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Entrevista: Philip Luther denuncia crimes cometidos pelas tropas egípcias

postado em 26/11/2011 08:00
Mulheres obrigadas a se submeter a testes de virgindade, homens torturados com choques elétricos, manifestantes assassinados a sangue frio. Para o ativista britânico Philip Luther, diretor do Programa sobre Oriente Médio e Norte da África da organização não governamental Anistia Internacional, as violações dos direitos humanos cometidas pelo Conselho Supremo das Forças Armadas (SCAF) ; a junta militar que governa o Egito há nove meses ; ocorrem em meio à impunidade absoluta. ;As forças de segurança permanecem acima da lei;, explicou ao Correio, por e-mail. Ele acusa o organismo de julgar 12 mil civis em tribunais militares, sem direito a defesa. Segundo ele, o SCAF tem expandido o estado de emergência que vigorava durante o regime de Hosni Mubarak e cometido violações até mais graves que o ex-ditador.

Militares atuam à sombra da impunidade

Quais são as mais brutais violações dos direitos humanos cometidas pela junta militar no Egito?
As forças militares têm cometido graves violações dos direitos humanos nos últimos nove meses, tais como tortura e outros tratamentos doentios, bem como o assassinato ilegal de manifestantes. Esses crimes foram praticados em total impunidade, enquanto que as forças de segurança permaneceram acima da lei. Para lhe dar poucos exemplos, a polícia capturou manifestantes pacíficos, no fim de fevereiro, que alegaram terem sido submetidos a açoite e recebido choques elétricos, enquanto estavam nus. Em março, ativistas egípcias presas na Praça Tahrir denunciaram que foram forçadas a se submeter a testes de virgindade. Durante o último fim de semana, manifestantes foram espancados. Assassinatos ilegais têm sido praticados em várias ocasiões, durante os protestos. Em 9 de outubro de 2011, 27 cristãos coptas foram mortos, durante ato contra a discriminação, diante da sede da TV estatal, no centro do Cairo. Vídeos mostravam carros blindados investindo contra os manifestantes, num total desrespeito pela vida humana. Nos últimos dias, o nível de violência praticada pelas forças de segurança é inaceitável. Elas têm usado força excessiva. Recebemos relatos sobre a utilização de munição letal, gás lacrimogêneo e balas de borracha. Dezenas de ativistas foram mortos e centenas, feridos.

A situação tornou-se pior do que durante a ditadura de Hosni Mubarak?
O deplorável histórico de direitos humanos sob o ex-presidente Hosni Mubarak não tem melhorado, após nove meses de regime do Conselho Supremo das Forças Armadas (SCAF, pela sigla em inglês). Em alguns casos, a situação é pior. Por exemplo, cerca de 12 mil civis têm sido julgados pelas cortes militares, em tribunais que não atendem aos padrões internacionais de julgamento justo. São mais pessoas do que aquelas julgadas pelos tribunais militares durante 30 anos da ditadura de Mubarak. As cortes militares não são independentes nem imparciais, nem garantem o direito de defesa do acusado. Entre aqueles, estão manifestantes e ativistas, bem como acusados de crimes insignificantes e de ;selvageria;. Os promotores militares intimaram muitos jornalistas por terem criticado o SCAF. O estado de emergência, a marca do regime de Mubarak, foi expandido, apesar das promessas do SCAF.

O senhor teme que a crise se agrave ainda mais?
O uso de força excessiva é remanescente da revolução de 25 de janeiro. As forças de segurança e o Exército têm espancado os manifestantes com bastões e usado gás lacrimogêneo. Corpos no necrotério mostram ferimentos na cabeça e no peito, provocados por munição letal. Ao menos que os governos pressionem o SCAF para deter o uso da força, os assassinatos e ferimentos continuarão. Como as eleições parlamentares ocorrerão na próxima segunda-feira, estamos particularmente preocupados com a segurança dos eleitores e responsabilizamos o SCAF pela vida e pela segurança deles. Os eleitores não deveriam temer ser espancados ou mortos quando simplesmente buscam exercitar o direito ao voto.

Que recomendações a Anistia Internacional faz ao SCAF?
A Anistia Internacional apela ao SCAF para dominar as forças de segurança e pôr fim à violência. Para romper a impunidade das forças de segurança vista durante a era Mubarak, uma investigação independente e imparcial sobre os eventos recentes tem que ser realizada. Aqueles considerados responsáveis têm que ser levados à Justiça. Os egípcios perderam a confiança no SCAF e necessitam de compromissos fortes e concretos. Dois compromissos deveriam ser a suspensão do estado de emergência e o fim imediato dos julgamentos de civis em tribunais militares. Todas as pessoas detidas por criticar o Exército devem ser libertadas, imediata e incondicionalmente. As pessoas feridas durante o levante de janeiro e fevereiro deveriam ter reparações, como reabilitação e indenização financeira por suas perdas. Nós também precisamos de investigações verdadeiramente independentes sobre os abusos do Exército e das forças de segurança, e não vagas promessas de apuração do incidente. A justiça precisa ser feita.

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