"No que diz respeito ao roubo com agravante, declaro-me inocente. Sinto-me culpado por ter traído a confiança do Santo Padre, de quem gosto como se fosse um filho", declarou Paolo Gabriele, que também alegou ter agido "sem cúmplices", embora tivesse muitos "contatos".
"Desde 1997, todos me conheciam no Vaticano, confiavam em mim. Não sou o único a ter fornecido informações confidenciais à imprensa nestes anos", completou.
Gabriele também disse que atuou desta maneira porque Bento XVI foi "manipulado".
"O que realmente me horrorizava era quando sentava para almoçar com o Santo Padre e que, algumas vezes, o Papa me perguntava coisas sobre as quais tinha que estar informado", disse.
"Naquele momento fiquei firmemente convencido de que era fácil manipular uma pessoa com poderes tão grandes", completou.
Quando a advogada de defesa perguntou se acreditava que o Papa estava mal informado, o acusado respondeu de maneira afirmativa, mas o juiz desconsiderou a pergunta.
O magistrado também interrompeu Gabriele várias vezes, quando o acusado procurava revelar detalhes de sua rede de contatos no Vaticano.
Durante a instrução do caso, Gabriele afirmou que desejava combater "o mal e a corrupção" no Vaticano. No entanto, nesta terça-feira (2/10), o juiz Giuseppe Dalla Torre considerou sistematicamente que as perguntas a respeito estavam "fora de tema", já que deveriam "limitar-se à acusação do processo", ou seja, roubo com agravante.
Ao mesmo tempo, o Vaticano decidiu realizar uma investigação sobre as condições de detenção de Gabriele, que afirma ter sido submetido a "pressões psicológicas" depois de sua prisão, em 23 de maio. Segundo o ex-modormo do Papa, ele ficou preso durante 15 dias numa cela na qual não podia sequer esticar o braço, iluminada 24 horas por dia.
Gabriele, um dos poucos cidadãos laicos do menor Estado do mundo, poderá ser condenado a uma pena de até quatro anos de prisão.
O julgamento foi aberto à imprensa, fato inédito na história do Estado Pontifício. Mas a audiência pública estava estritamente controlada; apenas poucos jornalistas foram autorizados a entrar na sala do tribunal e só podiam informar sobre o processo na saída. Não podiam utilizar câmeras de fotografia, nem de vídeo.
Fiel servidor de Bento XVI, o mordomo preparava as roupas de cerimônia e servia as refeições do Papa. Nas fotos oficiais sempre aparecia ao lado do pontífice, inclusive ao lado do famoso papa-móvel.
Ele é acusado de ter roubado e copiado durante meses dezenas de documentos confidenciais do Papa e seus colaboradores. Depois, sob o pseudônimo "Maria", transmitia os documentos ao jornalista Gianluigi Nuzzi, que os usou em seu livro "Sua Santità", que revelou as rivalidades e a animosidade, especialmente contra o número dois do Vaticano, cardeal Tarcisio Bertone.
Entre a correspondência do Papa está uma carta de um ex-dirigente do Vaticano que se queixava de ter sido afastado depois de lutar contra a corrupção dentro da Santa Sé.