Agência France-Presse
postado em 08/10/2014 18:05
La Paz- A Bolívia, um dos países mais pobres da América Latina, tem atualmente uma economia com níveis sustentáveis de crescimento (5,4% para 2014, segundo o FMI), alimentada por uma nacionalização do setor de hidrocarbonetos que deu abundantes recursos e crédito político a Evo Morales, favorito para a eleição de domingo. Morales, que chegou ao poder em janeiro de 2006 com um discurso indigenista e antiamericano, desfruta do efeito positivo gerado por sua medida mais polêmica: a nacionalização de hidrocarbonetos decretada em 1; de maio deste ano.Com a ajuda de policiais e militares, o governo ocupou em maio de 2006 instalações e campos de petróleo de transnacionais, como a Petrobras e a espanhola Repsol. Além disso, negociou novas condições de contratos, mais favoráveis para o Estado. Pouco antes, uma reforma elevou os impostos do gás de 18% para 50%, medida que foi considerada o ponto de partida da política nacionalista de Morales.
Desse modo, a renda petrolífera que representava 673 milhões de dólares anuais para os cofres do Estado boliviano em 2005 chegou a 5,855 bilhões de dólares em 2013, segundo dados da estatal de petróleo YPFB. No mesmo período, o Produto Interno Bruto triplicou de 9,5 bilhões de dólares para 30,381 bilhões de dólares. O PIB per capita subiu de 1.010 dólares para 2.757 dólares, e o salário mínimo passou de 72 dólares para 206 dólares. O novo fluxo de recursos permitiu ao governo promover o forte aumento dos investimentos em programas sociais e em infraestrutura pública.
Ajuda do contexto externo
A política estatista não se restringiu somente aos hidrocarbonetos, mas se estendeu a empresas de telecomunicações, administradoras de fundos de pensão, usinas hidrelétricas, aeroportos, mineradoras, entre outras. Essas nacionalizações, que costumam afugentar os capitais estrangeiros, não tiveram esse efeito, segundo um documento do Ministério da Economia, ao qual a AFP teve acesso.
"Em 2013, a Bolívia conseguiu 1,75 bilhão de dólares em Investimento Estrangeiro Direto (IED)", afirma o documento, acrescentando que, em 1998, durante a onda de privatizações, o IED atingiu um pico de 1,024 bilhão de dólares. "O boom econômico é resultado do excelente contexto externo, no qual se desenvolveu a economia boliviana", disse à AFP o professor emérito de Economia, Armando Méndez, da estatal Universidad Mayor de San Andrés (UMSA).
O economista explicou que "enquanto em 2005 a Bolívia exportava 1,4 bilhão de dólares em gás, hoje exporta anualmente 6,8 bilhões, quase cinco vezes mais". "Naquele ano, o preço do gás era de 2,5 dólares por milhão de BTU, enquanto hoje é de 9,3 dólares, quase quatro vezes mais", completou.
Altas taxas de crescimento e um clima favorável aos negócios fizeram que até a classe empresarial de Santa Cruz (leste), principal setor de oposição a Morales, gradualmente começasse a apoiá-lo. Segundo as útlimas projeções de crescimento divulgadas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), a Bolívia terá em 2014 um crescimento de 5,2%, à frente de Colômbia (4,8%), Chile (2%), Paraguai (4%) e Peru (3,6%).
Defeitos de fundo
Gonzalo Chávez, professor de Economia na privada Universidade Católica Boliviana ressaltou, contudo, que a economia desse país sul-americano pode mostrar virtudes de forma, mas tem defeitos de fundo. "Em uma fotografia da macroeconomia, observa-se um interessante panorama, com uma bonança econômica. Teria de se pedir uma tomografia da macroeconomia", disse o especialista à AFP, advertindo sobre a necessidade de uma análise mais profunda sobre a estratégia econômica.
Na Bolívia, a pobreza extrema alcança 20% da população, correspondente a mais de 10 milhões de habitantes. Para garantir mais meios de subsistência, o governo aprovou este ano uma polêmica lei que permite que crianças a partir de 10 anos trabalhem. "Vê-se um país com problemas antigos: continua sendo exportador de recursos naturais, tem baixíssimos níveis de produtividade e uma economia informal gigantesca que dá emprego a cerca de 80% de bolivianos", explicou Chávez.
Sobre os investimentos estrangeiros, o acadêmico afirmou que o montante de 1,75 bilhão de dólares que entrou em 2013 na Bolívia é pouco em relação aos fluxos financeiros que beneficiaram outros países da região. "O Peru recebe 6 bilhões de dólares de investimentos por ano; o Chile, 8 bilhões; e a Colômbia, 9 bilhões", comparou Chávez, insistindo em que a Bolívia tem um longo caminho a percorrer.
Mais de 6 milhões de bolivianos votam no próximo domingo para presidente, nas eleições gerais em que Evo Morales é amplamente favorito para conseguir um terceiro mandato consecutivo (2015-2020).