Agência France-Presse
postado em 11/04/2014 15:34
Caracas - Uma longa lista de acusações entre o governo e a oposição venezuelana, em um debate exibido pela televisão até a madrugada desta sexta-feira, marcou o início de um diálogo difícil e que deve continuar na terça-feira.
O presidente socialista Nicolás Maduro, acompanhado por seu Estado-Maior, recebeu na quinta-feira no Palácio de Miraflores o candidato duas vezes derrotado da aliança Mesa de Unidade Democrática (MUD), Henrique Capriles, em um encontro que não contou com a presença da ala radical da oposição, que exige a renúncia do governante em protestos que já duram dois meses.
[SAIBAMAIS]O encontro, que aconteceu após intensas negociações dos chanceleres da União de Nações Sul-Americanas (Unasul), teve como "testemunhas de boa-fé" os ministros de Equador, Brasil e Colômbia, além do núncio apostólico.
Uma fonte venezuelana neutra relatou à AFP as reuniões e intermináveis telefonemas até o último minuto para destravar as divergências, inclusive entre aliados.
Já na mesa, Maduro rejeitou as principais propostas da oposição - anistia a presos e desarmamento de civis ligados ao governo -, propôs que os opositores participem das discussões e convocou uma nova reunião para terça-feira, sem que uma agenda ou formato tenham sido definidos.
O presidente "perde uma grande oportunidade de fazer uma concessão estratégica à oposição para aumentar a esperança em um diálogo", disse o cientista político Luis Vicente León, diretor da empresa Datanálisis.
Pressões
Maduro, em uma introdução de quase uma hora, apresentou uma lista de críticas aos opositores, entre elas os apelos dos setores radicais por sua deposição, e pediu "a condenação da violência como forma de fazer política, como estratégia para mudar governos".
O ex-chanceler de Chávez - que antecipou que não haveria "negociação nem pacto" - apresentou o encontro como "coexistência pacífica entre os dois modelos que existem na Venezuela: o socialismo bolivariano e humanista, e o representado pela oposição".
A tom intransigente do governo na reunião de quinta-feira seria o resultado das pressões internas de setores radicais do chavismo.
"Qualquer indício de um governo de reconciliação (como o proposto nesta semana pelo ex-presidente brasileiro Lula) ativaria o setor extremista do chavismo, colocando a Venezuela em um abismo", escreveu nesta sexta-feira em um artigo o analista Nicmer Evans, ligado ao partido de governo.
Durante o encontro, Capriles respondeu que "a Venezuela está em uma situação extremamente crítica".
"Não queremos um golpe de Estado nem queremos uma explosão social. Queremos que este problema seja resolvido, mas para isto devemos respeitar a Constituição, deixar a repressão", disse Capriles.
Há nove semanas, Maduro enfrenta os maiores protestos de seu primeiro ano de gestão, alguns deles violentos, com um registro de 41 mortos, 600 feridos e uma centena de denúncias por violações de direitos humanos.
A cifra foi confirmada nesta sexta pela procuradora-geral Luisa Ortega Diaz.
"Em uma democracia, o diálogo deve ser a regra, não a exceção", disse o secretário executivo da MUD, Ramón Aveledo.
Rejeição a pedido da oposição
"Há tempo para justiça e há tempo para perdão. É tempo para a justiça", enfatizou o chefe de Estado, ao rejeitar os pedidos de anistia aos detidos durante as manifestações e defender novamente os sindicatos, presentes como membros da delegação governamental.
"Eu peço respeito pelos sindicatos. São essencialmente grupos de trabalho social", disse Maduro.
O analista político Manuel Felipe Sierra garantiu à AFP que o encontro foi "apenas um início (...) que mostra a vontade de resolver os problemas", mas sobre o qual "não podem ser colocadas muitas expectativas".
Para Sierra, foi notável a ausência dos fatores radicais do protesto, que "precisam ser incluídos em novos encontros".
A Venezuela, país com as maiores reservas petrolíferas mundiais e com a segunda maior taxa de homicídios, é sacudida por uma onda de protestos contra o governo desde o início de fevereiro.
Incicialmente organizadas por estudantes da cidade de San Cristóbal (oeste) contra a insegurança, as manifestações ganharam corpo e se estenderam ao restante do país incorporando demandas contra a crise econômica. Maduro que classificou o movimento de "golpe de Estado".