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Republicanos investem contra estrangeiros e entram em choque com Obama

Renata Tranches
postado em 09/10/2011 08:00
Acuados pela crise econômica, de um lado, e por um crescente discurso xenófobo, do outro, os imigrantes nos Estados Unidos se veem no centro de um debate político tensionado pelo recrudescimento de medidas anti-imigratórias. A entrada em vigor da legislação estadual mais rígida da última safra, a do Alabama, espalhou medo entre os estrangeiros e ameaça provocar uma crise humanitária. Enquanto não sai do papel a promessa de campanha do presidente Barack Obama de uma grande reforma nas leis federais sobre o assunto, o governo tenta barrar na Justiça o avanço de regras mais duras nos estados, sob o argumento de que esses estatutos contrariam a Constituição.

O revés no Alabama, porém, mostrou que a administração federal democrata terá de se esforçar mais se quiser conter essas iniciativas e barrar a ânsia da oposição republicana de transformar o tema em vantagem na disputa presidencial de 2012. Na sexta-feira, a Casa Branca pediu à Corte de Apelações que bloqueie a lei. Segundo o texto apresentado pelo Departamento de Justiça, a norma ;eleva a probabilidade de expor as pessoas que residem nos EUA legalmente, incluindo os estudantes;.

Advogados do departamento tentaram até o último minuto conseguir que os pontos mais polêmicos da lei fossem desconsiderados. Mas a juíza federal Sharon Lovelace Blackburn foi implacável. Entre as questões mais controversas aprovadas por ela estão a permissão a policiais para atuarem como agentes migratórios no estado e o aval às escolas para questionarem a situação migratória dos alunos (veja quadro). Na primeira semana em vigor, mais de 2 mil estudantes de famílias hispânicas deixaram de ir às aulas no Alabama pelo temor de que os pais, sem documentos, fossem denunciados. Outras mudaram de vez do estado.

Apoiadores da legislação que persegue os ilegais se manifestam no Arizona: ameaça de deportação sumária provoca apreensão entre os estrangeiros

Medo
A situação é local, segundo a advogada Jacqueline Bhabha, diretora do Comitê de Estudos dos Direitos Humanos da Harvard Keenedy School of Government (EUA). Mesmo assim, desencadeou um medo muito mais abrangente. Em entrevista ao Correio, ela explica que o impacto nacional já é percebido. ;As pessoas começam a temer que isso possa se repetir nos outros estados;, afirmou. Para Jacqueline, o sentimento entre os imigrantes sem documentos é de total vulnerabilidade. ;Muitos temem pelo que acontecerá até as eleições.;

Inspirada na legislação do Arizona, a nova lei do Alabama foi promulgada pelo governador Robert Bentley no último dia 29. Ambos os estados são comandados por republicanos. Ao contrário do primeiro, no qual as questões mais controversas não foram aprovadas, o segundo foi adiante com medidas que, na opinião de ativistas dos direitos do imigrante, devem desencadear uma ;crise humanitária;.

Um comunicado divulgado pela organização não governamental (ONG) Southern Poverty Law Center aponta que, desde que a lei passou a valer no estado, uma linha telefônica especialmente criada recebeu mais de 2 mil ligações de imigrantes apavorados com a possibilidade de serem deportados. ;Eram maridos que não puderam levar suas mulheres para dar à luz em hospitais, pessoas doentes que se recusaram a procurar a emergência, milhares de crianças aterrorizadas que não foram às escolas;, alerta o documento. ;Uma crise está se desdobrando no Alabama e as crianças, principalmente, estão no centro do fogo cruzado.;

Jacqueline Bhabha reforça que a situação dos menores é muito delicada. ;São crianças que nascem aqui, mas se sentem como se não pertencessem ao próprio país;, disse, referindo-se à medida legal que permite aos filhos de estrangeiros sem documentos nascidos nos EUA regularizarem a situação dos pais, passando a eles a cidadania ao completarem 21 anos. ;As famílias vivem amedrontadas pela possibilidade de serem separadas;, afirma a advogada, autora de vários livros sobre o tema, entre eles, Children without a state: a global human rights challenge (Crianças sem pátria: um desafio global aos direitos humanos, em tradução livre).

Discurso radical
Tanto no Alabama como no Arizona, as iniciativas têm componente político. Na opinião da especialista, foram levadas adiante graças a um sentimento xenófobo crescente, que culpa a mão de obra barata dos imigrantes pela perda de empregos. Mas o discurso radical se repete em outros estados e ganha força com os políticos republicanos mais conservadores, especialmente os ligados ao movimento Tea Party.

Obama responsabiliza os opositores por não aceitarem discutir uma reforma integral das leis migratórias. O presidente critica a rejeição total a qualquer projeto que regularize a chegada de estrangeiros ou trate da situação dos cerca de 11 milhões de imigrantes ilegais, dos quais 9 milhões têm origem hispânica.

Pontos polêmicos
A Lei HB56, do Alabama, é inspirada no Projeto SB1070 do Arizona e entrou em vigor em 29 de setembro

Escolas
Exige que as escolas públicas comprovem o status legal dos alunos. Caso detectem alguma irregularidade, devem notificar o Immigration and Customs Enforcement (ICE), ou Corte de Imigração.

Serviços
Penaliza quem oferecer transporte, albergue ou qualquer outro tipo de ajuda a imigrantes sem documentos.

Empresas
Exige que as empresas participem do programa federal E-Verify para verificar o status migratório de seus funcionários;

Polícia
Permite que a polícia, ao deter uma pessoa por uma infração leve, exiga um comprovante de residência legal se suspeitar que o indivíduo esteja no país em situação ilegal.

Detenção
Autoridades podem interrogar suspeitos de permanência no país sem permissão e mantê-los detidos sem direito a fiança.

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