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OTAN anuncia encerramento de operações militares na Libia no fim de outubro

postado em 22/10/2011 08:00
Pela primeira vez em mais de quatro décadas, o engenheiro de computação Hisham Bumedian acordou ontem sem se preocupar com Muamar Kadafi. O corpo do ditador ; que assumiu o poder seis anos antes de Hisham nascer ; estava dentro de uma câmara frigorífica de um mercado de vegetais em Misrata, a 189km da capital. Morto, Kadafi tornou-se centro de uma polêmica. As tradições islâmicas exigem que o funeral ocorra o mais rápido possível. No entanto, o Conselho Nacional de Transição (CNT) viu-se obrigado a adiar o sepultamento. A pedido de Safiyah Farkas, viúva do coronel, e motivada pelos vídeos amadores sobre os instantes finais de Kadafi, a Organização das Nações Unidas (ONU) pediu uma investigação sobre as circunstâncias da captura e da morte do ex-líder líbio.

;Há muita incerteza sobre o que aconteceu exatamente. Parece haver quatro ou cinco versões diferentes de como ele morreu;, declarou à agência Reuters Rupert Colville, porta-voz do Alto Comissariado para Direitos Humanos da ONU. ;Se você pegar esses dois vídeos juntos, eles são perturbadores, porque você vê alguém que foi pego vivo e, depois, vê a mesma pessoa morta.; Mohamed Sayeh, autoridade do CNT, alegou que o novo governo aguardava a chegada de ;um terceiro ator, vindo de fora da Líbia, para examinar o caso;. Em meio ao celeuma, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) marcou para 31 de outubro o fim das operações militares na Líbia. A morte de Kadafi ecoou na Síria e no Iêmen, onde os presidentes Bashar Al-Assad e Ali Abdullah Saleh intensificaram a repressão.

Hisham assistiu às imagens feitas pelos rebeldes do CNT e admite que algo inexplicável ocorreu em Sirte, na manhã de quinta-feira. ;Os vídeos mostram Kadafi com um tiro na cabeça e outro no estômago. Em outra gravação, alguns rebeldes gritam: ;Não atirem! Nós o queremos vivo;. Outros afirmam: ;Matem-no, ele é um assassino!’. Na minha opinião, os próprios guerrilheiros não acreditavam no que estava ocorrendo;, contou ao Correio. Ele acredita na possibilidade de um dos guerrilheiros ter efetuado os disparos, no calor do momento. E admite que preferia Kadafi vivo. ;Os crimes que ele cometeu nos últimos oito meses seriam suficientes para condená-lo a mil anos de prisão ou à forca mil vezes;, desabafou.

Mistério
Uma frase dita pelo próprio ditador aos seus algozes lança mais mistério. ;Tenha clemência, não conhece a clemência?;, afirma Kadafi. Em outro vídeo, Mutassim, filho do coronel, aparece em poder dos insurgentes. Com a aparência tranquila, ele fuma e bebê água. Fotografias de seu cadáver circulam desde quinta-feira pelas agências internacionais de notícias e pelas redes sociais da internet.

O governo norte-americano cobrou ontem um relato transparente das causas da morte do ex-líder líbio. ;O CNT deve fornecer mais detalhes nos próximos dias;, declarou Mark Toner, porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, ao reconhecer que a Líbia vive um ;momento de catarse;. Em Misrata, o engenheiro Ahmed Al-Afitori não descarta que um dos simpatizantes de Kadafi tenha deflagrado um tiro de misericórdia. ;Ele mesmo disse que desejava morrer, caso fosse pego;, lembra, em entrevista por telefone ao Correio. Ahmed não vê sinais de maus-tratos no corpo do ex-ditador. ;São só dois tiros. Os rebeldes foram muito gentis com Kadafi;, comenta.

Sem o ditador pelo caminho, os líbios esperam que o CNT decrete amanhã a libertação do país. Após uma reunião com os embaixadores dos 28 países-membros da Otan, o secretário-geral Anders Fogh Rasmussen explicou que a missão da aliança atlântica será finalizada em coordenação com a ONU e a nova autoridade de Trípoli. O ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, se disse a favor de que as Nações Unidas criem um cronograma de democratização da Líbia. ;É muito importante (;) a ONU assumir plenamente a responsabilidade, tanto no estabelecimento de um cronograma que seja acompanhado pela comunidade internacional, de democratização do país, com eleições, com o estabelecimento de uma Constituição e com a estabilização política, quanto em relação à reconstrução;, defende. Por enquanto, tudo o que os líbios desejam é comemorar. ;Kadafi não existir é algo bom demais para ser verdade;, celebra Hisham, que não teme focos de resistência dos simpatizantes do antigo regime. ;Eles já não têm mais poder.;

Primavera Árabe registra mais 26 mortes
As forças de segurança da Síria mataram ontem ao menos 19 civis que usaram a morte de Kadafi como estímulo para exigir a queda do presidente Bashar Al-Assad. Os Comitês Locais de Coordenação (LCC) celebraram o fim do coronel como ;uma grande vitória da terceira revolução árabe, que envia sinais determinantes aos tiranos da região;. Milhares de sírios saíram às ruas e foram duramente reprimidos. Quinze civis morreram em Homs, um dos principais focos de revolta; dois em Hama (centro); um em Deraa (sudoeste); e outro no noroeste. Em Sanaa, capital do Iêmen, sete pessoas foram executadas e dezenas ficaram feridas por milicianos leais ao presidente Ali Abdullah Saleh

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