Agência France-Presse
postado em 10/04/2014 14:17
Moscou - O presidente russo, Vladimir Putin, quer provocar o caos nas regiões de língua russa do leste da Ucrânia para desacreditar o governo pró-europeu de Kiev, mas não tem a intenção de realizar uma intervenção militar, segundo os especialistas.
O súbito aumento de tensão nos últimos dias nas cidades de Lugansk, Donetsk e Kharkiv, onde militares pró-russos tomaram vários edifícios oficiais, aumentam os temores de uma repetição do que ocorreu na Crimeia.
Esta península ucraniana do Mar Negro foi anexada à Rússia em março, depois que homens armados pró-russos e sem uniformes oficiais tomaram o controle da região e foi realizado um referendo de anexação, considerado ilegal pelo Ocidente.
Mas, segundo os especialistas, a situação atual no leste da Ucrânia é diferente, por um lado porque os Estados Unidos e a União Europeia ameaçam com sanções, e por outro porque a população não é favorável à anexação.
"Uma intervenção militar seria totalmente absurda. Nossos líderes já entenderam que o risco é muito alto, que há a possibilidade de duras sanções econômicas", explicou à AFP o analista russo Alexei Malachenko, do Centro Carnegie.
Após a anexação da Crimeia, os Estados Unidos e a Rússia reagiram adotando sanções contra autoridades russas e ucranianas pró-russas. E o presidente americano, Barack Obama, falou da possibilidade de sancionar "setores chave" da economia russa em caso de aumento da escalada.
Criar instabilidade
Por sua vez, segundo o analista Konstantin Kalachev, "não há consenso" sobre a integração à Rússia entre os habitantes destas regiões industriais de língua russa do leste da Ucrânia.
Apenas 30%, segundo as pesquisas, querem se separar da Ucrânia para formar parte da Rússia, um número que está muito distante da unanimidade ocorrida na Crimeia, segundo Kalachev.
[SAIBAMAIS]Uma análise compartilhada pelo jornal econômico Vedomosti, que lembra que estas regiões não estão isoladas geograficamente nem têm uma base militar russa, como era o caso na Crimeia.
"Se a política do Kremlin com a Ucrânia é racional, uma intervenção no sudeste é inútil e não tem nenhum interesse. A situação social e o nível de apoio não têm nada a ver com o que se viu na Crimeia, o risco é muito mais alto de todos os pontos de vista", afirma o jornal em um editorial.
A política atual do Kremlin consiste em "apoiar e controlar a instabilidade no leste da Ucrânia para colocar em xeque a legitimidade das eleições presidenciais e tentar influenciar nas reformas constitucionais" desta ex-república soviética, independente desde 1991, segundo Vedomosti.
Após a destituição, em fevereiro, do presidente pró-russo Viktor Yanukovytch, o novo governo interino de Kiev convocou eleições presidenciais para 25 de maio. Até agora os candidatos favoritos são todos pró-europeus, que querem aproximar do Ocidente esta ex-república soviética de 46 milhões de habitantes.
Os Estados Unidos acusaram na terça-feira a Rússia de criar o caos na Ucrânia, enquanto o governo interino de Kiev classifica os separatistas pró-russos que ocupam edifícios oficiais em Donestk, Kharkiv e Lugansk de "terroristas e criminosos".
Por sua vez, o presidente Vladimir Putin advertiu o governo ucraniano a não cometer atos irreparáveis, depois que Kiev ameaçou com uma intervenção contra os separatistas.
Segundo Kalachev, a Rússia quer conseguir no mínimo que a Ucrânia se torne uma federação, na qual as regiões pró-russas tenham autonomia suficiente para negociar acordos comerciais e diplomáticos diretamente com Moscou.