaduras. Poucos dias depois, jovens tunisianos nas mesmas condições começaram a sair à rua para protestar, primeiramente no interior. Os primeiros choques entre a polícia e manifestantes ocorreram nas cidades de Kasserine, Thala e Regueb, na fronteira com a Argélia. À medida que as manifestações chegaram à capital Túnis, as cores políticas ganharam mais força e o pedido mais frequente passou a ser pela saída do presidente, Zine El Abidine Ben Ali, que estava no cargo havia 23 anos. Uma semana depois das primeiras passeatas na capital, que deixaram quase cem mortos nos choques com a polícia, Ben Ali fugiu do país, indo abrigar-se na Arábia Saudita. Desde então, integrantes do regime tentam manter-se no poder, porém, as manifestações continuam. Acusado de corrupção e evasão de divisas, Ben Ali tem hoje, contra si, uma ordem internacional de prisão.

Na vizinha Argélia, o aumento dos preços dos alimentos também levou a protestos em janeiro. O mesmo aconteceu na Jordânia. Esta semana, o rei jordaniano Abdullah II ordenou a troca do governo e a adoção de medidas que abram o país para ;mais democracia;. Na Síria, há manifestação marcada para hoje (5). Também houve protestos no Iemem.

No Egito, as manifestações contra a permanência do presidente Hozni Mubarak, há 30 anos no poder, praticamente pararam o país. Esta semana, os protestos descambaram para a violência generalizada. Apesar de anunciar que não se candidatará a mais uma reeleição em setembro, Mubarak demonstra pouca disposição em deixar o cargo. Enquanto isso, grupos pró e contra Mubarak enfrentam-se nas ruas do Cairo e em outras cidades, com paus, pedras, coquetéis molotov e tiros. Segundo a oposição, policiais à paisana participaram dos atos violentos. Mais de 200 jornalistas estrangeiros foram detidos, presos, agredidos, tiveram o material confiscado ou foram deportados ; inclusive dois repórteres da EBC, que tinham acabado de chegar na cidade do Cairo para cobrir os acontecimentos.

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