Agência France-Presse
postado em 18/04/2012 15:30
Lima - "Uma vez ingeridas as cápsulas de cocaína, o tempo urge", disse um policial à AFP. E quando se trata de voos transatlânticos de 12, 13 horas, "o risco de overdose aparece a todo o instante"No entanto, a cada semana, voos partindo do Peru ou da Bolívia, dois dos grandes países fornecedores, levam à Europa essas "mulas" que apostam no perigo de conseguir passar com a droga, escondida em seus corpos. Assim, 350 pessoas foram detidas no ano passado no aeroporto de Lima, entre elas, 200 estrangeiros.
No final de janeiro, em Lima, dois jovens franceses foram pegos no momento de embarcar para Amsterdã com, respectivamente, 19 e 32 pacotinhos de cocaína no estômago. Um terceiro ia para Paris com 1,2 kg de cocaína escondidos em embalagens de xampu e de creme.
Alguns dias depois, um australiano teve menos sorte. Uma das 23 cápsulas de cocaína líquida (1,2 kg no total) que ele ingeriu arrebentou a bordo, causando terríveis dores estomacais. Ele acabou falecendo quando o avião pousou no aeroporto de destino.
Na semana seguinte, foi um espanhol que conheceu o mesmo destino, em Santa Cruz, na Bolívia. Em meados de janeiro, aconteceu o mesmo com uma nigeriana. Em setembro, uma espanhola morreu nos banheiros do aeroporto, com 97 cápsulas de droga no intestino.
Em 2010, 480 ;mulas; foram detidas no aeroporto Jorge Chavez de Lima, sendo 320 estrangeiros, segundo a polícia. No total, 1.100 estrangeiros, entre eles 300 espanhóis, foram capturados em todo o Peru, 90% deles por tráfico de drogas.
"Isso nos preocupa enormemente. As prisões peruanas estão cheias de mulas, de jovens", explica à AFP a chefe do departamento de luta antidroga, Carmen Masias. "O fenômeno aumentou nos últimos cinco anos, com "mulas" vindas de países diferentes, ilustrando novas rotas do tráfico, como a África".
Apesar desses casos, quantos conseguem passar? "É difícil dizer", disse uma fonte policial. Mas não é raro que no mesmo voo estejam várias "mulas" e até um "supervisor", ele também portador.
"O que eles não compreendem é que estão sendo sacrificados, vendidos. Às vezes sua interceptação é arranjada por um ;contato; no aeroporto, uma forma de distrair as autoridades, permitindo que outros passem pelos controles ou que a Polícia apresente uma presa estrangeira", contou Damian, um jovem francês inocentado do crime de tráfico no início de 2012, após ter sido vítima de uma prisão preventiva, durante um falso testemunho.
Damian, 27 anos, passou oito meses com 350 pessoas "num pavilhão previsto para 60 detidos". Perdeu dez quilos e era obrigado a "pagar" por algum conforto. Estavam com ele centenas de ;mulas; estrangeiras que contavam histórias tristes.
"Tudo começa com um jovem europeu sem dinheiro, na rua. Alguém vem propor a ele entre 3.000 e 5.000 euros para fazer um voo de ida e volta", contou Damian à AFP.
"Raramente uma pessoa escolhe ser mula. Mais frequentemente, é uma vítima", comentou uma fonte policial, mesmo se começam a aparecer, também, pequenas redes organizadas a partir da Europa.
"Alguns são ameaçados, ou eles próprios, ou alguém ligado a eles, para que transportem alguma coisa", contou Damian.
Eles se arriscam a entre 6 e 12 anos de prisão, às vezes entre 15 e 20 anos, se condenados como membros de uma rede internacional.
Cápsulas engolidas, grandes feridas abertas no corpo, frascos de creme, bainha dupla das roupas, saltos de sapatos... o leque de estratégias é numeroso e mutável.
"O último truque não é esconder a droga, mas torná-la irreconhecível, misturando-a com outras substâncias", diluindo-a no vinho, misturando-a ao xampu, impregnando roupas, explicou Guillermo Sandoval, procurador da justiça de Lima.