CAIRO - Exército derrubou na noite desta quarta-feira o presidente islamita Mohamed Mursi, primeiro presidente civil eleito democraticamente no Egito, após um ano tumultuoso no poder marcado por várias crises.
Em uma primeira reação, Mursi afirmou que este "golpe de Estado é rejeitado por todos os homens livres do país", suscitando temores de uma continuação da queda de braço.
O anúncio do Exército causou uma explosão de alegria entre os opositores a Mursi que se reuniram em diversos pontos do país.
Esse desfecho dramático lembra a queda do regime de Hosni Mubarak, que foi derrubado do poder em fevereiro de 2011 após 18 dias de manifestações massivas exigindo a sua saída do poder.
Ao contrário de Mubarak, oriundo do Exército, que entregou o poder à instituição militar, desta vez o Exército afirmou que deixa o poder político nas mãos do presidente do Conselho Constitucional, Adly Mansour, até a realização de uma eleição presidencial antecipada, sem, entretanto, indicar a duração deste período de transição.
A Constituição também foi suspensa, anunciou o chefe do Exército e ministro da Defesa, general Abdel Fattah al-Sissi, em um pronunciamento transmitido pela televisão. Ele estava entre os principais líderes religiosos do país e do representante da oposição, Mohamed Elbaradei.
"Um comitê encarregado de examinar propostas de emendas à Constituição será formado", segundo o general.
Além disso, um governo de coalizão reunindo "todas as forças nacionais" e "dotado de plenos poderes" será encarregado de "gerir o período atual" de transição, acrescentou.
ElBaradei, foi a público depois do general Sissi, com quem havia negociado durante o dia, e considerou que essas medidas "atendem às aspirações do povo".
Um assessor de Mursi afirmou que o presidente havia pedido que "os egípcios resistam pacificamente a este golpe de Estado, como ele mesmo fará".
"O que fizeram é ilegal, não têm autoridade para fazer isso".
O plano para solucionar a crise foi anunciado após a expiração do ultimato que o Exército tinha dado a Mursi às 14h30 GMT (11h30 de Brasília).
Desde domingo, milhares de egípcios exigiam a saída de Mursi em manifestações em massa e sem precedentes desde a revolta que derrubou Mubarak.
Parte da população egípcia acusa o mandatário de tentar instaurar um regime autoritário em benefício da Irmandade Muçulmana, grupo do qual Mursi é oriundo.
O plano foi discutido durante o dia entre o Exército e lideranças da oposição e religiosas.
====Reforços do Exército====
Milhares de pessoas ocupavam cada centímetro da Praça Tahrir, no Cairo, exigindo a saída de Mursi. A tensão era grande, já que partidários do presidente também se manifestavam. Desde 26 de junho a violência nos choques entre os dois grupos já deixou 47 mortos e centenas de feridos.
Blindados foram posicionados na capital, bloqueando as vias que levavam às manifestações pró-Mursi.
Antes do anúncio do Exército, fontes da segurança afirmaram que Mursi e vários dirigentes da Irmandade Muçulmana tinham sido proibidos de deixar o Egito. Entre eles estava o Guia Supremo do poderoso movimento, Mohammed Badie, e seu "número 2", Khairat al-Chater.
No momento em que expirava o ultimato, o presidente egípcio convocou a formação de um "governo de coalizão e consenso" a fim de organizar as próximas eleições legislativas.
Terça-feira à noite, ele havia rejeitado do ultimato e afirmado que não se curvaria a nenhuma imposição, ressaltando a sua legitimidade adquirida por meio de uma eleição democrática.
Os Estados Unidos manifestaram nesta quarta a sua preocupação com a crise no Egito e consideraram que o discurso do presidente egípcio não tinha dado "sinais significativos" para resolver a crise em seu país.
Enquanto o Ministério do Interior egípcio advertiu que responderia firmemente a qualquer tipo de violência, em um comunicado emitido duas horas antes da expiração do ultimato imposto ao presidente, o Exército reforçou a segurança nos arredores dos prédios oficiais e pediu aos funcionários administrativos da televisão estatal que deixassem seus escritórios.
====;Mursi foi traído;====
Um grande número de egípcios protestava diante do ministério, agitando bandeiras e cantando "Egito, Egito" ou "Saia".
"Espero apenas uma coisa, que Mursi saia", afirmou Abdel Khalek Abdo, um agricultor de 56 anos vindo do delta do Nilo.
Na emblemática Praça Tahrir, dezenas de milhares de manifestantes que exigiam a renúncia do presidente ocupavam cada centímetro do local.
"Repetiu pelo menos mil vezes a palavra legitimidade, como se nós não existíssemos. A legitimidade depende do povo, que hoje protesta em todos os lados contra ele", disse Ruaya, uma manifestante de 19 anos que usava o véu islâmico.
Em outras partes do país, milhares de partidários de Mursi permaneciam reunidos na Praça Rabaa al-Adauiya, na periferia de Nasr City. "Mursi foi traído, é um golpe de Estado contra um presidente eleito", disse um deles.