Agência France-Presse
postado em 21/12/2012 17:54
Tikal - O mundo continuou girando nesta sexta-feira (21/12) apesar da angústia de uns e brincadeiras da maioria com os prognósticos apocalípticos que surgiram de uma mudança de era no calendário maia, celebrada entre a espiritualidade e a curiosidade turística, em sítios arqueológicos da América Central e do México.Nos primeiros raios de Sol, sacerdotes maias celebraram a cerimônia do fogo em lugares sagrados e majestosas ruínas como Tikal, no norte da Guatemala, e Chichén Itzá, no sudeste do México, saudando a uma nova era, após a conclusão de um ciclo de 5.200 anos, 13 baktun no complexo calendário maia.
Perante cerca de 3.000 espectadores, reunidos em torno de um círculo no centro da Plaza Mayor de Tikal, a 560 km ao norte da capital guatemalteca, os sacerdotes acenderam o novo fogo e pediram por unidade, paz, o fim da discriminação e o racismo.
"Esperamos verdadeiramente um novo amanhecer, sem divisões, discriminação e exclusão entre nós", disse à AFP Fortunato Mendoza, um indígena de 55 anos que percorreu 1.000 km em dois dias para fazer uma oferenda aos deuses em Tikal, uma das cidades mais representativas do império maia.
Os descendentes dos maias, uma civilização milenar que se firmou no sul do México, Guatemala, Honduras, El Salvador e Belize, vivem este solstício com a esperança de um "novo amanhecer" e um despertar para a humanidade.
"Para nós não é um show e não é turismo, é algo espiritual e pessoal", disse à AFP Sebastiana Mejía, da Conferência de Ministros Maias da Guatemala, ao criticar a cerimônia oficial organizada pelo governo em Tikal, apresentada pelo presidente Otto Pérez.
A cerimônia atraiu chefes de Estado, convidados especiais e turistas, entre eles o cantor portorriquenho Chayanne, que nesta sexta-feira passeava pelas ruínas com certa discrição e o propósito "de conhecer mais sobre a civilização maia".
Quase 4.500 km ao sudeste, muito longe da zona maia e em pleno coração das civilizações incaicas, um rito ancestral de purificação do ambiente deu início à madrugada desta sexta-feira na boliviana Isla del Sol, sobre o Lago Titicaca, para saudar o solstício de verão austral.
Paranoia mundial
As comemorações deram lugar às interpretações catastróficas, animadas em grande parte por filmes de Hollywood. Uma suposta profecia maia, que os próprios maias desmentiram veementemente, impulsionou alguns ao redor do mundo a se refugiarem nas montanhas e em curiosos refúgios anticataclismos, tão caros que somente os ricos poderiam se salvar.
Muitos que acreditavam que o mundo poderia acabar nesta sexta-feira viajaram para Alto Paraíso, no centro do Brasil, convencidos de que este povoado de tradição esotérica e antigo refúgio de hippies seria um bunker natural contra a catástrofe.
Outros fanáticos subiram as montanhas da Sérvia e da França. Na Argentina o maior temor era de suicídios coletivos em uma montanha de reputação mística. Na Índia, China, Austrália, Turquia, Holanda... milhares de pessoas se prepararam para este 21 de dezembro.
A loucura apocalíptica contagiou tanto o mundo que governos, como o dos Estados Unidos e da Rússia, e cientistas, inclusive da agência espacial americana Nasa, tiveram que explicar várias vezes que, pelo menos até agora, a Terra continuará girando.
"Nosso planeta vai bem há mais de 4 bilhões de anos, e cientistas competentes de todo o mundo asseguram que não há nenhuma ameaça relacionada com o ano 2012", disse a Nasa em seu site.
A grande maioria, cética, passou pelo suposto "fim do mundo" com serenidade e bom humor. As redes sociais foram invadidas por piadas, algumas bastante criativas, sobre o tão falado tema do apocalipse.
O apocalipse vende
O que foi real foi o lucrativo negócio do fim do mundo. Governos e empresários do México e América Central lançaram campanhas para atrair turistas aos sítios arqueológicos como o de Tikal, Copán (Honduras) e Chichén Itzá.
Nesta sexta-feira cerca de 135.000 turistas estavam reunidos em bairros do Caribe Mexicano, onde há muitos sítios arqueológicos e somente em Chichén Itzá se esperavam para este 21 de dezembro cerca de 30.000 visitantes.
Hotéis lotados, que dispararam suas tarifas, jantares com os melhores chefes, bailes, excursões, shows... todo o entorno do fim do mundo foi, provavelmente, pago adiantado, exigência feita também como segurança de recebimento... no caso do mundo realmente acabar.
Enquanto muitos empresários encheram suas carteiras com o turismo apocalíptico, os maias, cujos descendentes são estimados em cerca de nove milhões na América Central e México, vivem na grande pobreza e sofrem a depreciação e a discriminação.
Ainda que já estivessem em decadência quando chegaram os conquistadores espanhóis, seu vasto legado para a humanidade permanece vivo: na arquitetura, ciência, cultura e astronomia. Segundo seus líderes, eles continuam contribuindo em todo o mundo com uma mensagem de paz e harmonia com a natureza. Nunca de cataclismos.