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Autor de livro sobre Al-Qaeda e advogado falam sobre a rede terrorista

O autor de livro sobre os bastidores da Al-Qaeda e o advogado de familiares das vítimas dos atentados de 11 de setembro divergem sobre o futuro da rede terrorista após a morte de Osama bin Laden, mas concordam quando o assunto é o papel influente que ele exerceu

postado em 03/05/2011 10:28


O cingalês Rohan Kumar Gunaratna entrevistou, durante cinco anos, centenas de extremistas seguidores de Osama bin Laden para escrever a obra Inside Al-Qaeda: global network of terror (Por dentro da Al-Qaeda: rede global de terror). Após os atentados de 11 de setembro de 2001, o francês Jean-Charles Brisard mergulhou num árduo trabalho como advogado de sobreviventes e de familiares das vítimas. Também redigiu Forbidden truth: US-Taliban secret oil diplomacy and the failed hunt for Bin Laden (Verdade proibida: a diplomacia secreta do petróleo EUA-Talibã e a caça fracassada por Bin Laden). Em entrevista ao Correio, os dois especialistas analisaram o impacto da morte do fundador da Al-Qaeda sobre a guerra ao extremismo e concordaram que Bin Laden desempenhava um papel simbólico na organização. ;Ele inspirou o terrorismo na última década;, disse Gunaratna, chefe do Centro Internacional para Pesquisa sobre Terrorismo e Violência Política da Universidade Tecnológica de Nanyang, em Cingapura. Para Brisard, a morte do dissidente saudita representa o fim do núcleo central da rede Al-Qaeda, apesar de o médico egípcio Ayman Al-Zawahiri (leia perfil nesta página) ser o sucessor natural de Bin Laden.

O que a morte de Osama bin Laden representa para a estrutura hierárquica e como afetará a capacidade de ataques da rede Al-Qaeda?

Rohan Gunaratna: Bin Laden era o líder terrorista mais simbólico do mundo. Ele inspirou o terrorismo na última década. Ele não tinha influência apenas sobre a Al-Qaeda, mas também foi capaz de criar e ajudar a fundar cerca de 30 ou 40 grupos terroristas que realizam ataques usando homens-bomba para causar o máximo possível de destruição e de mortes. A morte de Bin Laden é realmente significativa, porque demonstra que todo líder terrorista pode até fugir, mas eventualmente será pego.
Jean-Charles Brisard: Desde um ano atrás, Bin Laden não era mais o comandante-chefe da Al-Qaeda. Na melhor das hipóteses, era uma figura simbólica e emblemática, além de uma referência ideológica para muitos militantes. Outros grupos afiliados têm crescido em âmbito operacional. Seu papel era limitado. Com sua morte, a Al-Qaeda central desaparece como organização terrorista, capaz de unir as facções extremistas. Mas isso não significa o fim do terrorismo da Al-Qaeda. Já há alguns anos, o perímetro da ameaça tem sido modificado e os grupos regionais tomaram a liderança. A morte de Bin Laden é uma vitória simbólica, principalmente para todas as vítimas do 11 de setembro. Osama bin Laden não será levado a julgamento, mas sua eliminação é uma vitória importante para aqueles que sofreram por suas decisões.

Qual era o papel de Bin Laden dentro da Al-Qaeda? Ele ainda era muito ativo no planejamento de atentados terroristas?
Rohan Gunaratna: Bin Laden não foi apenas um líder simbólico, mas também operacional. Certamente, antes de 11 de setembro de 2001, ele trabalhava como um instrumento para planejar os atentados às Torres Gêmeas e ao Pentágono. Depois disso, Bin Laden desempenhou um papel limitado nas operações da rede. Seu papel era mais simbólico. Certamente, ele é um líder mais espiritual do que operacional.
Jean-Charles Brisard: Osama bin Laden não planejava mais ataques terroristas há alguns anos. Muitos dos meios operacionais e de comando foram transferidos para outras organizações afiliadas.



Existe o risco de a morte do extremista aumentar o ódio contra os Estados Unidos no mundo árabe e insuflar o antiamericanismo?
Rohan Gunaratna: Certamente, o antiamericanismo afeta uma porção muito pequena dos muçulmanos, que apoiam a Al-Qaeda. Mas muitos seguidores do islã comemoraram a notícia da morte.
Jean-Charles Brisard: Certamente, a morte de Osama bin Laden vai aumentar a ameaça terrorista no mundo, já que podemos antecipar reações violentas. Será um bom teste para a popularidade de Bin Laden e para vermos qual era sua influência real perante uma parte do mundo árabe.

O corpo de Osama bin Laden foi capturado pelas forças especiais norte-americanas, em uma casa dentro do Paquistão. Como analisa esses fatos?
Jean-Charles Brisard: essa circunstância é importante para evitar que ele seja transformado em um mártir, como a Al-Qaeda costuma fazer. A complacência das autoridades paquistanesas (com o terror) é óbvia. A maior parte dos líderes da Al-Qaeda tem sido morta ou presa em áreas urbanas paquistanesas, e não em cavernas do Afeganistão ou em áreas remotas da fronteira com o Afeganistão. Isso claramente questiona o papel do Paquistão em dar abrigo a essas redes.

Mas a relação entre Paquistão e EUA sofrerá algum dano pelo fato de Bin Laden ter se refugiado em território paquistanês?
Jean-Charles Brisard: A morte de Bin Laden deve levar a uma reavaliação da cooperação antiterrorismo, rumo a uma completa implementação das sanções contra os extremistas, por parte do governo paquistanês. Não podemos tolerar a existência de um santuário terrorista, especialmente após o fim de Osama bin Laden.

Ayman Al-Zawahiri se constitui em uma liderança importante da Al-Qaeda?
Rohan Gunaratna: Zawahiri é o vice-líder da rede Al-Qaeda. Ele já dirigiu a Al-Qaeda durante algumas ocasiões. Ele será bem-sucedido ao dirigir a organização, mas não representará uma figura tão influente quanto Bin Laden.

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