Agência France-Presse
postado em 11/06/2014 08:13
Madri - Os deputados da Espanha aprovaram nesta quarta-feira, por ampla maioria, a abdicação do rei Juan Carlos, o que abre caminho para a proclamação em breve de Felipe VI, apesar dos pedidos para um referendo sobre monarquia ou república.
A lei foi aprovada por 299 votos a favor, 19 contrários e 23 abstenções. Os deputados votaram de viva voz e de pé, em um procedimento solene e pouco habitual solicitado por alguns partidos pequenos contrários à monarquia.
Os partidos contrários à realeza apresentaram cinco emendas para solicitar que o país decidisse por referendo a manutenção da monarquia ou o retorno da república.
Mas a Câmara rejeitou todas por ampla maioria. Os dois grandes partidos do país, o governamental Partido Popular (PP, direita) e o opositor Partido Socialista (PSOE), que somam mais de 80% das cadeiras no Parlamento e ainda receberam o apoio de algumas formações pequenas, expressaram com clareza o respaldo à Coroa.
"Não estamos aqui para modificar os fatos, e sim para destacar com nossa lei que na Espanha contamos com uma monarquia parlamentar", instaurada pela Constituição de 1978, aprovada por referendo, afirmou o chefe de Governo, o conservador Mariano Rajoy, no início de um debate de três horas e que passou por trâmite urgente.
"Devemos decidir sobre a abdicação e apenas sobre a abdicação, não sobre a sucessão do rei Juan Carlos I por seu filho, o príncipe das Astúrias", destacou o líder socialista Alfredo Pérez Rubalcaba, depois de ter pressionado os deputados republicanos de sua bancada - apenas dois romperam a disciplina de voto.
O rei Juan Carlos, de 76 anos, um dos principais responsáveis pelo retorno da democracia à Espanha após a ditadura franquista (1939-1975), mas com uma imagem abalada nos últimos anos por vários escândalos, surpreendeu o país ao anunciar em 2 de junho a decisão de abdicar.
Seu filho, de 46 anos, deve ser proclamado como novo rei Felipe VI em uma cerimônia diante dos deputados e senadores em 19 de junho, sem a presença de convidados estrangeiros nem cerimônia religiosa, após a aprovação da lei em 17 de junho pelo Senado.
Críticos discursam no Parlamento
Apesar de ter escapado da queda de popularidade do pai e da monarquia, como outras instituições em um país abalado por vários casos de corrupção, o novo rei deverá conquistar sua legitimidade como fez Juan Carlos ao estimular a democracia após sua coroação em 1975 e evitar um golpe de Estado militar em 1981.
Com gritos de "Espanha, amanhã será republicana", após o anúncio da decisão do rei, dezenas de milhares de espanhóis saíram às ruas de todo o país, com a bandeira vermelha, amarela e roxa da Segunda República espanhola (1931-1939).
Nesta quarta-feira muitas vozes críticas falaram no Parlamento. "A chefia de Estado, um senhor vai herdar como se fosse uma propriedade privada. E os cidadãos que opinam?", questionou o líder da Esquerda Unida, Cayo Lara. Ele recordou os republicanos mortos na Guerra Civil (1936-1939) ou exilados durante o franquismo.
"Todos os menores de 56 anos não votaram na Constituição, ou seja, dos 34 milhões e meio de cidadãos que hoje têm direito a voto, mais de 22 milhões, 64%, não decidiram sobre o modelo de Estado", destacou Joan Baldoví, deputado do Bloco Nacionalista Valenciano, recordando que em 1978 a idade legal para votar era 21 anos.
"O baralho está viciado, saem apenas reis", afirmou Sabino Cuadras, da coalizão separatista basca Amaiur, que não participou na votação.
Os separatistas catalães do ERC votaram "não" e os nacionalistas catalães CiU e bascos PNV optaram pela abstenção, ilustrando as turbulências territoriais que Felipe VI enfrentará em breve.
Rubalcaba pediu aos congressistas que "não desperdicem a oportunidade política que hoje se abre, nem o impulso pela chegada de um novo rei" para realizar em breve uma reforma constitucional que solucione problemas como o crescente separatismo na Catalunha, decidida a organizar em 9 de novembro um referendo de autodeterminação considerado "ilegal" por Rajoy.