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Secretaria-Geral da Unasul fala sobre os desafios da entidade

postado em 01/12/2011 08:00
A colombiana María Emma Mejía, 58 anos, começou a carreira "do outro lado do balcão". Formada em jornalismo pela Universidad del Valle, em Cali, estudou cinema e chegou a trabalhar para o serviço latino-americano da emissora BBC. Mas o bloco e a caneta ficaram de lado quando ela se aproximou do também jornalista Luis Carlos Galán, que concorreu à Presidência da Colômbia por duas vezes. Galán foi assassinado em 1989 e, no mesmo ano, María Emma assumiu a secretaria da campanha presidencial de César Gaviria. Desde então, sempre esteve envolvida com questões políticas e sociais de seu país. Em 1993, foi nomeada embaixadora colombiana na Espanha. Quando voltou, assumiu o cargo de ministra da Educação e, em 1996, se tornou chefe do Ministério de Relações Exteriores. Ao deixar a chancelaria, dois anos depois, continuou com atribuições de peso: foi indicada para a coordenação do então nascente processo de negociação de paz com as Farc, as guerrilhas armadas da Colômbia. Com tantas responsabilidade, a mulher de voz baixa, porém firme, também teve tempo para se envolver com filantropia. Até abril deste ano, presidia a Fundación Pies Descalzos, criada pela cantora Shakira para ajudar crianças vítimas da violência no país andino. Agora, no comando da Secretaria-Geral da União das Nações Sul-Americanas (Unasul), ela percorre a região para promover projetos de integração. Em Brasília, esta semana, a colombiana veio buscar um posicionamento das nações que compõem o bloco sobre os recursos para a ampliação da infraestrutura. E conseguiu. Ontem, ministros de 12 países anunciaram um plano que vai destinar US$ 13,7 bilhões para 31 áreas estratégicas no prazo de 10 anos. Em entrevista ao Correio, María Emma falou sobre os planos para o setor de telecomunicações e sobre outros desafios que a Unasul tem para resolver. Leia trechos da conversa:

Como foram as reuniões na cidade? Quais projetos serão priorizados?
As reuniões em Brasília são históricas. Aqui, em 2008, foi firmado o tratado constitutivo da Unasul, então é muito emblemático que o tema das telecomunicações, um dos assuntos mais importantes para a integração, seja discutido aqui. Falamos da construção de um anel óptico para melhorar a qualidade da banda larga na região. Esse tipo de serviço está no cerne do processo de integração, tal qual foram as ferrovias na época do desenvolvimento industrial. Hoje, contudo, os custos da banda larga são altíssimos, porque tudo depende de uma comunicação com equipamentos que estão nos Estados Unidos. Para se ter uma ideia, nos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, que reúne algumas das nações mais ricas do mundo), os serviços de banda larga custam 25 vezes menos do que aqui. Então, aprovamos um plano para intercomunicar os países. Esse projeto também será levado para a cúpula extraordinária de presidentes da Unasul, amanhã, em Caracas.

Um dos problemas comuns a todos os países sul-americanos são as drogas, o tráfico e o consumo. Como a Unasul pretende atuar nisso?
O tema das drogas, assim como o de defesa e segurança, são muito importantes para nós. Em 10 de março do ano que vem, haverá uma grande reunião em Cartagena para que ministros do Interior, da Defesa, da Saúde, da Justiça possam falar sobre o assunto e entender qual é o real tamanho do problema. A ideia é discutir como os delitos podem ser abordados, incluindo o consumo. Há lugares em que mascar a folha de coca é cultural. Penso que podemos criar um verdadeiro observatório sul-americano sobre o tema das drogas e acho que teremos muito avanço nisso. Era impensável há dois ou três anos que nós tivéssemos uma metodologia para gastos militares, ou mesmo confiança entre os países, um local onde todos colocassem as cartas sobre a mesa, onde os ministros compartilhassem suas estratégias e falassem de soberania. E hoje já temos esse avanço.

E como estão as discussões sobre a instalação do Banco do Sul?
O Banco do Sul está subscrito por sete países e requer a aprovação dos congressos de, pelo menos, cinco para entrar em vigor. Já temos quatro e estamos com a aprovação do Uruguai pendente, com a promessa de que sairá até 15 de dezembro. Em economia e finanças, houve uma reunião na sexta-feira passada com os ministros da área e estou segura de que, agora, está formado o debate dos presidentes sobre esse tópico, porque a crise é mundial. Temos crescimento, disciplina fiscal, mas não podemos ignorar essa crise. Certamente, o tema do fomento pode contribuir para isso. Assim, o Banco do Sul poderia financiar até mesmo esse projeto de telecomunicações.

Que outras medidas os países podem aprovar contra a crise?
Os presidentes vão dar sua última palavra amanhã, quando será realizada a cúpula de Caracas. Um dos temas mais importantes é o das reservas internacionais. A região assumiu uma importância muito grande, tem 400 milhões de habitantes e US$ 650 milhões em reservas, então, é importante tomarmos medidas conjuntas sobre esse assunto. Os presidentes, certamente, falarão sobre um sistema de pagamentos unificados. Também falarão do fortalecimento intrarregional. Como o consumo externo se enfraqueceu, por que não fortalecer o nosso? Eles estão muito conscientes da situação e vão tomar decisões coletivas. Convém aos países que se unam para enfrentar a crise.

Depois da morte de Néstor Kirchner (que era secrtário-geral da Unasul), Colômbia e Venezuela aceitaram dividir o mandato da Secretaria, um ano para cada país. A senhora acha que isso apaziguou as relações entre os dois países?

Sim, definitivamente. Creio que essa parceria contribuiu muito para a confiança na relação entre Colômbia e Venezuela, algo que está aqui para ficar. Países como o Brasil e outros do bloco promoveram essa iniciativa, que foi aceita. Agora temos uma relação muito boa, dois é mais que um.

Nações de fora da América do Sul pediram para entrar, como observadores, na Unasul. Isso vai acontecer?
Por ora, não. No momento, estamos revisando os regulamentos da Unasul e, se concluírmos até 8 de dezembro, quando haverá uma reunião de delegados no Rio de Janeiro, seguramente vamos conversar sobre o interesse de alguns países de participar. Alemanha, México (que demonstraram essa vontade) são muito importantes para nós.

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