postado em 30/12/2011 10:04
A Alemanha acordou assustada na manhã de 14 de novembro passado. Estampada nas capas dos jornais estava a notícia de que dois homens encontrados mortos 10 dias antes, dentro de um trailer incendiado, eram responsáveis por alguns dos mais violentos crimes dos últimos 10 anos. Uwe Mundlos e Uwe B;hnhardt, de 38 e 34 anos, respectivamente, faziam parte de uma organização neonazista que matou nove imigrantes. A história ressuscitou os fantasmas da Segunda Guerra Mundial e escancarou a inabilidade do governo para identificar e deter os partidários de ideologias racistas e xenófobas. Para se ter uma ideia, um levantamento dos jornais Die Zeit e Tagesspiegel revelou que pelo menos 137 pessoas foram assassinadas entre 1990 e 2008 ; todas vítimas da extrema direita.Os dois homens, que aparentemente se suicidaram, faziam parte do núcleo da célula terrorista Clandestinidade Nacional Socialista (NSU, na sigla em alemão). Dias depois da descoberta da atividade do grupo, uma mulher de 36 anos se entregou à polícia. Antes disso, porém, Beate Zsch;pe explodiu o apartamento onde morava com a dupla, destruindo provas sobre as ações da organização. Um quarto suspeito de envolvimento com o NSU, Ralf Wohlleben, 36, também foi preso. Durante anos, Wohlleben foi militante do Partido Nacional Democrático (NPD), que está representado nos parlamentos de dois estados alemães.
Embora não seja possível fazer uma associação entre os crimes da NSU e a atuação do NPD, as afinidades ideológicas preocupam entidades que monitoram a violência de extrema direita. ;Por muitos anos, as autoridades alemãs sofreram de uma ;cegueira do olho direito;. Devido ao terrorismo (de esquerda) na década de 1970 e ao 11 de setembro (de 2001, nos Estados Unidos), houve uma grande desconfiança em relação à esquerda e aos radicais islâmicos. O terrorismo de direita ficou negligenciado;, aponta Claudia Roth, copresidente do Partido Verde, uma das legendas que mais se opõem ao NPD.
E esse ;descuido; não é exclusivo da Alemanha. Em julho passado, o radical de extrema direita Anders Breivik assassinou friamente 77 pessoas na Noruega ; muitas delas eram jovens filiados ao Partido Trabalhista. Breivik não era membro de nenhuma legenda (embora tivesse sido, anos atrás) e foi declarado esquizofrênico pelos médicos que o examinaram. Mesmo assim, as autoridades norueguesas ficaram de queixo caído ao saber que os planos do terrorista estavam publicados na internet, sem que ninguém houvesse percebido. ;A polícia e os mecanismos de proteção estão sempre muito atentos à ameaça terrorista islâmica, vinculada ao fanatismo religioso. Mas o terrorismo de direita está profundamente ancorado na sociedade;, afirma o sociólogo brasileiro Sérgio Costa, que dá aulas na Universidade Livre de Berlim.
O problema, explica o especialista, é que ninguém na Europa está preparado para um ato de violência por parte de pessoas brancas e nativas. ;Na Noruega, os vizinhos de Breivik ficaram muito surpresos. Não imaginavam que alguém como ele fosse capaz de matar;, lembra Costa. ;São pessoas muito inseridas no tecido social, e por isso o senso de perigo fica anulado.;