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Nostalgia da extinta Alemanha comunista inspira os restaurantes em Berlim

Agência France-Presse
postado em 09/03/2012 16:18
Berlim - Tomados pela nostalgia, mais de 20 anos após a queda do Muro, os frequentadores de restaurantes berlinenses redescobrem pratos com gosto da extinta Alemanha Oriental (República Democrática Alemã, RDA).

Lugar emblemático do que foi a capital alemã-oriental, o restaurante panorâmico "Fernsehturm" (torre de televisão), o mais alto prédio de Berlim (365m), decidiu investir em sua identidade culinária da época comunista. "Pedimos aos nossos cozinheiros que modernizassem os pratos típicos da RDA", explicou a gerente da casa, Christina Aue.

Outros estabelecimentos, como l;Osseria, no bairro periférico de Weissensee, ou o Domklause, restaurante do museu da RDA, no centro da cidade, atraem há longo tempo berlinenses e turistas em busca de uma experiência pitoresca.

Entre as iguarias do menu estão pratos como o ;jagdwurst; - uma espécie de salsicha passada na farinha de rosca com tomate e enfeitada de champignons -, e ainda ;gulash; e ;krusta; - esta última é uma versão alemã-oriental da pizza.

São pratos nascidos das dificuldades de abastecimento da época, disse Uwe Kayser, ;chef; do l;Osseria. "No oeste havia carne de vitela, mas era muito difícil de encontrar no leste. Então, utilizávamos mais as carnes de porco e aves", precisou o cozinheiro, sentado diante de um exemplar da biografia de Erich Honecker, último homem forte da RDA, Estado comunista, sob controle soviético.

O homem, tatuado da nuca aos punhos, já está há oito anos atrás do fogão. E não são apenas os pratos de sua infância dos quais sente saudade.

Nascido no Leste, Uwe Kayser tinha 14 anos quando, em 1989, foi derrubado o Muro erguido em 1961, para impedir os cidadãos do Leste voltarem à Alemanha Ocidental (RFA), democrática e capitalista.

Da RDA, ele se lembra de um Estado "mais social" que a Alemanha de hoje, onde "tínhamos pouco, mas nos bastava".

Atmosfera perdida

Entre as paredes cobertas de fotos e aparadores sobre os quais se acumulam um bricabraque de objetos carregados de lembranças, o ;chef; lamenta uma coisa : a música de época. "Não aguento mais", comentou com um sorriso. Atrás dele, o retrato da cantora francesa Mireille Matthieu, ;star; tanto na RDA quanto na RFA, com o olhar um pouco maroto.

No entanto, segundo o diretor do Centro de documentação da vida quotidiana na RDA, Andreas Ludwig, "nenhum chef arriscaria sua fama com a cozinha alemã-oriental, que não é verdadeiramente atraente".

Mas o sucesso destes restaurantes não é proporcionado pelos pratos, mas pelo que representam. Eva Barl;sius, autora de uma "Sociologia do Comer", acha natural que, após um parênteses de 20 anos, assista-se ao "renascimento" de alguns hábitos alimentares.

"Em todas as culturas, assiste-se a uma invenção das tradições culinárias", explicou, com "a comunidade criando um prato de referência que se torna o símbolo de um modo de vida".

O que atrai os clientes é poder reencontrar por alguns instantes este "modo de vida", esta atmosfera desaparecida que enche a alma.

A decoração pitoresca ao estilo alemão-oriental contribui para o clima de nostalgia. Em nossos pratos, a diferença com a Alemanha Ocidental não é flagrante. "As disparidades da cozinha alemã são, principalmente, regionais; mais do que marcadas pelo Leste/Oeste", admitiu o ;chef; de cozinha do Domklause, Rene Loock.

Uma prova de que o ambiente conta mais do que a comida, Uwe Kayser confessou que faz pouco caso da origem geográfica dos produtos. No bar, por exemplo, os ;schnaps; e vinhos propostos são os mesmos que se bebe no Leste.

Mas satisfazem aos turistas que vêm procurar um pouco de exotismo no bairro. "Gastamos muito com a publicidade", admite Uwe Kayser.

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