Agência France-Presse
postado em 27/11/2012 19:42
Cairo - Dezenas de milhares egípcios protestavam nesta terça-feira (27/11) após o anúncio da véspera de que o presidente islamita Mohamed Mursi manterá um decreto com o qual assume amplos poderes suplementares, apesar de vários dias de protestos e da oposição da justiça.Milhares de advogados participaram de uma passeata em direção à Praça Tahrir gritando "o povo quer a queda do regime", um dos lemas emblemáticos da revolta do ano passado, que terminou com a queda de Hosni Mubarak.
Outros grupos de manifestantes avançaram para a famosa praça do centro da cidade, aonde chegam progressivamente mais pessoas que protestam contra o governo.
Fatih Ghalib, militante de um partido de esquerda de 56 anos, morreu de manhã asfixiado pelo gás lacrimogêneo da polícia perto da embaixada do Cairo, anunciou seu partido, o que eleva para três o número de manifestantes mortos nos enfrentamentos dos últimos dias.
"A Irmandade Muçulmana é mentirosa", indicava um cartaz exibido por um manifestante, enquanto uma bandeira na entrada da praça proclamava: "Proibido à Irmandade Muçulmana", grupo ao qual Mursi pertence.
Na manhã desta terça-feira foram registrados confrontos entre grupos de jovens e a polícia perto da Praça Tahrir.
Estes confrontos, que começaram na semana passada ao redor da praça, foram retomados nos arredores da embaixada americana com pedradas e com bombas de gás lacrimogêneo.
Os militantes contrários a Mursi pediram o fim dos confrontos por medo de que se estendam ao local da manifestação.
Na Praça Tahrir, barracas estão instaladas desde sexta-feira em protesto contra o decreto através do qual o presidente islamita colocou suas decisões acima de qualquer recurso, uma iniciativa que a oposição denunciou como uma medida ditatorial.
Esta crise é a mais grave desde a eleição de Mursi, membro da Irmandade Muçulmana e que dirige o país mais populoso do mundo árabe, com 83 milhões de habitantes.
"O presidente empurra o povo para a desobediência civil", "A Irmandade Muçulmana rouba a revolução", proclamavam os manifestantes em faixas exibidas na Praça Tahrir.
"Ficaremos na Tahrir até que Mursi tenha anulado sua declaração", afirmou Ahmed Fahmy, um desempregado de 34 anos que acampa nesta praça símbolo da revolta que provocou a queda de Mubarak em fevereiro de 2011.
"Proteger a revolução"
A Irmandade Muçulmana, que em uma primeira etapa convocou manifestações em outro bairro do Cairo para apoiar o presidente, cancelou esse protesto, explicando que queria evitar confrontos.
Após uma reunião com os principais membros do Judiciário na segunda-feira, Mursi decidiu manter o polêmico decreto.
Yasser Ali, porta-voz do presidente, disse, entretanto, que os "poderes soberanos" de Mursi ficarão excluídos de qualquer tipo de recurso à justiça, dando a entender que as decisões de rotina poderiam ser submetidas a um juiz, o que alguns interpretam como uma concessão frente aos protestos.
O decreto anunciado no dia 22 de novembro permite ao presidente tomar qualquer decisão que considerar necessária para "proteger a revolução", e impede que a justiça examine as demandas contra o processo de redação da Constituição, que seus adversários consideram dominado pelos islamistas.
Os partidários de Mursi consideram que estes poderes excepcionais darão ao mandatário os meios para realizar reformas indispensáveis e afirmam que serão suspensos com a adoção da nova Constituição, dentro de alguns meses.
Em seu decreto, o chefe de Estado também pediu "novas investigações e sentenças" nos casos de assassinatos de manifestantes durante a revolta de 2011, o que representa uma ameaça para algumas autoridades militares e policiais, e talvez de um novo processo contra Mubarak.
Este último ponto atende aos insistentes pedidos da oposição e de grande parte da opinião pública, que consideram que os julgamentos realizados até agora foram tolerantes demais com os acusados.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) indicou que uma "mudança importante" na política econômica do país, que voltar a crescer, poderá colocar em questão o pré-acordo sobre um plano de ajuda de 4,8 bilhões de dólares.