Agência France-Presse
postado em 12/08/2014 12:40
Bagdá - A nomeação de um novo primeiro-ministro no Iraque foi bem recebida pela comunidade internacional, que agora espera que Bagdá tome as rédeas para frear os jihadistas que controlam grande parte do país e que o atual premiê não dificulte o processo de transição e unificação. Depois que os Estados Unidos forçaram a saída do ex-primeiro-ministro Nuri al-Maliki, o Irã, seu principal aliado na região, também retirou o apoio.O secretário de Estado americano, John Kerry, pediu nesta terça-feira (12/8) ao novo premiê, Haidar al-Abadi, a rápida formação de um governo de unidade nacional e descartou o envio de tropas americanas ao Iraque. "Apelamos pela formação de um novo governo o mais rápido possível. O governo dos Estados Unidos está disposto a apoiar um novo governo de união nacional, especialmente na luta contra o Estado Islâmico (EI)", disse o chefe da diplomacia americana a respeito da organização jihadista sunita que desde junho conquistou grande parte do país.
Washington respaldou a nomeação de Abadi no lugar de Nuri al-Maliki, questionado há vários meses por uma política considerada favorável aos xiitas e que teria provocado as divisões étnicas no Iraque. "Sejamos claros: nós sempre desejamos um governo inclusivo que represente todos os iraquianos. Este é o objetivo", ressaltou Kerry durante uma visita à Austrália. A aviação militar americana executou bombardeios contra posições do EI na região norte do Iraque, mas o país descarta o envio de tropas, segundo Kerry. "Não voltaremos a enviar forças de combate ao Iraque. Este é um combate no qual devem entrar os iraquianos, em nome do Iraque", disse.
Os Estados Unidos estão enviando armas por meio do governo iraquiano aos curdos para ajudá-los em sua batalha contra os jihadistas do EI, que conquistaram desde o início de sua ofensiva regiões inteiras do território situado no norte do país. Abadi, que na segunda-feira recebeu o mandato do presidente iraquiano Fuad Massum para formar o governo depois de ter sido eleito pelo bloco parlamentar xiita, tem 30 dias para compor um novo gabinete que inclua todas as forças políticas do país, assolado por profundas tensões confessionais. Segundo o presidente Barack Obama, este gabinete deve "representar os interesses legítimos de todos os iraquianos e unir o país na luta contra o Estado Islâmico".
Trabalho pacífico
Em uma alusão clara a Maliki, que se aferra a seu posto depois de oito anos no poder, Obama pediu que "todos os dirigentes políticos iraquianos trabalhem pacificamente nos próximos dias". Já Maliki, que acreditava ter a legitimidade para um terceiro mandato após a vitória de sua coalizão nas eleições legislativas, denunciou a nomeação de Abadi como uma "violação da Constituição", que, segundo ele, foi apoiada por Washington. Mas a rejeição não deve comprometer a transição política, já que o primeiro-ministro atual foi abandonado por seus aliados e pelos integrantes de sua própria coalizão, que o acusam de ter deixado o país à beira do abismo com sua política de exclusão da minoria sunita e postura autoritária.
[SAIBAMAIS]Maliki, que é comandante-em-chefe das Forças Armadas iraquianas e tem o apoio de vários oficiais, no entanto, já ordenou que os militares e as forças de segurança do Iraque fiquem de fora da crise política do país. "As Forças Armadas devem permanecer à margem da crise política e continuar com suas tarefas militares e de segurança para defender o país", indicou Maliki, que segue à frente dos militares até que Abadi assuma a chefatura de Governo.
Abadi foi escolhido com candidato da Aliança Nacional, o bloco parlamentar xiita, já que tradicionalmente o posto de premiê cabe a um xiita. A Liga Árabe comemorou nesta terça-feira a nomeação do novo premiê. O secretário-geral da organização pan-árabe Nabil al-Arabi desejou em um comunicado ver Abadi "conseguir formar um governo representando todos os representantes do povo iraquiano". O Irã também apoiou a nomeação de Abadi, segundo anunciou o secretário do Conselho Supremo da Segurança Nacional, Ali Shamjani.
"A República Islâmica do Irã apoia o processo legal que foi realizado para a nomeação do novo primeiro-ministro iraquiano", declarou Shamjani, que também é o representante do guia supremo iraniano, o aiatolá Ali Khamenei, no conselho. Esta foi a primeira declaração iraniana que indica que Maliki não conta mais com o apoio de Teerã, considerado seu principal aliado na região.
Ameaça de genocídio
No terreno, os Estados Unidos, que voltaram a se envolver no Iraque pela primeira vez desde a retirada de suas tropas no final de 2011, prosseguiu com os bombardeios na segunda-fira, pelo quarto dia consecutivo. Obama autorizou na quinta-feira os bombardeios para proteger os funcionários americanos e as minorias iraquianas ante o avanço jihadistas e evitar assim um possível genocídio.
Mas os Estados Unidos não têm planos de expandir sua campanha de ataques aéreos no Iraque além do necessário à proteção de funcionários americanos na cidade de Erbil e dos refugiados da minoria yazidi, segundo o Pentágono. Matérias da imprensa apontam que os Estados Unidos ou as forças aliadas poderão tentar abrir um corredor humanitário para Sinjar, com o objetivo de resgatar refugiados, mas o Pentágono afirmou que essa opção é "complicada".
Segundo os supervisores de Direitos Humanos da ONU, a minoria religiosa yazidi do Iraque enfrenta um possível genocídio, e por isso pediram pediram uma ação global urgente para evitar um massacre. "Todas as medidas possíveis devem ser tomadas de forma urgente para evitar uma atrocidade em massa e um potencial genocídio em dias ou horas", declarou a especialista em direitos das minorias da ONU, Rita Izsak. Milhares de refugiados yazidis estão presos nas montanhas de Sinjar, quase sem alimentos ou água. Estão cercados por extremistas sunitas do Estado Islâmico (EI), que controlam grande parte do norte do Iraque e do leste da Síria.
O grupo jihadista lançou uma ofensiva no dia 9 de junho, dirigida contra yazidis, além de cristãos, xiitas, curdos e outros grupos. Os insurgentes ofereceram a opção de "se converter ou morrer", explicou Christof Heyns, especialista da ONU em execuções sumárias. As mulheres estão sofrendo severamente, segundo Eashida Manjoo, supervisora de violência de gênero. "Temos informações de mulheres executadas, e relatórios que fornecem sérios indícios de que centenas de mulheres e crianças foram sequestradas, muitos adolescentes foram atacados sexualmente e as mulheres foram vendidas a combatentes do EI", disse.