"Alvaro Uribe está por trás disso, não esqueçam que Alvaro Uribe Vélez é o inimigo público número um da paz na Colômbia", afirmou à imprensa Iván Márquez, chefe negociador das Farc, nos diálogos de paz com o governo colombiano em Havana.
Nas véspera, dois chefes de Inteligência do Exército da Colômbia foram substituídos em suas funções após denúncias na imprensa local sobre supostos grampos ilegais na equipe negociadora do governo nos diálogos de paz com as Farc, informou o ministro colombiano da Defesa, Juan Carlos Pinzón.
Antes, o presidente Juan Manuel Santos classificou o caso como uma tentativa de "sabotar" as negociações com a guerrilha das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc).
Na última terça-feira (5/2), Santos mandou investigar supostas escutas ilegais em sua equipe de negociação, reveladas pela revista Semana, de circulação nacional.
A revista fez uma denúncia em sua edição eletrônica, segundo a qual setores do Exército teriam instalado desde 2012 um
escritório para interceptar ilegalmente comunicações de várias personalidades colombianas, entre elas os negociadores que participam das conversas de paz com as Farc em Havana - Humberto de la Calle, Sergio Jaramillo e Alejandro Eder.
Santos afirmou que a situação é "totalmente inaceitável" e que era uma tentativa de sabotagem do processo de paz com as Farc, que tentam por um fim a uma guerra que já dura meio século e é o último conflito armado da América Latina.
Divisões no poder
"Esse episódio mostra que nos setores institucionais ainda há facções e ideologias. Não são setores grandes dentro da máquina pública, mas estão bem posicionados", disse à AFP o analista Ariel Avila, da Fundação Paz e Desenvolvimento, especializada no conflito colombiano.
Ávila acredita que as escutas "não põem em perigo o processo de paz, mas podem causar danos".
Tanto as Farc quanto Santos afirmaram que as escutas tentam sabotar o processo de paz, iniciado em 19 de novembro de 2012.
Santos, que tentará a reeleição em maio, advertiu que "forças obscuras" buscam "sabotar" o processo de paz com as Farc.
Dois chefes da inteligência militar foram suspensos de seus cargos nesta terça-feira pelo caso, informou o ministro da Defesa, Juan Carlos Pinzón, que também disse que fará investigações dentro do exército, além de uma investigação que já foi aberta pela Procuradoria.
Paralelamente, um grupo de líderes de esquerda, entre eles o prefeito de Bogotá, Gustavo Petro, e ativistas de direitos humanos denunciaram ter recebido ameaças de morte do grupo Águias Negras, integrado por alguns ex-paramilitares de direita.
Uribe bem informado
"É claro que Uribe está recebendo informações das forças militares, segue tendo um grande acesso. Mas daí a afirmar que ele está por trás ou financia tudo isso, já não me atrevo", declarou o analista Ariel Avila.
Iván Márquez afirmou que "esse é um assunto que o governo terá que explicar ao país" e "atuar de maneira que realmente não deixe dúvidas sobre a origem e a intenção deste tipo de atividade, que parecem querer atingir um propósito superior, que é a paz na Colômbia".
A delegação colombiana nas negociações de paz se manteve em silêncio sobre a situação, e não deu declarações à imprensa.
Na terça-feira, um líder da guerrilha que pediu para não ser identificado disse à AFP que o grupo de militares envolvido nas escutas estava "vinculado ao uribismo", em alusão ao grupo simpatizante do ex-presidente colombiano Álvaro Uribe, grande crítico do processo de paz que, durante seus dois mandatos (2002-2010) travou uma guerra sem precedentes contra a guerrilha.
As delegações do governo e das Farc já entraram em acordo, até o momento, sobre o desenvolvimento rural e a participação política, e atualmente debatem sobre drogas ilícitas. Na agenda de discussões aparecem também os pontos de reparação às vítimas e o abandono às armas, assim como o mecanismo para referendar um eventual acordo de paz.
Santos dissolveu em novembro de 2011 o Departamento Administrativo de Segurança (DAS), a agência de inteligência da Colômbia criada na década de 1950, que nos últimos anos se viu em meio a graves escândalos de escutas ilegais e perseguições a juízes, opositores e jornalistas.