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Talibã acusa Malala de campanha de difamação e promover valores "satânicos"

Homens do TTP atiraram em Malala na cabeça depois que ela se mobilizou pelo direito das meninas de irem à escola

Agência France-Presse
postado em 18/07/2013 19:28
PESHAWAR - Um comandante talibã paquistanês escreveu para Malala Yusafzai, a ativista adolescente baleada na cabeça por militantes, acusando-a de "difamá-los" e de promover valores "satânicos".

Ao mesmo tempo, pressionou-a a voltar para casa.

Em uma carta aberta divulgada na quarta-feira, Adnan Rasheed, um ex-membro da Força Aérea que se tornou membro do TTP (Tehreek-e-Taliban Pakistan), disse lamentar o ataque à Malala, mas acusou-a de promover uma "campanha de difamação" contra os militantes.

"Quando você foi atacada, foi chocante para mim", escreveu Rasheed em inglês.

"Gostaria que isso nunca tivesse acontecido e eu te avisei", afirmou, acrescentando que "os talibãs acreditam que você estava escrevendo contra eles, propositadamente, e promovendo uma campanha de difamação para denegrir seus esforços de estabeceler um sistema islâmico no (distrito ou vale do) Swat, e que seus escritos eram provocadores".



Homens do TTP atiraram em Malala, agora com 16 anos, na cabeça, em sua cidade natal de Swat em outubro passado, depois que ela se mobilizou pelo direito das meninas de irem à escola.

"... É impressionante que você estivesse gritando por educação, você e as Nações Unidas fingem que você levou um tiro por causa da educação, embora essa não seja a razão... Foi a sua propaganda, e não a educação, a questão...", completou.

"O que você está fazendo agora, você está usando sua língua a mando dos outros", insistiu.

A carta foi enviada para jornalistas no noroeste do Paquistão, e sua autenticidade foi confirmada para a AFP por um antigo membro dos Talibãs, ligado a Rasheed. Aparentemente, Malala não recebeu a carta.

As acusações de difamação presentes na carta repetiram a justificativa dada pelos talibãs quando assumiram a autoria do ataque à Malala.

"Ela sempre fala contra nós. Vamos mirar em qualquer um que fale contra o Talibã", declarou um porta-voz do TTP à AFP em outubro de 2012.

"Alertamos várias vezes para parar de falar contra o Talibã".

Rasheed acusou Malala de querer promover um sistema educacional iniciado pelos colonialistas britânicos para produzir "asiáticos no sangue mas ingleses por gosto", e disse que os estudantes deveriam estudar o Islã, e não o "curriculum satânico, ou secular".

"Eu aconselhei você a voltar para casa, a adotar a cultura islâmica e pashtun, a entrar para qualquer madrassa islâmica para mulheres perto da sua cidade, estudar e aprender o livro de Alá, a usar sua caneta para o Islã e se comprometer com a ;ummah; (comunidade) muçulmana", frisou Rasheed.

Na última sexta-feira, 12 de julho, a adolescente fez um poderoso discurso na ONU, em sua primeira aparição pública após o ataque quase fatal. Ela prometeu continuar sua luta pela educação e disse que não será silenciada pelos militantes. Malala recebeu tratamento médico na Grã-Bretanha, onde vive com a família agora.

Muitos consideraram Malala uma heroína nacional, enquanto outros criticaram-na por promover uma agenda "ocidental".

Rasheed foi condenado à morte por um ataque ao então presidente do Paquistão, general Pervez Musharraf, mas escapou da prisão em uma fuga em massa em abril do ano passado.

Ele disse ainda que, inicialmente, pretendia escrever para Malala para alertá-la sobre criticar os talibãs, quando ela começou a ficar conhecida. Ela escrevia um blog para o serviço urdu da BBC, contando a vida durante o regime talibã entre 2007-09, no Swat.

Os talibãs destruíram centenas de escolas na região noroeste, uma área na fronteira da sangrenta luta do governo contra os militantes islamitas.

Rasheed afirmou que os ataques eram necessários, porque as forças do governo usam as escolas como esconderijos e bases.

Gordon Brown, o ex-primeiro-ministro britânico que se tornou enviado especial da ONU para Educação Global e que apoiou Malala desde que ela foi baleada, respondeu à carta talibã.

"Ninguém acreditará em uma palavra do que o talibã diz sobre o direito de meninas como Malala de ir à escola, até que eles parem de queimar as escolas e de massacrar as alunas", declarou Brown.

No mês passado, militantes explodiram um ônibus que levava estudantes do sexo feminino para a cidade de Quetta, no sudoeste do Paquistão. Depois, atacaram o hospital para onde os sobreviventes foram levados. Pelos menos 25 pessoas morreram nos ataques.

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