Agência France-Presse
postado em 26/05/2014 18:03
Paris - Depois do avanço da extrema-direita e dos eurocéticos nas eleições europeias, especialistas mostraram-se pessimistas sobre o futuro da União Europeia, apostando em uma pausa na integração do continente, ou até mesmo em uma profunda reforma do bloco. De acordo com uma fonte diplomática, os resultados mostram uma crise muito mais grave do que a econômica e financeira: uma crise de confiança e credibilidade na Europa.As dificuldades econômicas levaram à situação atual, mas desta vez "perdemos o sentimento de utilidade da Europa", afirmou a fonte. "Os Estados europeus são afetados pela globalização, que impõe dolorosas adaptações, com um preço político muito alto", explica Jean-Dominique Giuliani, presidente da Fundação Robert Schuman, instituto de pesquisas com sedes em Bruxelas e Paris.
[SAIBAMAIS]Os grandes partidos pró-Europa, como os democratas-cristãos e os socialistas, seguem sendo majoritários no Parlamento de Estraburgo, mas saíram enfraquecidos frente aos eurocéticos, sejam estes de esquerda (como na Grécia e na Itália) ou de direita (na Grã-Bretanha, França e Dinamarca). Esses partidos podem ter conquistado até um quinto dos assentos.
O jornal francês Le Monde anunciou uma "onda eurofóbica no Velho Continente", dando ênfase a um trio de formações que lideraram as votações em seus respectivos países: o Ukip britânico (27,5% dos votos), o Partido Popular dinamarquês (26,7%) e a Frente Nacional francesa (25%).
"Europa em ruínas"
Outro fato de destaque foi a abstenção de mais da metade dos eleitores, em mais um sinal de descrédito pela Europa. Os extremos "avançam em todos os países da UE. A Europa está em ruínas, só resta reconstruí-la", na avaliação de Daniel Keller, professor do Grande Oriente de França. A instituição maçônica participará nesta semana de um encontro com 20 outras lojas de todo o continente para promover a reflexão cidadã.
"O desafio eurocético está lançado tanto para o Estados membros como para a instituições europeias", na opinião de Giuliani. "Para os primeiros, a exigência é que os governos digam a verdade a respeito das reformas que assumem, ainda que o custo seja a perda de poder. As segundas necessitam uma rota de fuga que escolha prioridades, com um calendário, por exemplo, para a harmonização fiscal e, por que não, social".
O primeiro-ministro francês, Manuel Valls, considera possível "reorientar" o continente, "para sustentar o crescimento e o emprego, o que não é feito há dois anos". Já o ex-presidente conservador Nicolas Sarkozy defendeu recentemente a redução de uma série de atribuições da UE. Para muitos eleitores europeus, o voto das agremiações eurocéticas reflete antes de tudo o desejo de que seus respectivos países recuperem a prioridade, frente ao que consideram como um poder burocrático de Bruxelas.
"Se a Europa conseguir responder às expectativas dos eleitores, e se a economia melhorar, talvez as frustrações diminuam. Mas existe a vontade de reafirmar a soberania nacional, o que não será fácil de responder", indica Giovanni Orsina, professor de Ciências Políticas em Roma. "Nesta votação se vê o que alguns dizem: é preciso pensar mais em nós, no Estado nacional. Precisamos deixar em casa a política, e não levá-la para Bruxelas", argumenta Klaus-Dieter Sohn, do Centro para a Política Europeia de Freiburg, na Alemanha.
A mensagem foi recebida pelo primeiro-ministro britânico, David Cameron, que atribuiu a vitória do partido nacionalista Ukip à "profunda desilusão" sentida no país com a UE, prometendo "um verdadeira renegociação completa, que melhore o lugar do Reino Unido na Europa".