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Maduro completa seis meses à frente de uma Venezuela à deriva

Ex-condutor no metrô de Caracas, Maduro costuma aparecer em fotos ao volante de um ônibus para lembrar que ele é o guia escolhido para dirigir a revolução bolivariana na era pós-Chávez

postado em 17/10/2013 18:15
De Chávez, Maduro herdou sua midiática forma de governar
Nicolás Maduro completa seis meses à frente do governo da Venezuela, marcados pela crise econômica e pela falta de comunicação com a oposição, enquanto o país se aproxima de importantes eleições municipais em um ambiente que se despolitiza após a turbulenta e ativa era de Hugo Chávez.

Ex-condutor no metrô de Caracas, Maduro costuma aparecer em fotos ao volante de um ônibus para lembrar que ele é o guia escolhido para dirigir a revolução bolivariana na era pós-Chávez. Analistas e integrantes da oposição nacional concordam em que sua liderança ainda está em construção e que sua gestão foi errática até agora.

"O governo aparece sem um propósito claro, a não ser manter vivo o legado de Chávez, mas não se percebe propósitos além disso", explica à AFP Teodoro Petkoff, ex-guerrilheiro comunista e duas vezes candidato à Presidência.

Maduro iniciou seu mandato recebendo críticas pela maneira como administrou a doença e a morte de Chávez. Nos últimos meses, as divergências no chavismo não permitiram a ele concretizar seus anúncios de flexibilização do controle de câmbio, base de todos os desequilíbrios econômicos, entre eles, a alta inflação e o desabastecimento.

"O chavismo ficou preso em uma armadilha: criou um mecanismo de poder econômico que sabe que é disfuncional, mas do qual sabe que não é fácil prescindir, porque o risco pode ser maior", explica Petkoff.

"As políticas econômicas de Chávez tinham sentido durante seu governo, mas já estavam dando indicação da necessidade de serem reformuladas. Maduro as manteve sem ter uma clareza em relação à ação", explica o analista Nicmer Evans.



De Chávez, Maduro herdou sua midiática forma de governar e sua atitude de combate permanente contra a oposição e contra os Estados Unidos, principal comprador do petróleo venezuelano. Ele começou o governo estendendo a mão aos EUA, mas já acusou Washington de tentar matá-lo após atacar a Síria.

Os analistas reconhecem, porém, a abertura do atual governo em relação ao setor privado e sua luta contra a violência e contra a corrupção - assunto tabu para Chávez. A campanha já deu seus primeiros frutos, com a detenção de dezenas de funcionários.

"Se essa situação (de falta de rumo) se mantiver, pode ser que, em médio prazo, crie-se no entorno de Maduro uma situação de conflito e que o próprio chavismo popular comece a questionar qual o significado dessa liderança", acrescenta Petkoff.

Abertura versus guerra econômica

A oposição e os analistas apontam a necessidade de desvalorizar, mais uma vez, o bolívar (o ajuste anterior foi em fevereiro), desmantelar o controle de preços e de câmbio, ou de acabar com as expropriações de terras. Já Maduro culpa o que define como "conjuntura econômica especial", a "guerra econômica", deflagrada de fora do país, e a "corrupção".

Para combater ambas as frentes, Maduro pediu à Assembleia Nacional uma lei habilitante para ter poderes especiais durante um ano e governar por decreto. A oposição denuncia que os "superpoderes" escondem o propósito de uma caça às bruxas.

O pedido de superpoderes "é uma ofensiva estratégica que pode ter dois planos: não apenas o da oposição, mas também o de dissuadir setores internos do chavismo para consolidar a liderança porta adentro", disse o cientista político John Magdaleno.

A oposição também seguiu seu caminho nestes meses, apesar de ter perdido exposição midiática após a mudança editorial e de direção da Globovisión.

Fortalecida nas últimas eleições de Chávez em outubro de 2012, após anos de desunião e de ter sido praticamente aniquilada, a oposição não reconhece a vitória de Maduro. Derrotado por uma estreita margem, o jovem líder Henrique Capriles recorreu à Justiça dentro e fora do país, na tentativa de impugnar o resultado das urnas.

"A oposição cresceu mais pelos erros de Maduro do que por seus próprios acertos, pois ainda não tem um projeto definido de país", avalia Evans.

Uma oportunidade para medir forças será nas próximas eleições municipais de 8 de dezembro, vistas por muitos como um plebiscito da gestão de Maduro. Nas pesquisas de opinião, o presidente aparece como o principal responsável pela situação econômica do país.

Se ganhar, "Maduro estará legitimado, fortalecido e aumentará seu controle interno no chavismo", escreveu o presidente do Datanálisis, Luis Vicente León, no jornal "El Universal".

Tanto o chavismo quanto a oposição deverão enfrentar a despolitização que está ganhando cada vez mais espaço na vida dos venezuelanos. É o que mostra a baixa participação popular nos últimos comícios, em um país que Chávez polarizou com infinitas passeatas e "contra-passeatas".

"O país continua polarizado, porque ainda não há uma terceira opção que rompa a polarização entre os dois grupos (chavistas e opositores). O que existe, sim, é despolitização. As pessoas priorizam o tema econômico sobre o político; outros escolhem não se pronunciar, ou se mobilizar", completou Evans.

"Somente depois das (eleições) municipais é que se verá que nível de organização os insatisfeitos com o governo e com a oposição têm", concluiu o analista.

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