Cairo ; A cúpula do partido do governo egípcio apresentou neste sábado (5/2) sua renúncia, uma decisão considerada como um "passo positivo" pelos Estados Unidos, cujo enviado especial causou polêmica ao considerar "vital" que Hosni Mubarak permaneça no poder durante a transição democrática.
Enquanto milhares de pessoas se manifestavam pelo décimo segundo dia consecutivo no Cairo, Mubarak tentou demonstrar que permanece no poder. Como presidente do Partido Nacional Democrático (PND), decidiu "nomear Hossam Badrawi como secretário-geral do partido", após a renúncia do comitê executivo.
Em um encontro transmitido pela televisão, o presidente reuniu-se com o primeiro-ministro Ahmed Shafiq, que descartou no sábado que Mubarak deixe o cargo para o seu vice-presidente, Omar Suleimán.
Também conversou com o ministro de Petróleo, Sahme Fahmy, com o chefe do Banco Central, Faruk Oqda, e com o ministro das Finanças, Samir Radwan.
Após o anúncio da renúncia da cúpula do PND, da qual também foi afastado Gamal Mubarak, de 47 anos, filho do presidente e considerado até o início dos protestos o seu provável sucessor, os Estados Unidos saudaram esse "passo positivo".
Contradição
O enviado especial de Barack Obama, Frank Wisner, declarou mais tarde que "o prosseguimento da liderança de Mubarak era crucial", na Conferência sobre Segurança que ocorre em Munique (sul da Alemanha) através de uma vídeoconferência.
"O presidente deve permanecer no cargo para digirir estas mudanças", declarou, antes de qualificar de "vital" o papel que Mubarak deve ter na transição egípcia para a democracia.
Essas declarações pareciam contraditórias com as feitas na véspera pelo presidente americano, Barack Obama, que havia dado a entender que desejava uma saída rápida de Mubarak do poder.
De Munique, um membro da delegação da secretária de Estado, Hillary Clinton, apressou-se em declarar que Wisner não falava em nome dos Estados Unidos, mas como "um simples cidadão".
Momentos depois, a Casa Branca também se distanciou das declarações do enviado. Wisner "falava em seu nome e não no nome do governo dos Estados Unidos", disse um funcionário em Washington sob condição de anonimato.
Em uma entrevista na última semana ao canal americano ABC, Mubarak havia garantido que não queria permanecer no poder, mas que não poderia renunciar por medo do "caos" que pode ocorrer no Egito, país aliado dos Estados Unidos e que possui relações com Israel.
Segundo o The New York Times, Suleimán e militares de alto escalão estudam planos para limitar a autoridade de Mubarak e possivelmente afastá-lo do palácio presidencial do Cairo.
Atentado
Neste sábado (5/2), desconhecidos atacaram pela manhã com explosivos um gasoduto que abastece a Jordânia, situado a 10 km da Faixa de Gaza, em Sheij Zuwayed, no norte do Sinai.
Esse mesmo gasoduto também abastece Israel, mas este trecho não foi afetado. No entanto, o fornecimento de gás aos dois países foi cortado.
Na cidade de Rafah, fronteiriça com a Faixa de Gaza, uma igreja foi incendiada por causas desconhecidas.
Perante os protestos no Egito e os temores de que se eles se propaguem para outros países da região, o secretário-geral adjunto da Liga Árabe, Ahmed Ben Heli, anunciou à AFP o adiamento da III Cúpula América do Sul e Países Árabes (ASPA), que deveria ocorrer entre 13 e 16 de fevereiro em Lima. "Há discussões em andamento para fixar outra data", acrescentou.
No Cairo, milhares de pessoas voltaram a se manifestar neste sábado contra o presidente na Praça Tahrir, o epicentro dos protestos que ocorrem desde o dia 25 de janeiro e que já deixaram mais de 300 mortos, segundo a ONU, e mais de 5 mil feridos, de acordo com um balanço oficial do Ministério da Saúde.
Pela manhã, alguns dos manifestantes tentaram impedir que os tanques do exército deixassem a praça e retirassem os veículos queimados que utilizam para suas barricadas, levantadas para evitar que os partidários de Mubarak lancem outro ataque como o de quarta-feira, que deixou oito mortos.
O país segue fortemente paralisado: a bolsa do Cairo anunciou que adiava a abertura prevista para a segunda-feira, sem divulgar outra data. As negociações financeiras estão suspensas desde 27 de janeiro, após uma forte queda de 10%, depois de acumular em dois dias perdas de 12 bilhões de dólares.