Agência France-Presse
postado em 23/08/2011 10:49
Dubai- A queda anunciada de Muamar Kadafi na Líbia dará um novo impulso a outras rebeliões árabes incipientes, mas o caráter armado desta revolução e o papel militar dos ocidentais geram preocupação.No poder há 42 anos, mediante um golpe de Estado, o líder líbio está perto de se converter no terceiro chefe de Estado árabe a ser deposto pela chamada "primavera árabe". No entanto, enquanto seus homólogos, o tunisiano Ben Ali e o egípcio Hosni Mubarak, foram derrubados por um movimento popular pacífico em poucas semanas, os rebeldes armados líbios apoiados pela Otan combateram por seis meses.
"Ver um novo líder cair incentivará novos movimentos opositores no mundo árabe e demonstrará que existe um efeito dominó", afirmou Jane Kinninmont, especialista do mundo árabe do instituto britânico Chatham House.
"Talvez no fim de 2011 terão caído cinco dirigentes árabes", acrescenta, sugerindo que o presidente sírio Bashar al-Assad e seu homólogo iemenita Ali Abdullah Saleh poderiam ter o mesmo destino que Kadafi.
A analista opinou que o caso da Líbia é mais comparável com a Argélia, sobretudo devido a sua proximidade geográfica.
"O Marrocos anunciou reformas bastante globais, enquanto o regime argelino até o momento conseguiu reprimir com sucesso os protestos, mas não parece capaz de realizar uma reforma política", explica.
Salam Kawakibi, outro pesquisador sobre o mundo islâmico, também considera que a tomada de Trípoli pelos rebeldes "dará novas esperanças à revolução árabe, após as frustrações de meses anteriores".
A repressão dos protestos na Síria deixou mais de 2.200 mortos desde março e o regime não deu nenhum sinal de que iria ceder. O presidente iemenita hospitalizado na Arábia Saudita após um atentado anuncia regularmente seu retorno ao poder em breve.
Kawakibi lamenta, no entanto, "que a vitória dos rebeldes líbios tenha ocorrido graças a uma intervenção estrangeira", destacando que os demais movimentos de protesto, na Síria ou no Iêmen, conseguiram preservar o caráter pacífico de seus protestos e não solicitaram nenhuma intervenção externa.
Ibrahim Sharqieh, diretor adjunto do Brookings Doha Center, estimou, por sua vez, que "esta primeira revolução árabe que triunfou por meio das armas e com a ajuda das potências estrangeiras não será um modelo" para as demais.
"Estou certo de que a rebelião pacífica continuará no mundo árabe" - disse - destacando que um dos principais desafios enfrentados pelos rebeldes líbios "é superar suas divergências, especialmente as ideológicas".
Um ponto de vista compartilhado por Kawakibi, que teme que os "extremistas islâmicos" tentem monopolizar a rebelião e sobretudo a ingerência de potências estrangeiras na Líbia pós-Kadafi.
"Os países que intervieram militarmente na Líbia invocando razões humanitárias tinham como perspectiva os mercados que se abrirão e a reconstrução" deste rico país petroleiro, disse o analista baseado em Paris.
A Líbia possui as principais reservas petrolíferas da África, com 44 bilhões de barris, e suas jazidas são particularmente cobiçadas devido à baixa quantidade de enxofre e sua proximidade geográfica com a Europa.
Os rebeldes que querem relançar a indústria petroleira, parada pelo conflito, não esquecerão seus aliados ocidentais (França, Grã-Bretanha e Itália) e árabes (Qatar) na hora de reconstruir o país e distribuir novos contratos de exploração, segundo os especialistas.
"Temo que após a libertação da Líbia, além do inevitável preço econômico, também será preciso pagar um preço político e o país se tornará um aliado político muito próximo ao Ocidente", disse o analista, bisneto do grande reformista árabe Abdel Rahman Kawakibi.