O ex-primeiro-ministro Silvio Berlusconi, líder indiscutível da direita italiana há duas décadas, foi expulso do Senado nesta quarta-feira (27/11) , uma decisão histórica que representa a perda de sua imunidade parlamentar.
O magnata, que havia sido condenado a quatro anos de prisão por fraude fiscal, mostrou-se desafiante, enquanto o Senado fazia a votação.
"É um dia de luto" para a Itália e sua democracia, afirmou Berlusconi diante de centenas de manifestantes reunidos em Roma no final da tarde.
Com um complexo sistema, que incluiu nove votações a emendas para tentar salvá-lo, a plenária da Casa, com 321 senadores, aprovou a retirada de sua vaga, após a condenação por parte do Tribunal Superior a quatro anos de prisão por fraude fiscal pelo caso Mediaset. A sanção está prevista em uma lei de 2012.
[SAIBAMAIS]"Atropelaram a democracia, os direitos e a liberdade", declarou, visivelmente emocionado, ao prometer que continuará "lutando" por seus ideais fora do Parlamento.
"É uma decisão que convida a vingança", afirmou o magnata, que não poderá ser candidato nas eleições italianas nem europeias nos próximos seis anos - o que pode gerar tensões políticas. "Il Cavaliere" acusou a centro-esquerda de ter "pisoteado a lei" ao "aplicar de forma retroativa, a fatos ocorridos há 30 anos, uma lei aprovada no ano passado".
"Fui submetido a 57 processos, uma verdadeira perseguição que nenhum líder político teve de enfrentar", gritou Berlusconi. A moção contou com os votos necessários para expulsar do Parlamento o polêmico político e empresário. Vários julgamentos esperam por ele, incluindo casos por suborno e prostituição de menores.
O resultado da votação era esperado, já que a esquerda e o Movimento Cinco Estrelas do comediante Beppe Grillo haviam anunciado uma votação conjunta em favor da expulsão de "Il Cavaliere", de 77 anos.
"O objetivo é eliminar Berlusconi, não o perdoem por ter impedido a esquerda de se apropriar do país", sentenciou a senadora Manuela Ripetti, da Forza Italia. Sua expulsão não afetará a estabilidade do governo de coalizão de esquerda-direita liderado por Enrico Letta. Na véspera, ele aprovou sem problemas a lei orçamentária para 2014, apesar de Berlusconi e seus parlamentares terem passado para a oposição.
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O objetivo dessa estratégia era impedir a votação do Senado, o que não teve êxito. O magnata prometeu exercer uma oposição dura ao governo de coalizão por meio de seu império de comunicação, que conta com vários canais de televisão, jornais, revistas e editoras.
Manifestações em Roma
Milhares de manifestantes se reuniram em frente à residência de Berlusconi no coração de Roma, na mesma hora em que o Senado votava sua expulsão.
"Berlusconi, mártir da liberdade", dizia um dos cartazes carregados por vários jovens que levavam bandeiras da Itália e cantavam o hino do Forza Italia.
"Il Cavaliere", que não assistiu ao debate no Senado para evitar um dos momentos mais difíceis e humilhantes de sua carreira parlamentar, falou de um palco montado na frente de seu palácio, enquanto três telões eram instalados na praça Veneza, a poucos metros de sua casa.
Fiel a seu estilo, Berlusconi anunciou que não vai se aposentar e que continuará sua carreira política como líder dos quase 10 milhões de italianos que o elegeram e o apoiam. "É amado por milhões de italianos e continuará a ser amado por seus ideais e posições", clamou o senador Ciro Falanga na plenária do Senado.
Berlusconi pretende se manter na briga política mesmo sem fazer parte do Parlamento, atuando como já faz o líder anti-sistema do Movimento Cinco Estrelas, o comediante Grillo, e o popular e influente líder do Partido Democrático, Matteo Renzi, prefeito de Florença. O magnata, que insiste em sua inocência, ataca sem cessar os que buscam eliminá-lo politicamente, a magistratura e a esquerda.
Para Alessandra Mussolini, neta do ditador Benito, senadora fiel a "Il Cavaliere", votou contra sua expulsão por "ética, coração e humanidade", afirmou.
O Partido Democrático acusa Berlusconi de querer "incendiar" a Itália, levando a um movimento espontâneo de protesto por parte dos "antiberlusconianos". O chamado "Povo Violeta" se reuniu em frente à sede do Senado para festejar o fim de uma era, marcada pelo estilo populista - e às vezes irreverente de "Il Cavaliere" - e por uma série de escândalos.
"Conseguimos acabar com 20 anos de fascismo. Podemos acabar com 20 anos de berlusconismo", afirmou Giulio, de 40 anos, em entrevista à AFP-TV. "Abre-se uma nova era", disse Francesca, com otimismo.
Ao deixar o Parlamento, "Il Caimano" (do italiano "o jacaré"), como a esquerda costuma chamá-lo, poderá ser detido por ordem dos juízes que já abriram outros processos contra ele.
"Uma hipótese absurda", garantiu Franco Coppi, um de seus advogados. "Na sua idade, não se pede a detenção na prisão", disse o juiz anticorrupção Piercamillo Davigo.