Rodrigo Craveiro - Enviado Especial
postado em 08/03/2013 01:01
Caracas - É noite de quinta-feira e, à medida que me aproximo do Paseo Los Próceres, a cerca de 1km da Academia Militar de Caracas, uma multidão vestida de vermelho parece tentar buscar no luto algum tipo de alegria. Idosos, cadeirantes, adultos e crianças enfrentam uma gigantesca fila, que dobra a esquina centenas de metros atrás e se estende por sobre uma ponte, perdendo-se do olhar. Tudo para dar o último adeus ao presidente venezuelano, Hugo Chávez. "Chávez é e sempre será um homem muito importante para a minha vida. Sinto muita dor. Chávez tinha que continuar e prosseguir com seu projeto", afirmou ao Correio Dahyra Parra, uma estudante de agronomia de 19 anos procedente da comunidade de 7 de Abril, em Caracas. Aos poucos, ela se empolga para falar sobre seu comandante. Desenrola um pôster e o exibe à reportagem. "Hasta la victoria siempre, comandante Chávez". A frase está estampada sobre a fotografia de um Chávez sorridente.
De família "100% revolucionária", Dahyra decidiu ir até a Academia Militar para representar a família. "Minha mamãe está com a saúde delicada, minha avó também. A juventude mostra ao presidente amor, carinho, fé, confiança e segurança", declarou. De acordo com ela, Chávez ajudou muitas pessoas de sua comuna. "Não vim aqui com raiva, porque sei que todos morreremos um dia", disse. Ela pôde estar diante do corpo do líder bolivariano na noite de quarta-feira. "Derramei uma lágrima sincera", desabafou. Dahyra aposta que a Revolução Bolivariana prosseguirá, mesmo sem seu ideólogo. "Ela está em cada um de nós."
Enquanto entrevistava Dahyra, um casal passou por nós com os dois filhos. O menor deles tem apenas 2 meses de idade. O outro completou 1 ano e meio. "Nós chegamos de manhã, mas não pudemos ver o presidente. Ao ver o povo, era como se tivéssemos visto Chávez", afirmou César Hernández, 31 anos. "Para mim, Chávez é o maior sentimento que existe no venezuelano. Agora mesmo, estou chamando o meu país de República Bolivariana Chavista de Venezuela. Eu chorei, porque é um sentimento de amor", acrescentou. César elogia a decisão, anunciada pelo vice-presidente Nicolás Maduro, de embalsamar o corpo de Chávez. "Gostei, pois Chávez conseguiu fazer o mesmo que Simón Bolívar: a união entre os povos. Nós, bolivarianos ou não, somos todos tratados como irmãos. Chávez poderia ser sepultado junto a Bolívar", defende. Emiliano, o filho mais velho, usa um conjunto de moleton com as cores da bandeira da Venezuela -- o mesmo que tantas vezes foi ostentado por Chávez.
Carolina Hernández, 62 anos, já estava há quase cinco horas na fila para ver o corpo de Chávez. "Eu queria ter me despedido dele antes que se fosse. Chávez foi um grande presidente, sabe? Ele lutou muito por esse país", comentou. Na opinião dela, os chavistas precisam continuar no poder, a fim de preservar o ideal bolivariano. "Se outras pessoas chegarem ao poder, tudo se perderá", preocupa-se. Com a tradicional boina sobre a cabeça, o cozinheiro Cruz Ramón Silva, 58 anos, não esconde o orgulho ao falar do presidente morto. Os olhos brilham. "Para mim, ele foi como um irmão, um pai, um professor e um segundo Simón Bolívar. Ainda que tenha morrido, nosso presidente Chávez estará no coração de toda a Venezuela", admite. Ele vê com reservas o anúncio do embalsamamento de Chávez. "Maduro teria que consultar os pais do nosso presidente. Mas o melhor seria enterrá-lo com Simón Bolívar. Chávez o merece", sorri. Ele contou não ter pressa para ver o corpo do mandatário. "Serão mais sete dias, não é?", questiona.
Crisbel Ruíz tem apenas 9 anos, mas já mostra preocupação política. Tanto que acompanhou a mãe ao Passeo Los Próceres, na noite de quinta-feira. "Meu coração está triste porque nosso comandante faleceu. Chávez sempre nos deu tudo. Ele foi demasiadamente bom conosco", disse. Mãe e filha chegaram às 9h diante da Academia Militar e tentaram, sem sucesso, se aproximar o caixão. Garantiram que estariam ali, novamente, na sexta-feira, para dizer adeus ao presidente. "Agora que morreu, Chávez passa a ser a vida desse povo", afirmou ao Correio o músico Ángel Eduardo Mendoza, 25 anos, que também usava a mesma jaqueta estilizada com as cores da bandeira. "Chávez nos deixa todo um compromisso com o país, um amor pátrio que despertou e que não morrerá jamais." Apesar de reconhecer que nada é eterno, ele aposta que a Revolução Bolivariana vai transcender o tempo, permanecendo como uma chama viva e eterna para os venezuelanos.
Confira vídeo do enviado especial do Correio à Caracas:
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