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"Processo expõe hipocrisia do governo dos EUA", diz advogado de Assange

Rodrigo Craveiro
postado em 21/08/2012 07:50
Simpatizantes do presidente equatoriano, Rafael Correa, protestam na Praça das Armas, em Quito, em apoio à concessão de asilo diplomático ao hacker australiano: Equador se dispõe a dialogar com o Reino Unido
Julian Assange obteve o que desejava com seu discurso proferido da sacada da Embaixada do Equador, em Londres, na manhã de anteontem. Ao pedir que o presidente norte-americano, Barack Obama, faça a ;coisa certa; e interrompa a caça às bruxas ao WikiLeaks ; o site de vazamento de documentos confidenciais, fundado por ele ;, o hacker australiano capitalizou a atenção mundial e forçou uma resposta dos Estados Unidos. O contra-ataque veio 24 horas depois, por meio da porta-voz do Departamento de Estado, em Washington. De acordo com Victoria Nuland, as declarações de Assange são ;absurdas;. ;Ele está claramente tentando desviar as atenções do centro da questão;, afirmou ela, referindo-se aos crimes de abuso sexual dos quais o líder do WikiLeaks é acusado pela Suécia. Christine Ann Assange, mãe de Julian, saiu em defesa do filho e devolveu as críticas aos EUA. ;O governo dos Estados Unidos está desviando a atenção do tema real: a perseguição do editor-chefe do WikiLeaks por expôr os crimes de guerra e a corrupção;, afirmou ao Correio, em entrevista pela internet.

Às vésperas da reunião da Organização dos Estados Americanos (OEA), Nuland também centrou fogo no Equador. Segundo a representante de Washington, Quito tenta ;criar problemas; na entidade ; o governo de Rafael Correa convocou para sexta-feira o encontro dos chanceleres dos 34 países-membros da entidade. A pauta se restringirá ao caso Assange. A porta-voz fez questão de frisar que o tema diz respeito somente ao Reino Unido, à Suécia e ao Equador e não é apropriado discuti-lo na OEA. ;Não vemos por que a OEA possa desempenhar um papel em uma situação hipotética, que não parece iminente;, disse, ao abordar uma suposta invasão da Embaixada do Equador pela Scotland Yard, a polícia britânica.

Policiais da Scotland Yard diante da embaixada, em Londres, enquanto Julian Assange (na sacada, D) discursava no domingo (19/8)
MICHAEL RATNER, ADVOGADO DE JULIAN ASSANGE NOS EUA, FALA AO CORREIO. LEIA A ENTREVISTA:
Como o senhor vê a disposição do Equador em negociar com o Reino Unido?
O Equador tem se disposto a negociar com o Reino Unido e Suécia durante todo o tempo. No entanto, esses governos nada ofereceram. O Reino Unido se recusa a garantir que não aprovará a extradição de Assange, se recusou a dar o salvo-conduto e, em vez disso, faz ameaças ilegais de invadir a embaixada. A Suécia se nega a garantir que não extraditará Assange aos EUA e se recusa interrogá-lo em Londres. Tenho certeza de que o Equador não entregará Assange às autoridades britânicas, a menos que haja uma garantia absoluta de que ele não será enviado aos EUA.

De acordo com a imprensa britânica, a permanência indefinida de Assange na embaixada torna o Reino Unido mais vulnerável e sob pressão. O senhor concorda?
O Reino Unido realmente cometeu um grave erro ao ameaçar invadir a embaixada. Tratou o Equador como se fosse uma colônia vassala. Jamais faria tal ameaça a uma grande potência, como os Estados Unidos e a China. Eu acho que o Reino Unido está sob intensa pressão para dar a Assange livre-conduto, por ele ter o status de asilado. Mas o Reino Unido também tem grande pressão dos EUA e frequentemente age como parceiro dos EUA, ao realizar más ações. A guerra do Iraque é apenas um exemplo. Julian Assange teve um grande apoio no Reino Unido e, no fim disso, a Organização dos Estados Americanos (OEA) pode forçá-lo a dar o salvo-conduto.

O Departamento de Estado norte-americano considerou absurdos o discurso de Assange sobre a "caça às bruxas" contra o WikiLeaks. Como viu essa reação de Washington?
Os Estados Unidos e o Reino Unido farão qualquer coisa que puderem para chamar a atenção ao que está ocorrendo: o esforço dos EUA em processar Julian Assange por expôr a criminalidade e a hipocrisia do governo americano. Querem dar um exemplo, com Assange, para desencorajar a revelação da verdade no futuro. Como um dos advogados de Julian Assange, eu estou familiarizado com os esforços nos EUA em processá-lo; e esses esforços continuam. Eu quero ser claro: Julian Assange não pediu para receber asilo por causa das acusações na Suécia. O Equador não concedeu asilo a Assange por causa das acusações na Suécia. Assange tem asilo porque está sendo perseguido por suas opiniões políticas. Se o pedido sueco para a extradição fosse realmente para questionar Assange, a Suécia teria aceito a oferta do Equador para interrogá-lo em Londres. Não o fez. Então, o Reino Unido fez uma ameaça de invadir a Embaixada do Equador -- algo contrário ao direito internacional fundamental de proteção às embaixadas. Eu pergunto: o Reino Unido relamente teria ido a tal extremo se fosse meramente para interrogar Julian Assange? Os EUA e sua porta-voz Victoria Nuland deveriam declarar que não processarão Assange -- até que o façam, as palavras dos EUA serão sem sentido.

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