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Kadafi anuncia recompensa pela captura de líder da oposição

Morador de Ras Lanuf, o médico Abdo ainda podia ver a coluna de fumaça subindo ao céu e ouvir o barulho dos caças sobrevoando a baixa altitude, enquanto falava ao Correio, por volta das 20h30 de ontem (15h30 em Brasília). Quatro horas antes, a Força Aérea da Líbia realizou uma série de ofensivas contra a cidade, situada 600km a leste de Trípoli. As explosões puderam ser ouvidas em toda a região. Dessa vez, o alvo surpreendeu a comunidade internacional e especialistas em política externa. ;Os aviões atacaram três tanques de petróleo da companhia Al-Sadra, a 2km de Ras Lanuf, além de uma estação elétrica e um depósito de combustível;, contou Abdo, sob a condição de não ter o sobrenome revelado. ;O que temíamos desde o início ocorreu hoje: o bombardeio das instalações petroleiras pela artilharia e os aviões do regime (do ditador líbio Muamar) Kadafi;, afirmou à agência France-Presse Abdelhafez Ghoqa, porta-voz do Conselho Nacional Transitório (CNT), o principal organismo da oposição, baseado na cidade de Benghazi.

Abdo acredita que os ataques aos tanques de petróleo são uma última cartada de Kadafi. ;Ele tentará destruir tudo em meu país, antes de abandonar o país;, alertou. Segundo o médico, todas as empresas petrolíferas de Ras Lanuf e das cidades de Brega e Zawiyah estão sob controle dos rebeldes. Para a argelina-americana Alia Brahimi, especialista em Norte da África pela London School of Economics and Political Science (LSE), o gesto de Kadafi pode ser compreendido como uma tentativa de sabotar o petróleo e desestabilizar o mercado internacional. No entanto, ela tem outras explicações. ;Os rebeldes estão reunidos ao redor das instalações petrolíferas, a fim de protegê-las. Trípoli também estaria interessado em evitar que os insurgentes se financiem com o petróleo;, comentou. Enquanto mirava os oleodutos, o regime anunciava uma recompensa de US$ 410 mil (cerca de R$ 698 mil) pela captura de Mustafa Abdul Jalil. O chefe do CNT e do governo interino é considerado pelas autoridades líbias um ;agente espião;.

Mais cedo, em discurso gravado pela emissora de TV estatal da Líbia, Kafadi exibiu uma postura desafiadora. Mais uma vez, acusou as potências ocidentais de conspirarem para roubar o petróleo do país e insistiu que os rebeldes são traidores apoiados pela rede terrorista Al-Qaeda. ;Os países colonialistas estão armando um plano para humilhar o povo líbio, reduzi-lo à escravidão e controlar o petróleo;, declarou o mandatário, em uma retórica carente de lógica ; ele acusou a organização de Osama bin Laden de ter drogado os jovens para forçá-los a combater e colocou a Al-Qaeda e o Ocidente como aliados contra a Líbia. ;Eles querem tomar nosso petróleo. Isso é o que os Estados Unidos, a França e esses colonialistas querem;, criticou. Na terça-feira, em entrevista à tevê turca TRT, Kadafi advertiu: ;Se a Al-Qaeda conseguir tomar a Líbia, então toda a região, até Israel, estará presa ao caos;.

Ódio
O líder líbio exigiu que a população de Benghazi tome as ruas e defenda o país. De acordo com o comerciante Oufi Omar, de 40 anos, que vive na cidade e trabalha em Ras Lanuf, essa possibilidade é nula. Ele descarta que a população promova uma caçada contra Mustafa Abdul Jalil. ;Se Kadafi desse aos revolucionários US$ 1 bilhão, eles ainda assim o odiariam;, disse Omar. ;Muitas pessoas daqui foram mortas pelas tropas de Kadafi e tudo o que queremos é que ele saia, para que tenhamos paz;, desabafou à reportagem, por telefone. O comerciante participou ontem de um protesto contra o regime, diante da Corte de Benghazi, em meio a dezenas de milhares de líbios. O médico Abdo, de Ras Lanuf, acha que o presidente da Líbia perdeu a compostura. ;Ele está nervoso, porque sabe que Abdul Jalil é um homem muito respeitado e pelo fato de o Conselho Nacional Transitório ter ganho o aval da comunidade internacional;, sustentou.

Para minimizar as baixas no campo de batalha, a oposição voltou a pedir uma zona de exclusão aérea (leia mais na página 25). Kadafi caçoou da medida. ;Se eles tomarem essa decisão, será útil para a Líbia, porque o povo verá a verdade, que o que eles querem é assumir o controle da Líbia e roubar seu petróleo;, comentou. ;Aí o povo líbio pegará em armas.; Cerca de 200 rebeldes caminhavam ontem pela estrada costeira que liga Ras Lanuf a Bin Jawad e a expectativa era de que as forças de Trípoli reconquistassem logo a cidade de Zawiyah, 50km a oeste da capital.

Confronto com facas e espadas no Egito
Egípcios armados com facas, espadas e pedaços de pau atacaram centenas de ativistas pró-democracia na Praça Tahrir, no centro do Cairo. Simpatizantes do ex-presidente Hosni Mubarak se investiram contra os ativistas, que se defenderam lançando pedras e construindo barricadas. Muitos manifestantes que participaram da rebelião contra o ex-mandatário continuam acampados em Tahrir, para manter a pressão sobre os militares.