Teerã ; O voto do Brasil no Conselho de Direitos Humanos (CDH) das Nações Unidas, no último mês, a favor do envio de um observador ao Irã, acendeu um sinal de alerta em Teerã. Para a chancelaria iraniana, críticas entre dois países amigos são permitidas, mas é preciso não abrir espaço para os ;inimigos dessa relação;, como os Estados Unidos. Em entrevista a jornalistas brasileiros, no Ministério das Relações Exteriores, na última segunda-feira, o ministro-adjunto para as Américas, Behrooz Kamalvandi, falou sobre a pressão que representantes de governos como o de Washington fazem sobre os países amigos do Irã nos ;corredores de Genebra;, mas diz que a República Islâmica continua acreditando na boa vontade do Brasil sobre a relação bilateral.
;Quando nós olhamos para a Declaração de Teerã ; o acordo sobre a questão nuclear assinado em maio passado, durante visita do então presidente Lula, mas rejeitado pelas potências ; e essa postura adotada agora (no Conselho de Direitos Humanos), é muito difícil dizer que estão no mesmo sentido;, afirmou Kamalvandi, na primeira declaração do governo de Teerã sobre o voto brasileiro. ;Como amigos, podemos criticar uns aos outros, mas não podemos dar espaço aos inimigos da nossa amizade;, completou, em referência ao apoio dado pelo Brasil, no CDH, à resolução sobre o Irã.
Embora ressalvando que não vê a postura brasileira como fruto da pressão de Washington, o responsável pelas Américas na diplomacia iraniana ressaltou o impacto que ela teve em Teerã. ;Se o Brasil apoia, voluntariamente ou não, uma política dos Estados Unidos, isso os deixa felizes e claramente não nos agrada;, declarou. Segundo o diplomata, os dois países precisam levar isso ;sempre em conta; na relação bilateral. ;Quando somos amigos, temos mais expectativas;, disse Kamalvandi. Ele lembrou, contudo, que toda relação entre países amigos tem seus ;altos e baixos;.
Dificuldades
O alto funcionário minimizou a decisão de estabelecer um relator para avaliar a situação dos direitos humanos no Irã, e observou que não é a primeira vez que o organismo em Genebra faz essa opção.
Mas também reconheceu que seu país tem ;muitas dificuldades; nessa área, assim como o Brasil. ;Não queremos dizer que temos uma situação favorável aqui no Irã em relação aos direitos humanos. Temos de corrigir muitas coisas, e o Brasil também tem. Mas o primeiro país que tem de corrigir muitas coisas são os EUA;, apontou.
Para o diplomata, o tratamento que vem sendo dado pelos governos ocidentais ao caso da iraniana Sakineh Ashtiani, condenada à morte sob a acusação de ter planejado a morte do marido, mostra como há interesse das potências em passar uma ;imagem distorcida; sobre os direitos humanos no país. ;Esse é um assunto jurídico que já tem cinco anos e ainda não está terminado. É preciso lembrar que aqui também temos leis, temos justiça;, disse o vice-ministro.
Durante visita da presidente Dilma Rousseff à China, na última semana, o assessor da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, disse que o país não vai se transformar em um ;alto-falante permanente; sobre direitos humanos, tratando o tema com obsessão. Depois do voto sobre o Irã em Genebra, a definição da postura do Brasil sobre violações em países como China e Cuba é considerada um dos grandes desafios diplomáticos no início do governo Dilma.
* A repórter viajou a convite da Organização de Herança Cultural, Artesanato e Turismo do Irã (órgão do governo)
Mediação sem resultados
O acordo assinado em Teerã em maio passado foi uma das apostas mais arriscadas do governo Lula no âmbito global. O então presidente brasileiro, em dupla com a Turquia, convenceu Mahmud Ahmadinejad a aceitar que o combustível para seus reatores fosse enriquecido no exterior. A concessão foi ignorada pelos EUA e demais potências, que impuseram nova rodada de sanções ao Irã.