postado em 24/12/2011 09:09
A missão de observadores da Liga Árabe tinha desembarcado em Damasco na véspera. A capital síria vivia uma tranquila manhã de sexta-feira, dia equivalente ao domingo para os países muçulmanos. Até que, por volta de 10h15 (6h15 em Brasília), uma poderosa explosão danificou um prédio dos serviços de segurança, no bairro de Kfar Suseh, uma das áreas mais fortificadas da cidade. Minutos depois, outro edifício foi atingido. O regime do presidente Bashar Al-Assad culpou a rede terrorista Al-Qaeda pelo duplo atentado, versão recebida com desconfiança pela oposição, que atribuiu o ato ao próprio governo.
;Muitos soldados e um grande número de civis foram mortos nos dois ataques realizados por extremistas suicidas em carros recheados de explosivos;, afirma a agência de notícias estatal Sana. A pequena nota sobre o massacre era acompanhada de 42 fotografias macabras: imagens de corpos despedaçados, transformados em massas disformes, e muito sangue. Segundo a agência Reuters, 44 pessoas morreram e 166 ficaram feridas. A milícia libanesa Hezbollah, simpatizante de Al-Assad, acusou os EUA de estarem por trás das explosões e assegurou que Washington operava ;em nome do interesse sionista;.
O vice-ministro sírio das Relações Exteriores, Faysal Meqdad, esteve no local de um dos ataques e culpou o extremismo islâmico. ;No primeiro dia de chegada dos observadores árabes, este é o primeiro presente do terrorismo e da Al-Qaeda, mas vamos facilitar ao máximo a missão da Liga Árabe;, disse à France-Presse. De acordo com testemunhas, um carro tentou forçar a entrada no complexo de Segurança do Estado e outro foi pelos ares diante da sede dos serviços de segurança. ;O terrorismo quis que o primeiro dia dos observadores em Damasco fosse trágico, mas o povo sírio enfrentará a máquina de matar apoiada por europeus, americanos e certos árabes;, advertiu o vice-chanceler.
A oposição sugeria que o regime ;fabricou; os ataques, para convencer a comitiva da Liga Árabe ; que visitou Kfar Suseh ; sobre a sensação de insegurança no país e a suposta presença de uma resistência armada. ;As explosões ocorreram um dia após a chegada dos monitores, nenhum grupo assumiu a responsabilidade e a investigação preliminar foi concluída apenas 13 minutos depois;, afirmou ao Correio Hazrid (nome fictício), um morador de Damasco. ;As circunstâncias e o momento apontam para o fato de que a Al-Qaeda nada tem a ver com isso, mas sim o regime;, acrescentou. Ativista da oposição, Hazrid escutou o som das explosões e demorou a perceber o que havia ocorrido. ;Primeiro, pensei que algo tivesse caído de um prédio próximo, talvez um tanque de água vazio. Quando cheguei à rua e ouvi a segunda explosão, percebei o que estava acontecendo;, relatou.
Mentira
O empresário Mar Ram, 31 anos, não tem dúvidas. ;É uma grande mentira. Tudo o que acontece no mundo, a culpa é da Al-Qaeda;, ironizou o morador de Damasco. Ele acredita que os corpos exibidos pela agência Sana não eram de membros das forças de segurança. ;Na minha opinião, tratavam-se de manifestantes, mantidos presos durante alguns meses, antes de serem executados. Seus restos mortais foram colocados nos locais das explosões;, sugere o sírio, que contou à reportagem não ter escutado as detonações. ;Com esses ;atentados;, as autoridades transmitiram a mensagem de que não é seguro caminhar sozinho pela capital e que os observadores da Liga Árabe só podem ir aonde o governo determinar;, concluiu.
Sob a condição de anonimato, um estudante sírio adepto de Bashar Al-Assad rejeita a hipótese de o governo ter maquiado os ataques. ;Se o regime quisesse, o duplo atentado não teria ocorrido diante de seus próprios prédios nem alvejado suas forças de segurança;, lembra, em entrevista pelo microblog Twitter. Ele acha plausível o envolvimento da organização islâmica Irmandade Muçulmana ou da Al-Qaeda. ;O Conselho Nacional Sírio não representa a oposição na Síria nem detém controle sobre os rebeldes armados. Por sua vez, o Exército Livre Sírio é só uma fachada para milicianos;, desabafa.
Em Homs, 160km ao norte de Damasco, as tropas de Al-Assad mantêm o massacre. Pelo menos 19 pessoas morreram ontem na cidade ; 10 foram vítimas de armas de fogo e 9 sofreram tortura no Hospital Militar. Às 22h (18h em Brasília), as forças de segurança atacavam vários bairros. ;A cidade está sendo bombardeada com morteiros indiscriminadamente. Durante a manhã, nove pessoas foram abatidas por franco-atiradores e, à tarde, houve grandes protestos contra o governo sírio, em 32 locais diferentes;, relatou Yazan Homsy, 33 anos, morador de Homs.
No primeiro dia de chegada dos observadores árabes, este é o primeiro presente do terrorismo e da Al-Qaeda"
Faysal Meqdad, vice-chanceler sírio
Ban Ki-moon está "seriamente preocupado"
O secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, está ;seriamente preocupado com a escalada da violência na Síria;. ;As explosões de hoje (ontem) em Damasco, que causaram mais mortos e feridos, incrementaram sua crescente preocupação. Ban enfatiza que toda violência é inaceitável e deve parar imediatamente;, disse o porta-voz Martin Nesirky. O líder da ONU destacou a necessidade de uma mudança política ;crível, inclusiva e legítima; na Síria e exortou o governo a implementar ;completa e rapidamente; o plano da Liga Árabe.
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Total de sírios mortos ontem em Homs e em outras cidades, pelas forças de segurança
As circunstâncias e o momento apontam para o fato de que a Al-Qaeda nada tem a ver com isso, mas sim o regime;
Hazrid (nome fictício), morador de Damasco