postado em 03/04/2014 15:59
Kiev - A Rússia negou nesta quinta-feira as acusações da Ucrânia de que seus serviços secretos estiveram envolvidos na morte de cerca de 90 pessoas durante as manifestações de fevereiro, que provocaram a queda do regime pró-russo em Kiev.A Rússia cancelou nesta mesma quinta o último desconto concedido à Ucrânia no fornecimento de gás, uma medida de pressão contra as novas autoridades de Kiev, que agora terá que pagar 485 dólares por 1.000 metros cúbicos, um dos preços mais altos aplicados por Moscou a países europeus.
"Agentes do FSB (os serviços secretos russos) participaram do planejamento e da execução da suposta operação antiterrorista" durante as manifestações da Maidan, a Praça da Independência no centro da capital, afirmou o novo chefe dos serviços de segurança ucranianos, Valentin Nalivaichenko, na apresentação dos resultados preliminares da investigação sobre os tiros disparados por franco-atiradores.
O registros de 18 a 20 de fevereiro, quando ocorreram os ataques, chegou a 90 mortes.
O então presidente pró-russo Viktor "Yanukovytch deu a ordem criminosa de disparar contra os manifestantes entre 18 e 20 de fevereiro", acrescentou, acompanhado pelo ministro do Interior interino da Ucrânia, Arsen Avakov.
Essa versão "contradiz as muitas provas que demonstram o contrário", reagiu o ministro russo das Relações Exteriores, Serguei Lavrov, em uma coletiva de imprensa.
Lavrov citou, em particular, uma conversa telefônica entre a chefe da diplomacia europeia, Catherine Ashton, o ministro estoniano das Relações Exteriores, Urmas Paet, gravada clandestinamente e na qual se falava de um possível envolvimento da oposição ucraniana nos fatos.
"A verdade deve ser estabelecida de forma transparente", acrescentou Lavrov.O FSB também negou qualquer envolvimento.
O Ministério Público ucraniano anunciou a prisão de onze integrantes das forças especiais Berkut e de seus chefes por seu envolvimento nos distúrbios.
- Yanukovytch "será processado"-
O primeiro-ministro ucraniano, Arseni Yatseniuk, declarou à BBC que as autoridades vão processar Yanukovytch, sobre quem já pesa uma ordem de busca e captura por assassinatos em massa.
O ex-presidente, refugiado na Rússia, já havia desmentido na quarta qualquer responsabilidade, em declarações a uma rede de televisão russa.
Depois de três meses de violentas manifestações contra o governo em Kiev, os confrontos do fim de fevereiro levaram o Parlamento ucraniano a derrubar do poder o presidente pró-russo e seu governo.
Em muitos casos, as vítimas morreram atingidas por tiros aparentemente disparados por franco-atiradores. As duas partes se acusam mutuamente de terem provocado a violência, mas até agora a investigação dos incidentes não havia sido levada adiante.
Segundo as autoridades russas, foram os grupos nacionalistas ucranianos os primeiros a atirar contra a polícia, em uma tentativa de atribuir a violência ao presidente Yanukovytch e a seus aliados de Moscou.
[SAIBAMAIS]Os confrontos colocaram em evidência as divisões deste país de 46 milhões de habitantes entre as regiões favoráveis a Moscou (principalmente no leste e no sul) e os partidários da aproximação entre o Ocidente e a União Europeia.
Além do aumento do preço do gás, Moscou exigiu que Kiev pague o quanto antes sua dívida energética, avaliada em 2,2 bilhões de dólares, no momento em que a economia da ex-república soviética está em crise.
O ministro ucraniano da Energia, Yuri Prodan, considerou o novo preço do gás "inaceitável para a Ucrânia, um preço político".
Para tentar ajudar Kiev, o Parlamento Europeu aprovou nesta quinta-feira a quase anulação das taxas alfandegárias para a exportação de produtos ucranianos à União Europeia.
As novas acusações do governo de Kiev podem intensificar ainda mais a tensão entre a Rússia e os países ocidentais.
A Agência Europeia de Segurança Aérea recomendou que as companhias evitem o espaço aéreo da Crimeia devido a graves riscos para a segurança.
Na quarta-feira o secretário-geral da Otan, Anders Fogh Rasmussen, classificou de "extremamente preocupante" a presença em massa de tropas na fronteira ucraniana.
Lavrov respondeu nesta quinta-feira à Otan pedindo explicações pelo reforço de sua presença na Europa Oriental e garantiu que os movimentos de tropas russas respeitam os acordos em vigor.
Após a destituição de Yanukovytch em fevereiro, a península da Crimeia, onde a maioria de seus dois milhões de habitantes é de origem e língua russas, votou em um referendo sua integração à Rússia, confirmada pouco depois pelo Parlamento e pelo governo de Moscou.