Agência France-Presse
postado em 16/10/2012 13:42
Trípoli - A nova Líbia deu um grande passo em direção à democracia ao organizar suas primeiras eleições livres, mas a incapacidade das autoridades em restabelecer a segurança diante do aumento do extremismo e da proliferação de milícias atrasa a construção das instituições do Estado.Conflitos tribais e reivindicações sociais ou regionais tornam ainda mais complicada a vida das autoridades que assumiram o poder após a queda de Muamar Kadhafi, em outubro de 2011. Pressionadas pelo aumento da violência, as autoridades se concentram na reconstrução do país devastado por um conflito de oito meses.
Contudo, não são os meios que faltam. Com a retomada rápida da produção de petróleo, que já atingiu um nível parecido com o anterior ao conflito de 2011, este rico país petrolífero dispôs em 2012 de um orçamento de 56 bilhões de dólares, o mais alto de sua história. Mas Kadhafi deixou para trás um pesado legado, com um país sem instituições, um Exército marginalizado e seguidores acusados de atuar para obstruir o processo democrático na Líbia.
De acordo com uma fonte dos serviços de segurança, algumas "precauções" foram tomadas para evitar qualquer tentativa de ataque de partidários de Kadhafi para marcar o primeiro aniversário da morte de seu ex-líder, no sábado. Nenhuma cerimônia foi prevista para a ocasião por Trípoli, que festejará o aniversário da proclamação da "libertação nacional" em 23 de outubro de 2011, três dias após a morte de Kadhafi, em 20 de outubro em sua cidade natal de Sirte.
Esta celebração ocorre no momento em que o novo primeiro-ministro, Ali Zeidan, prepara a composição de seu governo, que será apresentado em duas semanas para aprovação do Congresso Geral Nacional (CGN), a mais alta autoridade política do país, após as eleições de 7 julho. Eleito no domingo, Zeidan substituirá Abdelrahim al-Kib, cujo governo conduziu um primeiro período de transição turbulenta, mas que tem o mérito de ter organizado as primeiras eleições livres no país.
[SAIBAMAIS]A comunidade internacional comemorou como uma etapa importante na história da Líbia que permitiu aos líbios desfrutar a democracia e a liberdade de expressão, depois de décadas de tirania, apesar da preocupação com a segurança e o respeito às leis. "A Líbia passou no primeiro teste da democracia ao eleger uma Assembleia Nacional depois de mais de 42 anos de totalitarismo", considera o analista líbio, Nasser al-Daessy, que ressalta, contudo, a necessidade urgente de um consenso nacional para a implementação das instituições, a criação de um exército e a elaboração de uma Constituição.
"Um Exército profissional forte é vital para garantir a segurança e a autoridade do Estado", declarou na segunda-feira Mohammed Megaryef, presidente do CGN aos oficiais do exército. O governo não conseguiu reativar os serviços de segurança e integrar os ex-rebeldes, que se tornaram uma dor de cabeça para as autoridades.
Além disso, o ataque ao consulado dos Estados Unidos em Benghazi (leste), em 11 de setembro, que terminou com a morte do embaixador americano e de três oficiais mortos, ilustrou a ascensão de grupos radicais islâmicos que atuam livremente, sobretudo no leste do país. Esses extremistas assumiram a autoria do ataque ao consulado e também dos assassinatos de oficiais em Benghazi, e de ataques contra alvos ocidentais.
Um ex-chefe das representações diplomáticas dos Estados Unidos na Líbia expressou sua preocupação com a crescente presença da rede terrorista Al-Qaeda na Líbia a uma comissão de investigação do Congresso responsável pelo caso de Benghazi. "A presença deles aumenta a cada dia e estão certamente mais bem estabelecidos do que nós", disse o coronel Andrew Wood, que esteve na Líbia entre fevereiro e agosto de 2012.
O novo governo deve considerar também a reativação da justiça, em meio a críticas de organizações internacionais para a defesa dos direitos humanos que denunciam atos de tortura e prisões arbitrárias realizadas pelos ex-rebeldes com total impunidade. Essas críticas já tinha começado a chover com a morte de Kadhafi, executado sumariamente, e de seu filho Moatassim, depois de ter sido preso vivo, de acordo com várias testemunhas.
As autoridades líbias anunciaram em seguida a abertura de uma investigação, cujos resultados nunca foram tornados públicos. As condições de detenção de Seif al-Islam, outro filho de Kadhafi, por uma brigada de Zenten (oeste) desde sua prisão em novembro de 2011 também são uma fonte de preocupação da comunidade internacional. Trípoli insiste em julgá-lo, apesar do mandado de prisão do Tribunal Penal Internacional por crimes contra a humanidade.
As novas autoridades devem também abordar a questão da reconciliação nacional no momento em que os conflitos tribais podem mergulhar o país em uma guerra civil e fazê-los esquecer a sua principal missão: escrever uma constituição que regerá as próximas eleições, previstas para o próximo ano.