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Em momento de antagonismo, eleitores turcos devem apoiar governo

Renata Tranches
postado em 12/06/2011 08:00
No calor dos acontecimentos da primavera árabe ; na última semana, mais de 4,3 mil sírios atravessaram a fronteira em busca de segurança na Turquia ;, os turcos votam hoje nas eleições legislativas do país que, segundo pesquisas de intenção de voto, devem dar grande maioria ao governista Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP). A provável vitória endossará as políticas do primeiro-ministro Retzep Tayyip Erdogan, e deverá dar a ele seu terceiro mandato consecutivo.

Antagonismo seria uma boa palavra para descrever o momento vivido pela Turquia. O país que tem parte de seu território na Europa e parte na Ásia vê seus planos de integração ao rico bloco europeu se esbarrarem, volta e meia, nas exigências por mais respeito aos direitos humanos e à democracia. Valores democráticos, aliás, compõem o discurso de um governo que se autoproclama líder regional no Oriente Médio. Pega de surpresa com a revolta popular nos países à sua volta, a Turquia se viu em uma encruzilhada, tendo de escolher entre ficar do lado da população ávida por mudanças ou dos regimes autoritários, com os quais as boas relações mantidas ao longo dos anos lhe garantiram o papel de importante ponte entre Ocidente e Oriente.

Para muitos países, o estouro das revoltas populares no Oriente Médio e na África do Norte foi, sem dúvida, algo inesperado. Mas, além de se surpreender, segundo analistas ouvidos pelo Correio, a Turquia demorou a entender e a dar uma resposta ao que ocorria à sua volta, colocando em dúvida o lema do chanceler turco Ahmet Davutoglu, segundo o qual nenhum problema na região poderia ser resolvido sem a ajuda de seu país. A razão para isso, na opinião do Gareth Jenkins, analista baseado em Istambul do Central Asia-Caucasus Institute, é que Davutoglu tem construído suas políticas para a região se aproximando e se relacionando com os regimes do Oriente Médio, em sua maioria, autoritários. ;Seu apoio a esses regimes tem sido uma grande decepção aos ativistas pró-democracia na região;, afirma.

Jenkins se refere ao fato de a Turquia se manter relutante em condenar a repressão aos manifestantes na Síria, no Iêmen, no Barein e na Líbia, países com os quais mantém excelentes relações comerciais e forte influência política. No caso da Síria, especificamente, Erdogan vinha tentando, sem sucesso, convencer o presidente Bashar al Assad a encontrar uma saída por vias diplomáticas. Mas na semana passada, o premiê turco recrudesceu sua postura e chamou de ;atrocidade; a força empregada pelo governo contra seu povo.

Acordos
O professor Cengiz Aktar, diretor do Departamento de Relações com a União Europeia da Universidade Bahcesehir, em Istambul, cita a Líbia como outro exemplo desse comportamento relutante. Integrante da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), a Turquia não queria a criação de uma zona de exclusão aérea sobre o território líbio, onde centenas de empresas turcas mantiveram gigantescos acordos comerciais nos últimos anos. ;O governo (turco) teve dificuldades para compreender o significado dessa convulsão popular e a produzir uma resposta apropriada;, analisa.

O apoio aos governos locais no Oriente Médio cresceu na mesma proporção em que diminuíram os esforços de integração à União Europeia. As negociações entre o bloco e o país muçulmano estão praticamente estagnadas desde 2006. A partir de então, o bússola turca guia o país para o Oriente. David Cuthell, diretor do Instituto de Estudos Turcos (Washington, EUA), explica que por conta do desejo de integração muitas reformas e melhorias na Turquia foram empregadas por Erdogan, no poder desde 2003, especialmente no aspecto econômico. ;Mas do ponto de vista social e religioso, ainda há muitas questões;, afirma. O professor vê resistência, principalmente, por parte da França e da Alemanha. ;Há uma grande islamofobia agora na Europa.;

Birol Yesilada, diretor do Centro de Estudos Turcos da Universidade de Portland (EUA), vê a integração como de baixa prioridade para o governo turco atualmente. Na sua opinião, há um desinteresse das duas partes. ;Ambos são culpados aqui, não apenas a Turquia;, garante. Nesse momento, segundo o analista, é como se cada um estivesse ;focando apenas o que há de pior no outro;.

;Caminho perigoso;
Os refugiados sírios estão vivendo em três acampamentos em Yayladagi, no sul da Turquia, mas o Crescente Vermelho já começou a montar outros dois em Altinozu e Boynuyogun. A maioria fugiu da cidade de Jisr al Shughur, a 40km da fronteira turca, onde as forças de segurança sírias lançaram uma grande operação. O Exército sírio se encontra nas entradas da cidade e os habitantes temem uma invasão. Nos últimos dias, a repressão foi particularmente violenta na província de Idleb, onde está localizada Jisr al Shughur. O governo diz coordenar a operação militar a pedido da própria população. Na sexta-feira, a Casa Branca endureceu seu posicionamento com relação à Síria e pediu o ;fim imediato à brutalidade e à violência; no país. Segundo os EUA, o presidente Bashar al Assad está levando a Síria ;a um caminho perigoso;.

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