Agência France-Presse
postado em 19/08/2011 13:28
Chicago - O aumento de medidas de segurança depois dos atentados do dia 11 de setembro, junto à aceitação tácita da tortura e uma reação da comunidade mulçumana, transformaram os Estados Unidos em uma sociedade menos livre do que há 10 anos, dizem especialistas. A corrosão dos valores fundamentais americanos e as elevadas despesas na defesa interna, às quais se acrescentam duas guerras, permitiram aparentemente que a Al-Qaeda alcançasse alguns de seus objetivos. A maior parte dos americanos parece não se incomodar com a perda de liberdades.Nas pesquisas, a maioria deles está disposta a desistir de algumas liberdades civis em favor de um país mais seguro. Apenas um quarto acredita que a tortura aplicada aos suspeitos de terrorismo é injustificável. "Muitas pessoas responderam de maneira afirmativa (às ações contra o terrorismo) porque pensam que medidas como escutas telefônicas acontecem apenas aos outros", declarou à AFP, Andrea Prasow, assessora da organização Human Rights Watch. "A história prova que não é verdade. Uma vez que o governo recebe um poder, ele não o entrega nunca", considera Prasow.
"Essas mudanças não afetam apenas as liberdades individuais das pessoas que se tornam suspeitas injustamente, mas também afetam o estado de direito" em razão da "utilização excessiva do segredo", denuncia Michael German, assessor da poderosa organização de defesa das liberdades civis ACLU.
O Congresso estuda um projeto de lei que permitiria a prisão por tempo ilimitado de pessoas sem julgamento, uma questão que surgiu antes do 11 de setembro e tão inimaginável quanto um presidente americano aceitar a simulação de afogamento ou outras formas de "interrogatórios duros". "Os Estados Unidos não estavam neste ponto até os atentados. O país era um líder imperfeito, mas um líder para promover os Direitos Humanos", acrescentou Prasow. "Os terroristas procuram mudar um país ou um povo, e é isso o que acontece".
A resposta dada não é proporcional à ameaça, acrescenta Bem Wizner da ACLU. Poucas tentativas de atentados foram bem sucedidas após 11 de setembro: o mais fatal, o de Fort Hood no Texas em 2009, matou 14 pessoas e feriu 24, um número muito inferior aos 30.000 que morrem nas estradas todos os anos. "Diz respeito a uma ameaça real, mas que não coloca em perigo a nossa existência", afirma Wizner, "mesmo assim, nós tratamos como se fosse a Primeira Guerra Mundial".
A guerra contra o terrorismo resultou em um reforço sem precedentes no monitoramento de e-mails, telefonemas, transações financeiras de cidadãos americanos e estrangeiros para armazená-los em bases de dados enormes. É ao mesmo tempo necessário e inevitável, afirma Ron Marks, ex-membro da CIA, hoje especialista do Instituto de Segurança Interna da Universidade George Washington. "Não existe uma volta possível ao período anterior ao 11 de setembro. O gênio saiu da garrafa", afirma e adverte: "Nós seremos ainda mais indiscretos".
"Os atentados traumatizaram os americanos, o problema é que o governo (...) utiliza contra os americanos, ferramentas desenvolvidas durante anos contra os inimigos do país", visando principalmente os mulçumanos e imigrantes, segundo ele.
Ron Marks se disse "preocupado com a opinião pública", ressaltando a "perda de flexibilidade" em relação a opiniões divergentes e uma desconfiança profunda com os mulçumanos.
Muitos republicanos exploram esta desconfiança como uma "estratégia de campanha", acredita Dawud Walid, diretor do Conselho de relações americano-islâmico (CAIR) do Michigan. "O discurso político se tornou abertamente islamofóbico e é aceito por uma grande parte da população", disse, "dá medo".