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Militares impedem homenagem dos 25 anos de repressão da Primavera de Pequim

Policiais, guardas municipais, funcionários à paisana, agentes dos comitês de bairro, entre outros, estavam em grande número na região

Agência France-Presse
postado em 04/06/2014 10:24
Pequim - As autoridades comunistas chinesas estabeleceram nesta quarta-feira (4/6) um rígido dispositivo de segurança ao redor da Praça Tiananmen (Paz Celestial) para impedir qualquer tentativa de recordação da violenta repressão da "Primavera de Pequim" há 25 anos. Ao mesmo tempo, Washington pediu a libertação de dezenas de chineses detidos preventivamente antes do aniversário.

Soldados montam guarda em frente a Praça da Paz Celestial, em Pequim
Em Hong Kong, 200 mil pessoas eram esperadas em um evento de recordação. O encontro anual na ex-colônia britânica ganha um destaque particular neste ano porque Pequim está sob uma censura ainda mais severa, como acontece a cada cinco anos. Pelo menos 66 pessoas foram detidas, colocadas em prisão domiciliar ou enviadas para fora da capital antes de 4 de junho, segundo a Anistia Internacional (AI). A polícia ameaçou a imprensa estrangeira com represálias caso tente cobrir o 25; aniversário.

O acesso à Praça da Paz Celestial, no centro de Pequim, era controlado nesta quarta-feira pelas forças de segurança, que verificavam a identidade dos chineses e dos turistas estrangeiros. Policiais, guardas municipais, funcionários à paisana, agentes dos comitês de bairro, entre outros, estavam em grande número na região e em seus arredores. Durante a madrugada de 3 para 4 de junho de 1989, a Praça Tiananmen, o local mais solene do país, diante da entrada da Cidade Proibida, foi cenário da repressão militar mais violenta de um movimento popular em Pequim desde a criação do regime comunista.

Centenas de mortos

Dezenas de milhares de soldados, apoiados por centenas de tanques, tomaram posse da praça, ocupada há sete semanas pelos estudantes e a população, que pediam liberdade e democracia. A ofensiva deixou centenas de mortos, mas o número pode ter superado mil, segundo fontes independentes. Qualquer referência aos eventos está estritamente proibida e censurada. Parte da juventude chinesa cresceu em total ignorância sobre a crise.

Diante da Universidade de Beida, onde nasceu o movimento, um estudante com pouco mais de 20 anos foi questionado nesta quarta-feira sobre os acontecimentos e respondeu: "Sobre este caso não estou muito a par", antes de caminhar rapidamente. Um pouco mais longe, um casal de estudantes de Dalian (leste), em visita a Pequim, manifestou dúvidas.



"O que? Quando, em 1989?", perguntou o jovem Jiang, visivelmente perdido. A namorada, Cui, confessou: "Eu sei, já ouvi falar disso. Não foi o movimento estudantil sobre (o então dirigente chinês) Deng Xiaoping? Mas não entendo tudo. Nem éramos nascidos". No restante da capital, onde as medidas de segurança já haviam sido reforçadas depois de uma série de atentados em todo o país atribuídos a fundamentalistas da região muçulmana de Xinjiang (oeste), milhares de policiais patrulhavam as ruas, alguns com armas automáticas.

Em um fato nada comum, um editorial do jornal oficial Global Times mencionou nesta quarta-feira os acontecimentos de 1989 - apenas na edição em inglês -, ao afirmar que "a sociedade chinesa nunca esqueceu o incidente de 25 anos atrás". Mas recorda como o país era pobre em 1989, enquanto hoje "se transformou na segunda economia mundial".

"Se a China calou as informações relativas a Tiananmen, foi para influenciar positivamente o desenvolvimento harmonioso das reformas e da abertura" afirma o jornal, segundo o qual o país "não seguirá o caminho do Ocidente". Em duas cartas abertas publicadas nesta quarta-feira, mais de 200 sinólogos ocidentais e asiáticos pediram às autoridades chinesas a libertação de ativistas detidos na véspera do aniversário.

Quase 80 deles se dirigiram ao presidente chinês Xi Jinping e pediram a libertação de cinco intelectuais detidos no início de maio por participação em um "seminário" privado sobre Tiananmen em um apartamento de Pequim. O Clube dos Correspondentes Estrangeiros na China (FCCC, ilegal mas tolerado) protestou contra a perseguição sofrida nas últimas semanas pelos jornalistas. O governo dos Estados Unidos pediu nesta quarta-feira à China que investigue o que aconteceu em 1989.

"Depois de 25 anos, os Estados Unidos ainda criticam o uso da violência para silenciar as vozes dos manifestantes pacíficos na Praça Tiananmen e seus arredores", afirma uma nota oficial da Casa Branca. O documento foi divulgado em um momento de tensão entre os dois países por episódios como a alegada invasão a empresas americanas por militares chineses ou o que Washington chama de "conduta agressiva" de Pequim no Mar da China Meridional.

"Depois de 25 anos, os Estados Unidos seguem honrando a memória daqueles que deram suas vidas na Praça Tiananmen e seus arredores, e em toda a China, e pedimos às autoridades chinesas que investiguem o que aconteceu com os mortos, detidos ou desaparecidos", completa a nota. Mas o documento também afirma que o governo e o povo americano saúdam o progresso econômico chinês nas últimas décadas e desejam manter boas relações com o país.

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