Agência France-Presse
postado em 04/10/2013 18:40
Lagartas, ovos de mosquito, percevejos e outros manjares da antiga Tenochtitlan recuperam seu lugar no México como ingredientes principais de restaurantes de todos os níveis, que apostam em conquistar os paladares resistentes a bichos que se arrastam ou tenham antenas minúsculas."Há um ;boom; de insetos. Os luxuosos ;escamoles; - larvas comestíveis de formiga que alcançam os 100 dólares por quilo - acabam imediatamente", mas os percevejos (vegetarianos) "ainda causam muito impacto quando servidos vivos porque é assim que têm melhor sabor", declarou à AFP Daniel Ovadía, chef do exclusivo restaurante Paxia na Cidade do México.
Lagartas de fogo negras, conhecidas como ;azotadores; também fazem parte do menu, continua Ovadía, que apresenta seus pratos de forma que o comensal rememore as paisagens onde os insetos vivem.
"Estamos vivendo uma nostalgia do passado" e alguns cozinheiros tentam aproveitar esta tendência "revalorizando a terra, dando ao cliente um pedacinho" das entranhas do México, explica. "Tudo o que caminhe, voe ou se arraste vai parar na panela"
Outro representante da comida pré-hispânica, que foi relegado durante séculos ao esquecimento após a conquista espanhola, é o restaurante Chon, pioneiro no ramo há quatro décadas e um sobrevivente de outra invasão, a da ;junk food;.
O menu de Chon, situado no popular bairro La Merced, incluía anos atrás carne de leão, mas, devido à proibição da comercialização dessa carne, foi substituída pela de crocodilo.
Enquanto prepara uma fritada de ovo de galinha e ovos de mosquito, com sabor similar ao camarão, porém mais pronunciado, o chef Fortino Rojas explica sua filosofia: "Tudo o que caminhe, voe ou se arraste vai parar na panela".
Solene, ele convida a degustar esses alimentos "antes de que seus habitats se percam pelos danos ao meio ambiente".
Uma de suas criações consiste em ;escamoles;, que chama de "o caviar mexicano", com pétalas de crisântemos banhados com molho de manga.
Para "contribuir" para o reconhecimento em ascensão dos pratos com insetos, os favoritos dos imperadores astecas, Pedro Hernández inaugurou em junho um pequeno restaurante ao lado de uma loja onde vende percevejos, grandes e suculentas larvas de agave - planta da qual se faz a tequila - e grilos crocantes que são comidos assados com alho e azeite de oliva ou limão e um pouco de pimenta.
Em "La cocinita de San Juan", situada próximo do mercado de San Juan - famoso por sua extraordinária variedade de produtos - os clientes podem "provar, já pronto, o que tiverem vontade, comprar o bichinho cru e levar a receita", explica Hernández.
"Têm gosto de carne, estão deliciosos", diz, sorridente, Nicole Olivares, estudante de Medicina, ao provar pela primeira vez um ;sope; - beiju de milho muito popular no México por ser barata - com larvas de agave fritas.
O paladar mexicano se "ocidentalizou" deixando de um lado esses ingredientes que, "além de suculentos, são muito nutritivos", prossegue seu acompanhante, o professor Miguel Díaz.
"Toda a temporada de chuvas vimos comprá-los, não perdemos", diz Margarita Martín, uma dona de casa que comprava meio quilo vermes rosados de agave vivos em um mercado de San Juan.
Recomendados pela FAO contra a fome
A Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO) recomendou em um relatório publicado recentemente a ingestão de insetos para combater a fome que, segundo suas contas, afeta mais de 2 bilhões de pessoas.
No caso das crianças, os insetos podem servir como um suplemento alimentar "particularmente importante", em especial entre aqueles que sofrem de desnutrição, segundo a FAO.
De cem gramas de carne de vaca, 40% são proteínas, enquanto na mesma quantidade de grilos "ou de qualquer outro inseto", esta cifra dobra, detalhou Gabriela Jiménez, pesquisadora em ecologia de insetos da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM), a maior do país.
"Os insetos têm todos os aminoácidos indispensáveis para o ser humano e além disso, seu ciclo de vida é rápido. Um adulto médio é obtido aos dois meses de nascido e uma fêmea tem 800 filhotes", argumenta.
Jiménez confia em que os mexicanos, cujos índices de obesidade estão entre os mais elevados do mundo, optem cada vez mais por este tipo de alimentos.
"Eles não engordam. Podemos produzir farinhas de qualquer inseto", diz a especialista.
Para garantir que as refeições são seguras, explica Jiménez, os insetos "se alimentam dois dias com alface ou papel para limpá-los, o que garante ainda que não perderão os sabores que adquiriram comendo sávia, frutas, vegetais ou ramos de árvores antes de ser coletados".