postado em 13/05/2011 08:33
A livre circulação através das fronteiras europeias está em jogo. Nos últimos meses, o continente recebeu milhares de imigrantes do norte da África, numa escala que preocupou países como Itália, França e Espanha. O problema fez com que a União Europeia (UE) começasse a discutir uma possível revisão do Tratado de Schengen, que estabelece as regras de entrada e saída de seus países. O primeiro passo foi dado pela Dinamarca, que na quarta-feira anunciou a decisão de restabelecer postos de controle em suas fronteiras. Reunidos ontem em Bruxelas, os ministros do Interior dos 27 países do bloco concordaram em tratar o assunto com cautela, mas não descartaram a possibilidade de mudanças. A decisão pode afetar a entrada de estrangeiros na Europa, especialmente dos turistas.A crise com a chegada de imigrantes norte-africanos e a atitude da Dinamarca fizeram com que a UE se reunisse para examinar a possível revisão do Tratado de Schengen. O presidente da França, Nicolas Sarkozy, e o premiê da Itália, Silvio Berlusconi, propuseram que os países-membros possam restabelecer os controles fronteiriços em determinadas situações, e não apenas em casos de emergência, como define o acordo. A ideia foi aceita, em princípio, porém com a discordância da Espanha e da Bélgica. ;Já existe um marco legal que define circunstâncias excepcionais para estabelecer controles;, afirmou Antonio Camacho, secretário de Segurança espanhol.
O Tratado de Schengen foi aprovado em 1985, para facilitar a circulação de pessoas no continente, e está em vigor desde 1995. Cidadãos europeus, estrangeiros residentes no bloco e visitantes admitidos em qualquer dos países do bloco não precisam apresentar passaporte para cruzar as fronteiras entre os 25 países nos quais a norma é vigente. Com visto de residência nas mãos, os imigrantes africanos que chegam à Europa, pela Itália, conseguem circular pelo bloco. Segundo a comissária europeia de Imigração, Cecilia Malmstr;m, as milhares de pessoas que fugiram dos conflitos no mundo árabe ainda não representam um problema, mas uma mudança no acordo não deve ser rejeitada. ;É necessário melhorar as deficiências. Precisamos elaborar diretrizes para interpretar quando é preciso aplicar o controle, quando ele pode ser suspenso e o que é preciso fazer.;
Para Pio Penna, professor de relações internacionais da Universidade de Brasília (UnB), alguns países querem endurecer os controles fronteiriços e acabam atingindo o resto do bloco. ;Uma revisão no tratado é um passo para atrás em uma política migratória que já é bem dura. Existem também questões internas: o governo francês tenta conquistar o eleitorado de direita, que é mais conservador e contra a imigração.;
Brasileiros
A crise econômica acirra as discussões sobre imigração na Europa. ;É um assunto delicado, e mesmo com o Tratado de Schengen ninguém nunca abriu mão do controle das fronteiras para os estrangeiros. Isso vem afetando especialmente os países da América Latina;, afirma José Blanes Sala, professor de relações internacionais da Universidade Estadual Paulista (Unesp). ;A mudança não é por conta do fluxo de imigrantes africanos, mas porque eles querem medidas rigorosas.; Pio Penna também vê possíveis problemas para a entrada dos brasileiros na Europa: ;A revisão pode ser para conter a imigração africana, mas acaba tendo valor geral, inclusive com pessoas do Brasil, que já tiveram problemas de entradas em países como a Espanha;.
Durante a reunião, também foi feita a proposta de que não sejam estabelecidas medidas unilaterais em relação à imigração, como aconteceu na Itália, no mês passado, quando milhares de tunisianos desembarcaram na ilha de Lampedusa. A Dinamarca declarou que sua decisão de restabelecer o controle nas fronteiras foi mal interpretada. ;Vamos fiscalizar a entrada de mercadorias, como outros países já fazem, e não a de pessoas;, declarou o ministro dinamarquês de Integração, Soren Pind.
Contra o ;turismo médico;
Um polêmico projeto de lei que restringe o visto de residência e estada para imigrantes portadores de doenças graves, como câncer e Aids, foi aprovado ontem no parlamento francês. De acordo com a Lei Debré, de 1997, estrangeiros doentes podiam receber uma autorização temporária para tratamento médico na França. Agora, só devem ser concedidas as permissões para quem não possa receber cuidados no país de origem pela falta de tratamento adequado. Aqueles que receberam uma permissão desse tipo por menos de três meses podem ser expulsos do país. O governo francês teme o ;turismo médico;, e afirma que casos como esses representam um gasto elevado para os cofres públicos. Cerca de 30 mil pessoas contam com o benefício. Organizações não governamentais protestaram contra a decisão.