Beirute - Pelo menos três milhões de sírios fugiram dos ataques e dos bombardeios da guerra civil, e a maioria vai se amontoando em paupérrimos campos de refugiados, ou arriscando suas vidas na tentativa de chegar à Europa pelo mar.
No Líbano, famílias inteiras de sírios sobrevivem em barracas montadas no meio de acampamentos que, em breve, estarão cobertos de neve. No Egito, eles fogem do controle das autoridades por medo de serem expulsos do país.
Os poucos que tiveram mais sorte conseguiram asilo na Suécia, ou na Alemanha, mas, para muitos, a busca por um futuro melhor acabou nos abrigos superlotados da Bulgária, país mais pobre da União Europeia (UE).
Alguns tentam o mar, a bordo de embarcações velhas com outros sírios e africanos, buscando o destino possível - seja Europa, Ásia, ou Austrália - e gastam milhares de dólares pela travessia feita por intermédio de traficantes inescrupulosos.
As ONGs temem que os refugiados continuem chegando em massa à Turquia, ao Iraque, ou à Jordânia, no momento em que as doações vêm diminuindo, apesar dos preparativos para a Conferência de Paz em Genebra, em janeiro, patrocinada pela ONU.
A tragédia síria tem um impacto devastador no vizinho Líbano, que já recebeu 825 mil refugiados, oficialmente, embora se calcule que esse número passe de um milhão. Seria pelo menos um sírio para cada quatro libaneses no país. A fronteira está aberta, mas o governo libanês se recusou a criar acampamentos de refugiados. Com isso, proliferam pequenos assentamentos precários, principalmente, no vale de Bekaa (leste).
Falta de recursos
Os miseráveis barracos são construídos com restos de sacos de lixo sustentados por pedaços de madeira, em um solo que costuma ficar completamente enlameado quando chove.
"O inverno aqui é terrível", diz Fatima Hahnun, da província de Idleb (noroeste da Síria). "No ano passado, o solo estava completamente inundado, e não conseguíamos sair da barraca sem que a água e a lama chegassem até os joelhos", lembra.
"As doações não aumentaram de maneira proporcional ao número de refugiados", lamenta a porta-voz do Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (Acnur), Roberta Russo.
O sistema educacional não consegue absorver todos os jovens, e mais de 200 mil estão fora da escola. Na fronteira sul da Síria, a Jordânia está construindo campos de refugiados como o de Zaatari, em pleno deserto. Lá, cerca de 130 mil sírios ficarão sob um sol inclemente no verão e verdadeiros dilúvios no inverno.
"A única solução é voltar para a Síria, já que o acampamento aqui não é nada além de uma imensa prisão ", afirma Hasan Nashwa. Em agosto, pelo menos 50 mil sírios cruzaram a fronteira com o Iraque rumo à região autônoma curda, ao norte.
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Na Turquia, mais de 200 mil sírios vivem em acampamentos perto da fronteira nordeste da Síria, e outros 400 mil estão espalhados por todo o país. Em Istambul, famílias inteiras acampam em parques e jardins públicos.
As autoridades egípcias multiplicam as detenções de sírios desde o golpe que levou à queda do então presidente islâmico Mohamed Mursi, em julho de 2013. Mursi apoiou a rebelião contra o regime de Bashar al-Assad. Alguns países europeus se mostraram mais hospitaleiros do que outros. A Suécia disse estar disposta a receber sírios que solicitarem asilo político.
A família Hodel conseguiu comprar passaportes belgas falsos para chegar à Suécia e, para o pai, Khaled, os riscos valeram a pena. "Queremos viver aqui e obter a nacionalidade sueca", afirmou, contando que sonha que sua filha estude Medicina.
Em geral, contudo, a Europa foi uma desilusão para os milhares de sírios que pararam sua viagem na Bulgária. Seus três centros de acolhida ficaram saturados rapidamente, e os últimos que chegam têm de se alojar em prédios que já foram escolas, ou em campos militares desativados.
"Se soubéssemos o que nos esperava aqui, nunca teríamos vindo", desabafa Abdel Khalal Bonja, no acampamento de Harmanli.
Boa parte dos que embarcaram rumo à Europa tiveram um final trágico, como aconteceu em outubro passado ao longo das costas italiana e maltesa. Esses recentes naufrágios sensibilizaram muitos países na Europa, mas, diante da persistente crise econômica no Velho Continente, a dúvida sobre abrir as portas aos refugiados prevalece sobre a solidariedade e as questões humanitárias.