"As discussões não foram construtivas hoje por causa da atitude do regime de querer desviar as negociações que deveriam ter como foco a aplicação de Genebra I", texto elaborado em junho de 2012 pelas grandes potências, indicou Rima Fleyhan, membro da delegação da oposição.
"A delegação do regime quis mudar de assunto falando de terrorismo", informou.
Já uma fonte ligada ao regime disse à AFP que "a oposição rejeitou o plano de ação (apresentado por Damasco) e pediu para que fosse abordada exclusivamente a transição governamental".
Apesar do impasse, as delegações do regime sírio e da oposição afirmaram que estão determinadas a continuar a negociar.
"Nós não iremos deixar a mesa de negociações. Nós iremos continuar a discutir", afirmou à imprensa Fayçal Moqdad, vice-ministro sírio das Relações Exteriores, quando questionado sobre uma possível desistência. "Estamos confiantes e vamos permanecer aqui até que o objetivo desta conferência seja alcançado, que é a formação de um órgão governamental de transição", indicou, por sua vez, Rima Fleyhane.
Reunidos pelo terceiro dia consecutivo na sede da ONU, em Genebra, os negociadores deveriam discutir temas políticos, após dois dias focados nos problemas dos civis atacados em Homs e dos milhares de prisioneiros e desaparecidos do conflito sírio. Frente ao impasse desta segunda-feira, o mediador da ONU e da Liga Árabe, Lakhdar Brahimi, suspendeu as discussões.
[SAIBAMAIS]As duas partes divergem sobre a interpretação deste texto, escrito em junho de 2012 pelas grandes potências. A oposição, que luta desde março de 2011 contra o regime de Damasco, considera que Genebra I é sinônimo de Governo de transição e saída de Assad, no poder desde 2000. Já o regime considera que abre caminho para um governo de união nacional ampliado. O plano de ação apresentado pelo regime sírio estabelece cinco pontos, particularmente a respeito da "soberania e independência da Síria", da "rejeição a qualquer ingerência externa" e "da preservação de todas as instituições do Estado".
Há meses, a transferência do poder é a "linha vermelha" das negociações para as duas delegações.
Anunciado no comunicado final de "Genebra I", pacientemente escrito pelos russos e americanos em uma noite de junho de 2012, o princípio do "órgão de transição governamental" divide partidários e inimigos do presidente Assad. Ele opõe russos e iranianos, padrinhos do Governo sírio, aos ocidentais e as monarquias do Golfo, que apoiam a oposição.
Desde sábado, as duas delegações discutem por meio de Brahimi, evitando até então os temas políticos e concentrando-se em "temas humanitários".
Oposição espera "garantias" em Homs
Lakhdar Brahimi obteve do regime a promessa de deixar que mulheres e crianças, bloqueadas há meses no centro de Homs, abandonem a cidade. Mas o anúncio foi recebido com ceticismo nos quartéis-generais rebeldes de Homs, onde a oposição exige garantias de que os civis não serão detidos pelo regime ao deixarem a cidade.
A ONU também espera que os comboios de ajuda humanitária possam entrar nos bairros rebeldes de Homs. Considerada frequentemente o berço da revolução dos protestos, Homs pagou caro por sua oposição a Bashar al-Assad. Os bairros rebeldes são atacados desde junho de 2012 pelo Exército, que os bombardeia regularmente, e milhares de sírios vivem nesses locais em condições chocantes, sem alimentos ou remédios.
Segundo ativistas nas frentes de batalha, quase a metade das cerca de 500 mulheres e crianças que ainda estão em Homs aceitaram deixar a cidade. "Cerca de 200 mulheres e crianças, que sofrem em razão da falta de alimentos e de medicamentos provocada pelo cerco do Exército, estão prontas para deixar a cidade", declarou à AFP Abu Ziad, que está na parte cercada de Homs, no centro da Síria. "Mas aqueles que estão prontos para partir só o farão se houver garantias de que não serão detidos pelo regime", ressaltou.
O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) indicou que "nenhuma medida" foi tomada até o momento pelo governo de Damasco para permitir a passagem de comboios humanitários ou autorizar a saída de mulheres e crianças da região.
Segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH), cerca de 3.000 pessoas estão cercadas nas zonas rebeldes de Homs. A comida e os medicamentos começam a faltar, agravando ainda mais a crise humanitária.
Segundo carregamento de armas químicas retirado da Síria
Enquanto isso, o segundo carregamento de agentes químicos do regime sírio foi retirado da Síria para ser destruído, como está previsto no acordo com o regime, informou a missão conjunta ONU-Organização para a Proibição de Armas Químicas (Opaq) em um comunicado. "Hoje registramos um carregamento de armamento químico militar da Síria. A missão conjunta constatou seu embarque no porto de Lattakia em embarcações dinamarquesas e norueguesas", afirma o texto.
O primeiro carregamento de armas químicas deixou a Síria no dia 7 de janeiro. A evacuação dos agentes mais perigosos é a primeira etapa do plano de desmantelamento do arsenal químico do regime.