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Chavismo pressiona oposição com 'governos paralelos' nos estados

Seus presidentes são os três ex-candidatos chavistas derrotados nas eleições regionais de dezembro passado

Agência France-Presse
postado em 05/11/2013 19:18
Caracas - O chavismo criou entidades especiais que funcionam como "governos paralelos" nos estados venezuelanos controlados pela oposição e que, a um mês das eleições para prefeito, contam com orçamentos milionários para executar obras públicas com fins eleitoreiros - disseram analistas consultados pela AFP.

Previstas na lei, essas corporações foram criadas entre março e abril passado nos estados de Miranda (norte) - governado pelo líder da oposição Henrique Capriles -, Lara (noroeste) e Amazonas (sul). Seus presidentes são os três ex-candidatos chavistas derrotados nas eleições regionais de dezembro passado.

"O governo busca enfraquecer a imagem, a autoridade e os recursos financeiros disponíveis para levar adiante a gestão da autoridade eleita e funda uma gestão paralela, elevando o nível de rivalidade entre as duas gestões, porque, na prática, convertem-se em governos paralelos", explica à AFP o cientista político John Magdaleno.

Derrotado por Capriles em Miranda, Elías Jaua acumula sua função de chanceler venezuelano com a de presidente da CorpoMiranda.

"Partidarização institucional"

[SAIBAMAIS]Os venezuelanos foram convocados a comparecer às urnas para eleger prefeitos e vereadores em eleições consideradas pelos analistas e pela oposição como uma espécie de plebiscito sobre o governo de Nicolás Maduro. O país passa por uma grave crise econômica, com alta inflação e desabastecimento.

O presidente aparece praticamente todos os dias na televisão oficial. Em muitas dessas transmissões, inaugura escolas, estradas ou postos de saúde com os presidentes dessas corporações, sem convidar os governadores da oposição. O chavismo acusa os opositores de terem abandonado seus estados.

"Nós viemos governar diretamente. Construir fábricas para que o povo de Miranda tenha emprego, atender aos temas da saúde, da educação", disse o presidente, em um ataque direto a Capriles, chamado de "desgovernador" pelo governo de Maduro.

Depois da derrota nas urnas, Capriles continuou percorrendo o país em atividades políticas e, agora, é chefe de campanha da oposição para o pleito de 8 de dezembro para prefeitos e vereadores.

Diante da "ausência" de Capriles, o governo apresenta Jaua como o "protetor de Miranda". "É muito tropical isso de se ocupar da política externa da Venezuela e das políticas locais de Miranda ao mesmo tempo", comentou Magdaleno, referindo-se a Jaua.

"Ao chavismo não resta outra coisa a não ser confrontá-lo (Capriles) publicamente e procurar mudar o clima da opinião pública do estado (Miranda)" para as eleições municipais, acrescentou.

Já o cientista político e professor universitário Nicmer Evans identifica um problema de "partidarização das instituições para gerar proselitismo político em momentos de conjunturas eleitorais com fundos do Estado".

"Ali, está o crime, porque ali há uma irregularidade, não na criação das corporações (...) Há um abuso do ponto de vista da institucionalidade, que não pode ser utilizada para isso", diz à AFP.

Os antecedentes dessas entidades especiais remontam aos anos 1960, quando é fundada a Corporação Venezuelana de Guayana (CVG), no sul do país. O objetivo era e continua sendo a supervisão e coordenação da produção das empresas básicas e de seus dividendos.

No final dos anos 1980, com o processo de descentralização na Venezuela, diferentes corporações foram se formando e dividindo o território, subordinadas ao Ministério do Planejamento.

Mais uma surgiu depois que o governo do falecido Hugo Chávez perdeu a prefeitura metropolitana de Caracas e colocou Jacqueline Farías como chefe de governo do Distrito Capital. Essa instância foi criada como o "primeiro teste para conseguir gestões paralelas, onde o governo não tem o controle", explicou Magdaleno.

Diferenças orçamentárias

Capriles denuncia que "o dinheiro destinado à CorpoMiranda não é para resolver problemas, mas para politicagem". Segundo ele, esses recursos são maiores até do que o aprovado para o próprio governo de Miranda em 2013, que chegou a 4,074 bilhões de bolívares (US$ 646 milhões no câmbio oficial). Esse montante representa 8,46% do orçamento da nação.

"A ;Corpomatraca; (;matraca; é uma gíria para corrupção na Venezuela) recebe seis vezes mais créditos adicionais do que recebeu Miranda. Por acaso a receita com o petróleo é do PSUV (partido da situação)? Ou eles acham que os venezuelanos vão se se ajoelhar, ou que estamos à venda?", questionou.

Em sua conta no Twitter, Jaua escreveu que o orçamento da CorpoMiranda "não chega a 1,5 bilhão (de bolívares)".

"E estamos fazendo milagres para nosso povo, com eficiência e honestidade", completou. Na Venezuela, os estados não têm autonomia para emitir dívida e trabalham com os recursos destinados pelo governo central em função da receita com petróleo - praticamente o único produto de exportação nesse país de 30 milhões de pessoas.

No Amazonas, o governador opositor Liborio Guarulla denuncia a criação da CorpoAmazonas "como a maneira que eles (o governo federal) têm de ofuscar as conquistas do governo (estadual)".

Ao contrário do que acontece com Jaua, em Miranda, Guarulla aponta que Nicia Maldonado (presidente da corporação) "não inaugura nada no estado".

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